terça-feira, 29 de março de 2016

Bibi Ferreira — JUBILEU DE DIAMANTE (1/4)

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AS ESTRÉIAS DE BIBI — 1/4

Bibi, no jornal chileno
La Nación, 1925
As crianças privilegiadas como Bibi devem ser as eleitas de Deus. São anjos que baixaram à terra. E, serão vultos notáveis entre os homens, espíritos criadores, gênios, se Deus continuar a protegê-las. (A Manhã, 24/2/1929)

Bibi Ferreira (...) é uma linda promessa, uma esperança radiosa que desejo ser o primeiro a saudar como um arrebol de inteligência e de sensibilidade, a quem desejo ofertar, num auspício de triunfo, o primeiro ramalhete de flores e as primeiras palavras de carinho, sinceras e puras como a sua pequenina vida. (A Batalha, 18/11/1930)

A Rainha do Teatro Brasileiro, Bibi Ferreira, celebrou recentemente o JUBILEU DE DIAMANTE de sua carreira. Isso, é claro, se contarmos o dia 28 de fevereiro de 1941 como a data de sua estréia no teatro, no papel de Mirandolina na Locandiera de Goldoni, traduzida por Gastão Pereira da Silva como O Inimigo das Mulheres para a companhia teatral de seu amigo, Procópio Ferreira. Mas teria sido essa, efetivamente, a estréia de Bibi nos palcos? Se levarmos em consideração o quesito “protagonista”, sim, foi. Sob qualquer outro aspecto, a resposta é, como diria o velho Brizola, “um não rotundo”. Ao contrário; na época da Locandiera — com 19 anos incompletos — ela já tivera mais de uma dezena de estréias e era experiente em vários campos da vida artística, incluindo o teatro, a dança, o canto, a composição e o rádio. Vamos, então, a algumas das muitas estréias de Bibi que precederam Mirandolina.

Deixemos de lado a participação involuntária em Manhãs de Sol, quando Bibi, com apenas 24 dias, foi utilizada em cena por sua madrinha Abigail Maia, no lugar de uma boneca que sumiu dos bastidores. No Trianon. Não no São José, como diz o livro Bibi Ferreira, Uma Vida no Palco, e não no João Caetano, como já ouvi a própria Bibi comentar.

Vale dizer que o destino foi caprichoso, pois a comédia de Oduvaldo Vianna estreara com sucesso no ano anterior e a reprise de junho de 1922 estava no fim; a apresentação daquele domingo, 25 de junho, foi, efetivamente, a última da temporada no Trianon; a partir do dia seguinte a companhia passaria a encenar outra reprise do ano anterior, Onde Canta o Sabiá, de Gastão Tojeiro, e terça haveria a estréia da inédita A Vida é um Sonho, de Oduvaldo.

Comemoração do primeiro aniversário da companhia de Abigail e Oduvaldo no Trianon.
Ocorreu dias antes de Bibi nascer e foi publicada no Malho de 3/6/1922.
Oduvaldo, Abigail (sentados) e Procópio (em pé) são fáceis de identificar.

Última apresentação de "Manhãs de Sol",
no dia 25 de junho, quando Bibi foi utilizada
para substituir uma boneca que
sumiu dos bastidores
Comecemos por 1925, no qual Bibi se apresentou por alguns meses em Santiago do Chile na Companhia de Revista de Eulogio Velasco, cantando e dançando junto à Maria Caballé (que ao lado de Isabelita Ruiz e Tina de Jarque, formava o trio de atrizes mais importantes da companhia). Segundo Brício de Abreu, Velasco era velho amigo de Antonio Izquierdo, avô de Bibi, e contratou Aída "sabendo que as condições de vida do jovem casal não iam muito a contento", referindo-se a Procópio e a esposa, casados desde 1919. (O Cruzeiro, 17/11/56) É interessante, entretanto, que Brício se refira a eles como um casal, já que Bibi declarou em mais de uma ocasião que seus pais se separaram quando ela completou um ano de vida. Seja como for, Procópio passou o ano se apresentando com sua companhia no Trianon, enquanto Aída foi e levou a filha. O artigo do La Nación que traz a foto de Bibi vestida a caráter — tratava-se de um número em que as atrizes de Velasco entravam caracterizadas como "pedras preciosas", e coube à Bibi a conclusão, entrando com o vestido coberto de pérolas, pedra que representava — dá a entender que a associação dela com a companhia não era acidental ou de brincadeira: "Sua separação do elenco foi um dos grandes desgostos de Eulogio Velasco, que ofereceu aos pais da criança um contrato que daria inveja a qualquer primeira figura de seu elenco". Procópio e Aída devem ter ficado lisonjeadíssimos mas não aceitaram e trouxeram Bibi de volta ao Brasil.

Eulogio Velasco e Maria Caballé
Se no Chile Bibi começou bem, sorte ainda melhor a esperava no Brasil. Raphael Pinheiro, diretor artístico da companhia teatral de Palmeirim Silva e Carmen de Azevedo, decidira promover uma homenagem à grande Apolônia Pinto, maior atriz brasileira viva. A maranhense fazia parte da companhia de Palmeirim, mas iniciou sua carreira profissional em 1870 com o lendário Furtado Coelho. Ao longo das décadas seguintes trabalhou com todos os principais nomes do teatro brasileiro e português: Valle, Taborda, Germano, Vasques, Brazão e etc., e completava em 1925 o seu Jubileu de Esmeralda. A merecidíssima celebração foi marcada para o dia 3 de novembro no Teatro Municipal, e além de uma saudação do escritor Coelho Netto e a apresentação da peça mais recente de Armando Gonzaga, subiria ao palco para entregar à Apolônia uma coroa (de louros, imagino, ou uma coroa, mesmo, dependendo do costume da ocasião), aos três anos, “a menor atriz brasileira”, Bibi Ferreira. Eis o que anunciava o Correio da Manhã, nesse dia:

Jornal do Brasil, 3/11/1925
É hoje, às 20h45, no Teatro Municipal, a comemoração do jubileu artístico da atriz Apolônia Pinto, que será coroada pela menor atriz brasileira, Bibi Ferreira, sendo orador o ilustre escritor Coelho Netto. A essa homenagem aderiu o nosso mundo intelectual e artístico. Depois dessa festa de preito a uma figura que é uma glória indiscutível da cena brasileira, será levada à cena, pela companhia Carmen d'Azevedo-Palmeirim Silva, a engraçada comédia de Armando Gonzaga, "O Livro do Homem", três atos ensaiados por Brandão Sobrinho. Os cenários são de Jayme Silva.

A primeira vez que Bibi subiu a um palco no Brasil, portanto, reveste-se de alta significação. Não apenas por Apolônia ter sido uma das mestras de Procópio na companhia de Abigail Maia e Oduvaldo Vianna, ou por ele ter sido aluno de Coelho Netto na Escola de Arte Dramática do Rio de Janeiro, mas porque naquela noite iluminada de 3 de novembro de 1925, encontraram-se, no palco do Municipal, a maior atriz do século XIX e a maior atriz do século XX. Mas há que se fazer uma ressalva em relação a isso: conquanto Apolônia fosse sem a menor dúvida uma grande atriz, ela não foi a maior enquanto Ismênia dos Santos viveu. Já Bibi, em sua maturidade artística, não teve rivais à sua altura e reinou absoluta como a melhor e mais completa atriz nacional. 

O Jornal, 31/10/1925

O Paiz, 2-3/11/1925
Não se pode dizer que seja sua “estréia”. Foi só um evento. Em 1927 ela participou de outro, tão ou mais significativo. Procópio e Abigail Maia estavam se apresentando em São Paulo desde janeiro no Theatro Apollo, com um vasto repertório e para o dia 28 de abril anunciava-se uma festa artística em homenagem à atriz.

A festa é cabalística na vida de Bibi por duas razões: em primeiro lugar, o programa consistia em um ato variado do qual participariam Procópio, Catullo da Paixão Cearense, Raul Pederneiras e a própria Abigail, e em seguida a reprise de nenhuma outra senão Manhãs de Sol, que teve uma bela recepção quando estreou em São Paulo, em 1923. Para Bibi, porém, a importância é que aquela era a peça na qual fizera involuntariamente sua estréia no papel de um bebê, por conta do sumiço de uma boneca. Desta vez, tanto ela quanto Marilda Vianna  filha de Abigail e Oduvaldo  participariam como atrizes; não como bebês, mas interpretando as crianças Aidê e Sarah, “que figuram na obra de Oduvaldo Vianna”.

E a segunda razão é que agora a situação se invertera e o headliner e grande figura da companhia era Procópio e não Oduvaldo ou a madrinha de Bibi. Prestes a completar cinco anos, portanto, ela subiu a um palco como atriz, ainda que em récita única, dividindo a cena com um elenco que incluía a fina flor do teatro brasileiro, entre eles Abigail, Procópio, Apolônia Pinto, Palmerim Silva, Manuel Durães e Delorges Caminha. A imprensa não comenta a festa, mas não é difícil imaginar o que terá sido esse encontro de titãs.

A Gazeta, 27/4/1927
Pode não ser efetivamente sua estréia como atriz, mas o caminho ia sendo traçado, aos poucos, de evento em evento. Ainda naquele ano ela foi nomeada “mascote queridíssima” do Teatro de Brinquedo, a curiosa tentativa dos intelectuais modernistas Álvaro e Eugênia Moreyra de trazer o ideário de 22 para um grupo de teatro. O primeiro espetáculo do Teatro de Brinquedo, Adão, Eva e outros membros da família — com estréia marcada para o dia 10 de novembro de 1927 no Cassino Beira-Mar — foi escrito por Álvaro, musicado por Heckel Tavares e tinha um cenário simplista criado por ninguém menos que Di Cavalcanti. O elenco era um caso à parte e misturava intelectuais como Álvaro e Eugênia, compositores como Marques Porto e Luiz Peixoto, o dramaturgo Joracy Camargo, o desenhista Álvarus, o jornalista Machado Florence e até mesmo uma atriz — Aída Izquierdo Ferreira — que levava sua filha de cinco anos aos ensaios. Para eles o teatro era um brinquedo, mas um brinquedo "para pessoas grandes, bem humoradas, vestindo bem o espírito, e que procuram no teatro o que ele sempre ofereceu, antes da idade do Jazz: cogitação de espírito. Todos estão bem intencionados, amorosos do que pretendem realizar e contando com a expectativa inteligente daqueles para quem eles vão trabalhar". (Correio da Manhã, 5/11/1927)

Teatro de Brinquedo. Em pé, da esq.: Fernando Guerra Duval, Briolanja Sottomayor, René de Castro, Mary Sottomayor, Eugênia Moreyra, Aída Izquierdo Ferreira. Sentados, em segundo plano, da esq.: Álvarus, Attilio Milano, Brutus Pedreira, Marques Porto. Sentado, em primeiro plano, da esq.: Álvaro Moreyra, Manoel White, Bibi e Joracy Camargo. (Revista Para Todos, apud. "Bibi Ferreira, Uma Vida no Palco")

Margarida Max
O ano de 1928 foi particularmente movimentado para Bibi. Em fevereiro, o empresário teatral Manoel Pinto  "que incontestavelmente é um dos mais fortes baluartes do teatro brasileiro e que nos habituou às mais incríveis feéries, montando revistas com um luxo asiático e esplendor tal que deslumbrou o público do Rio e São Paulo" (A Manhã, 14/2/1928) — e que contava, entre seus contratados, com a maravilhosa Margarida Max, resolveu promover suntuosos bailes à fantasia no teatro João Caetano nas quatro noites de Carnaval. O procedimento não era inédito ou exclusivo; Paschoal Segretto fez o mesmo com os seus teatros, São José e o Carlos Gomes, assim como festas haveria todos os dias no Phenix e em outros. A diferença é que as festas do João Caetano teriam Margarida Max como anfitriã e estrela, e sendo ela a maior e mais famosa atriz do Teatro de Revista, é de se imaginar que os ingressos desapareceram em questão de segundos. Para que as crianças não ficassem de fora, já que não apenas eram uma fatia comercial considerável dos festejos de Momo, mas tinham inesperada adoração pela atriz, foram organizadas "imponentes matinês infantis" das 14 às 18h no domingo, dia 19, e na segunda, dia 20, "que serão presididas pelo ídolo da petizada, a estrela Margarida Max, havendo profusa distribuição de brinquedos e lindos prêmios às mais belas e originais fantasias". (A Manhã, id.)

A Manhã, 17/2/1928

Bibi não poderia ficar fora disso. Pelo menos é o que pensou o jornal A Manhã, que em artigo do dia 17 de fevereiro informava haver "interceptado" uma conversa telefônica divertidíssima — e de um realismo absoluto — entre "a irrequieta Bibi, graciosa e inteligente filhinha do provecto ator Procópio Ferreira", e Margarida Max:

Bibi — Alô, quem fala? É a empresa Pinto?... Chamem a Margarida, por favor!

Margarida — Pronto, quem fala?...

Bibi — Aqui é a Bibisinha! É verdade que você vai tomar parte nos bailes infantis que o "seu" Pinto vai dar no domingo e na segunda-feira de Carnaval?

Margarida — É verdade sim, meu anjo, por quê?

Bibi — Que bom!... Então eu vou pedir a papai pra deixar eu ir, porque eu tenho uma fantasia muito bonita e estou ensaiando, às escondidas, um "black-bottom" que vai fazer um sucesso enorme... (mudando de voz) Você sabe, Margarida, que filho de peixe sabe nadar... (apressada) Papai vem aí... Até domingo!...

Margarida — Adeusinho, meu coração!

O artigo termina explicando que "a interessante Bibi Procópio Ferreira, momentos após, recebia de seu talentoso pai o consentimento para comparecer aos bailes e de Margarida, um gentil convite para os mesmos... com a condição de dançar um dos seus apreciados black-bottoms". O black-bottom era uma dança semelhante ao charleston, de tantas que surgiram nos roaring twenties, como o peabody, o varsity drag, etc.

O ano estava só começando... Por esse período, o prefeito do Rio, Antônio Prado Junior, fez sancionar uma lei criando a “Feira de Amostras do Distrito Federal”, que, a exemplo da exposição do centenário da Independência, seis anos antes, seria uma “feira permanente de amostras dos produtos da lavoura, indústria e comércio do município”.

Bárbara Heliodora com 12 anos (1935) e sua
mãe, a poetisa Anna Amélia Carneiro de Mendonça
O local da feira, por sinal, era o próprio palácio das festas onde funcionou a célebre exposição, apenas reformado para o novo certame. Para a parte comercial, com stands e exposições das diferentes empresas e indústrias, ficaram responsáveis José Vergueiro Steidl, Delfim Carlos e Gabriel Monteiro de Barros. Para a parte artística e de entretenimento, o chamado “Salão de Arte”, Prado Junior destacou as poetisas (e concunhadas, se não me engano) Maria Eugênia Celso e Anna Amélia Carneiro de Mendonça. Esta última, mãe de uma menina um ano mais nova que Bibi, e futuramente a nossa maior crítica teatral: Bárbara Heliodora. Os proventos foram todos destinados à Associação Pró-Matre do Rio.

Maria e Anna realizaram um trabalho magnífico arregimentando aquilo que de melhor poderia haver em termos de música, dança, canto e teatro, desde valores consagrados ou em ascendência, como o músico Marcelo Tupinambá, os poetas Belmiro Braga, Menotti del Picchia e Manoel Bandeira, até aqueles que começavam timidamente, como o cantor Gastão Formenti e as cantoras Olga Praguer (de apenas 19 anos), Stefana de Macedo, Gilda Abreu (e sua mãe, a professora Nícia Silva) e o poeta Paschoal Carlos Magno, cujo sobrinho (que só nasceria quatro anos depois) se tornaria mais tarde pai da única filha de Bibi.

Panfleto de propaganda da Feira de Amostras, 1928

Stefana de Macedo
Na parte teatral houve a encenação de textos por diversos atores e atrizes, mas só dois grupos foram chamados: a Companhia Rian, da atriz e ex-primeira dama Nair de Teffé, para encenar a peça Miss Love, de Coelho Netto, e o Teatro de Brinquedo, com o elenco já citado, acrescido do jovem ator e futuro diplomata e chanceler Vasco Leitão da Cunha. Para as apresentações de dança foram convidadas as alunas de Naruna Korder e Klara Korte e, como não podia deixar de ser, Bibi, “a filhinha de Procópio Ferreira”.

A Feira foi de 30 de junho a 29 de julho. O Teatro de Brinquedo se apresentou nos dias 5, 12, 19, 25 e 29. Bibi se apresentou quatro vezes (como não encontrei a programação de todos os dias da feira, é possível que tanto o grupo de Moreyra quanto Bibi tenham se apresentado mais vezes), a primeira em 4 de julho — dia da independência norte-americana — em que a feira promoveu a “Tarde Americana”, com “danças excêntricas pelos Irmãos Macedo; Conjunto de Violões, dirigido pela senhorita Stefana Macedo; Charleston, pela menina Bibi Ferreira”. (A Noite, 28/06/1928)

O Paiz, 30/6/1928
Parte da programação do Salão de Arte,
na primeira semana da Feira

A segunda em 7 de julho, dia da Pró-Matre, em que houve “grande espetáculo público de bailados sobre a fonte luminosa. À tarde e à noite serão executados números variados de dança clássica e moderna, pelas alunas das professoras Sras. Naruna Korder e Klara Korte. Um número de dança pela menina Bibi Ferreira, filha de Procópio Ferreira. Números excêntricos pelos irmãos Macedo”. (A Noite, id.)

A terceira foi no dia 25 de julho, todo ele dedicado ao presidente Washington Luís, que compareceu à Feira. Houve uma catarata de artistas, músicos e poetas. Bibi realizou um número de “dança excêntrica” sendo acompanhada por Tasso Moreira ao piano. Segundo a imprensa, “tão galantemente se houve a minúscula senhorinha Bibi, que os aplausos foram os mais calorosos, sendo pessoalmente cumprimentada pelo Chefe de Estado.” (A Manhã, 5/3/1929) Sua mãe não se apresentou junto ao Teatro de Brinquedo, que encenou uma “aparência” chamada O Circo; naquele dia Aída voltou a suas raízes e dançou um tango com Álvaro de Oliveira. (A Noite, 25/07/1928) E a quarta no dia do encerramento, 29 de julho, apresentando o mesmo número anterior. E Aída também não fez teatro; dançou, desta vez, um maxixe com o mesmo parceiro.

Olga Praguer
(Fon-Fon, 1928)

Tanto a “dança excêntrica” quanto o charleston (e quiçá até o black-bottom) foram talvez lembranças de sua participação na companhia de Eulogio Velasco. Mas ela não teve tempo nem de respirar entre a Feira e seu próximo trabalho; foi diretamente para São Paulo se encontrar com a madrinha e Oduvaldo Vianna, que haviam montado uma companhia com Raul Roulien e estavam em temporada desde maio no Theatro Apollo. Era a “Companhia Brasileira de Sainetes”, palavra que vem do espanhol e significa uma peça pequena, divertida e com poucos personagens (o que não se aplicava, neste último caso, ao elenco de Oduvaldo, em geral numeroso). Bibi foi chamada porque Oduvaldo pretendia aproveitar a festa artística de Abigail, no dia 6 de setembro, para estrear sua nova peça, Folha Caída, onde havia um pequeno papel para a afilhada.

Roulien, que com menos de dois anos de carreira já era referido na capa da Careta como “o mais querido e aplaudido artista teatral brasileiro da atualidade” (2ª quinzena de 1929)

O repertório deles era eclético e o sainete não estava muito distante da revista. Roulien, que começara sua carreira há pouco mais de um ano, vinha se destacando não só como cantor, mas como compositor, e não era raro que incluísse composições suas nos espetáculos, como é o caso do tango “Mala Yerba”, no sainete A Vida passa, do argentino Pedro Benjamin Aquino; também não faltava música no “sainete-fantasia” Um Conto da Carochinha, de Oduvaldo, Guilherme de Almeida e Cornélio Pires, e não faltava diversidade; a companhia encenava sainetes uruguaios (como o de Aquino), argentinos (Belchior da sorte, de Alberto Vaccareza), italianos (Menino de ouro, de Arnaldo Fracaroli), e até paulistas (Caipirinha, do antigo médico e político Cezário Motta) e o próprio Oduvaldo (Sorrisos da vida, Terra Natal, etc.).

Oduvaldo Vianna
Quanto à festa de Abigail, como sempre incluiu um ato variado com piadas de Cornélio Pires, desenhos e caricaturas de Raul Pederneiras, sketches com Brandão Sobrinho, Sebastião Arruda, Eduardo Vianna e Chaves Filho, música de Hekel Tavares e um tango de Roulien. Na seqüência encenou-se A Árvore de Lágrimas, texto poético do escritor Paulo Gonçalves, morto prematuramente no ano anterior e por fim a companhia encenou Folha Caída. A peça tratava de assunto que era verdadeiro tabu, na época: o divórcio.

Oduvaldo — que separou-se da primeira mulher para viver com Abigail e mais tarde, já separado da atriz, teve que se esfalfar para anular aquele primeiro casamento afim de poder se casar com a namorada Deocélia — foi um dos primeiros paladinos da causa. Era tema pedregoso; se até o simples desquite era visto como procedimento desnaturado e vexaminoso para os bem-nascidos, o que não dirá o divórcio, inexistente em nossa legislação, condenado pela Igreja e quase trinta anos antes de Nelson Carneiro abraçar a causa no Congresso. Mas Oduvaldo foi cuidadoso e, curiosamente, foi nesse cuidado que ele desagradou um dos articulistas da imprensa paulistana:

Diário Nacional, 7/9/28
Folha Caída pretende demonstrar uma tese: o direito à felicidade daquele que naufragou na vida matrimonial. É, pois, teatro de tese. Focaliza os aspectos íntimos da existência em família de tipos delineados com felicidade: ela, a divorciada, ele, o primo namorado de infância; o velho pai de costumes austeros, intransigente na sua concepção de matrimônio, e o tio otimista, sempre de olhos abertos para a alegria e para a expansão de espírito. (...) Peguntamos agora: vale a peça pela tese que procura explicar? Pensamos que, embora de difícil resposta, a pergunta acima tem sempre uma resposta negativa. Folha Caída não explica a debatida tese do divórcio. Passa por cima, delineia simplesmente um plano excelente, não se esforçando, porém, seja dita a verdade, pelo esclarecimento nítido das intenções dos protagonistas que vivem os três atos, quase que amorfos e sem atitudes definidas. Há mesmo, de parte do autor, uma evidente intenção de tornar a comédia leve, ao gosto da maioria do público, o que acarretou justamente o prejuízo da sua frivolidade, com a inclusão de cenas alegres e, talvez, dispensáveis. (Diário Nacional, 7/9/28)

Abigail Maia
Não obstante, o crítico faz questão de elogiar o elenco (sem citar Bibi) e vaticinar o sucesso da peça, que entrou em cartaz dias depois e foi encenada até 31 de outubro, quando terminou a temporada e a companhia foi para o Rio. Não encontrei outras críticas mas aparentemente o tema da peça foi bastante discutido nas rodas culturais e intelectuais da capital paulista.

Bibi, com apenas seis anos, nem poderia imaginar a grandeza do que estava acontecendo. Nos palcos da Paulicéia estava grande parte da realeza teatral, seja de Revista, seja de Comédia. Em cartaz, ao mesmo tempo em que Folha Caída, estava a Rainha da Revista, sua já conhecida Margarida Max, dividindo o palco do Casino Antarctica com Francisco Alves em Água de Côco, de Affonso de Carvalho e Octavio Tavares, com música dos maestros Stabile e Vogeler; no Boa Vista estava a Companhia Tró-ló-ló de Jardel Jércolis, encenando O Marroeiro, de Catullo, tendo como estrela a renomada atriz e cantora portuguesa Auzenda de Oliveira; no Municipal bombava a Temporada Lírica de 1928 com a presença de figuras consagradas como Gigli, Claudia Muzio e Gabriela Besanzoni Lage; e a cereja do bolo estava no Teatro Santa Helena: a Companhia Espanhola de Revistas Velasco, trazendo as colegas de Aída e Bibi: Maria Caballé, Isabelita Ruiz e Tina de Jarque.

Entre o passado e o futuro; Bibi e as feras, em São Paulo

E não há como não ressaltar que quando a temporada da Companhia de Sainetes se aproximava do fim, a Tró-ló-ló se transferiu para o Teatro Colombo e quem ocupou o Boa Vista foi o lendário Leopoldo Fróes, maior ator da época e grande precursor e êmulo de Procópio.

O querido e talentoso
Francisco Soares Brandão Sobrinho
Dentro de seu próprio teatro, Bibi roçava ombros, entre outros, com seus padrinhos Oduvaldo e Abigail (a quem, como se sabe de sobejo, Procópio homenageou dando seu nome à filha); Roulien, já comentado anteriormente, e que pouco depois se tornaria a primeira estrela brasileira em Hollywood; a jovem de 18 anos, Ismênia dos Santos (neta, pelo que sei, da magnífica atriz do século XIX), que mais tarde se tornaria uma prestigiada atriz do rádio-teatro; o talentosíssimo Brandão Sobrinho, que esteve com Bibi na homenagem a Apolônia Pinto e era agora seu colega em Folha Caída (e infelizmente morreria dois anos depois, com apenas 49 anos, de febre tifóide em Pernambuco) e por fim, e mais uma vez, Apolônia Pinto, que ganhava sempre uma coadjuvância de luxo. Bibi e Apolônia provavelmente nem contracenaram, mas em sua primeira temporada a filha de Procópio figurou no mesmo elenco que aquela a quem a imprensa e a classe teatral chamavam unanimemente de “a maior glória do teatro brasileiro”.

Odilon
No Rio a companhia se instalou no Trianon. Roulien iniciou a temporada mas se envolveu com outros projetos e foi substituído pelo advogado recém-formado (que teve Leopoldo Fróes como paraninfo), contista e jovem galã Odilon Azevedo, que aos 24 anos sequer conhecia sua futura parceira de palco e de vida, Dulcina de Moraes. O repertório da companhia — à parte de uma nova adição, aqui e ali — consistia dos textos encenados em São Paulo; entre outros, três sainetes argentinos (Fazenda Nova, de Claudio Martínez Payva e Rafael José De Rosa, Ser Mãe é Padecer num Paraíso, de José Antonio Sadías e Teu Coração é uma cabana, do francês radicado na Argentina, Alberto Novión), dois uruguaios (A Morte a Prazo Fixo, de Elyseo Gutierrez, adaptada por Armando Gonzaga e Malvada, de Miguel Scuder), um chileno (Senhorinha Charleston, de Armando Moock), um do escritor paulista Affonso Schmidt, As Levianas e um sainete do próprio Oduvaldo, O Castagnaro da Festa. A qualidade habitual de seus textos e o tema da nova peça alvoroçaram a imprensa:

Correio da Manhã, 2/12/1928
“Folha Caída” é o título desses três quadros de comédia, nos quais o autor mostra a necessidade que temos do divórcio no Brasil, defendendo a ousada tese com rara habilidade. “Folha Caída” suscitou apaixonadas discussões na imprensa paulista, tendo Oduvaldo Vianna recebido inúmeras cartas de senhoras da alta sociedade que se mostravam solidárias com a sua teoria da felicidade acima das mesquinhas e hipócritas convenções sociais. (Gazeta de Notícias, 23/11/1928)

Oduvaldo Vianna (...) põe em foco o problema do divórcio entre nós. O autor é francamente pelo divórcio e acha que duas pessoas não podem ser infelizes toda a vida, porque se enganaram mutuamente ao se casarem. A felicidade está acima dos preconceitos sociais - é a tese de Oduvaldo Vianna em Folha Caída. Na pela de amanhã, entretanto, há cenas engraçadíssimas a par de outras emotivas. (A Noite, 26/11/1928)

"Estréia da galante menina Bibi Procópio Ferreira" (Correio da Manhã, 27/11/1928)

Alda Garrido
Margarida Max voltou ao Rio quase ao mesmo tempo em que a Companhia de Oduvaldo e seguiu sua temporada vitoriosa no Palácio Theatro; mas havia inúmeras outras estrelas brilhando na capital fluminense: no Carlos Gomes, Manoel Durães, Olga Navarro, Affonso Stuart e Lygia Sarmento encenavam O Dia da Violeta, sainete adaptado por Joracy Camargo com música de Mário Sylva; no São José a Companhia Zig-Zag apresentava a revuette (espécie de combo que permitia ao espectador ver um filme e assistir uma peça, já que o São José era também um cinema) O Rio... agacha-se, de Simões Lopes e Freire Junior, com os comediantes Pinto Filho e Guy Martinelli; o Recreio transbordava estrelas: Palácio das Águias, de Geysa Bôscoli e Luiz Carlos Junior era protagonizada pela Rainha da Comédia, Alda Garrido, junto a Mesquitinha (Olympio Bastos), Manoel Pêra (pai de Marília), o tonitruante Vicente Celestino e a jovem e linda Henriqueta Brieba.

A estréia ocorreu na terça-feira, 27 de novembro. A presença da jovem Bibi foi bem mais festejada do que em São Paulo: “Folha Caída dará ocasião à estréia da galante menina Bibi, filhinha do ator Procópio Ferreira”. (A Noite, 27/11/1928)

O Paiz, 26-27/11/1928
Hoje, a Companhia Brasileira de Sainetes apresentará ao público a mais recente peça de Oduvaldo Vianna — Folha Caída, em três quadros de graça e emoção, sobre a questão do divórcio no Brasil. Estreará no sainete de Oduvaldo Vianna a sua afilhada Bibi, a encantadora Abigail Procópio Ferreira, filhinha do querido ator cômico, que ora se encontra em São Paulo. (O Paiz, 26-27/11/1928)

O sucesso foi instantâneo. O texto — que como já se viu é sobre uma mulher (Abigail) que se desquitava do marido e se casava com um primo (Odilon) no Uruguai, suscitando todo um debate sobre o tema, com um viés favorável ao divórcio — agradou, os cenários de Henrique Manzo foram elogiados, os atores foram enaltecidos e Bibi — possivelmente repetindo em sua cena o charleston dançado na Feira de Amostras — foi uma sensação:

E se o sainete é bem feito, magnífico é o desempenho que lhe deram os artistas do Trianon, acrescentados agora de mais uma figura, a menor de todas, mas que é das mais vivas, a Bibi, a filhinha graciosa de Procópio Ferreira. Muito compenetrada da sua função, a Bibi mostrou o dedo que autentica o gigante. (...) “Folha Caída” deixou excelente impressão e proporcionou fartos aplausos aos que tiveram a tarefa de vivê-la, ontem, no Trianon. (Correio da Manhã, 28/11/1928)

Foto de Folha Caída. Provavelmente
Abigail Maia e Odilon Azevedo
(Correio da Manhã, 30/11/1928)
Não se pode deixar de destacar, como uma nota colorida, de graça e de inteligência precoce, essa endiabrada Bibi, ou seja, Abigail Procópio Ferreira, a pequenina atriz de alguns palmos de altura, filha de nosso grande Procópio Ferreira... Filho de peixe... (O Paiz, 28/11/1928)

Eis o que disse Mário Nunes, o mais importante crítico teatral da primeira metade do século XX:

A interpretação satisfaz plenamente, de parte da Sra. Abigail Maia que conduz com muito tato e bem dosada emoção o papel da protagonista; de Apolônia Pinto, que pouco tem o que fazer, mas é perfeita; Brandão Sobrinho que apóia, também, na naturalidade seu sucesso. (...) Figurou também a encantadora Abigail, filhinha de Procópio Ferreira que esteve muito à vontade e dançou um charleston com muito desembaraço e graça. (Jornal do Brasil, 28/11/1928)

A peça ficou em cartaz até o dia 9 de dezembro. Excetuando, como já se viu, o protagonismo, Folha Caída é a estréia de Bibi no teatro. Não em um evento único mas em duas temporadas. As datas: 6 de setembro e 27 de novembro de 1928. Por essa conta, Bibi estaria hoje chegando aos 88 anos de carreira.

E logo na seqüência da felicidade de pisar no palco, dessa experiência inédita e prazerosa para a jovem Bibi, de conhecer na pele e na alma a arte dos pais, veio também o primeiro contato com a burrice, com a ignorância e com o preconceito mais odioso e mais abjeto: ela teve sua matrícula recusada pelas freiras cretinas, mofadas e fedorentas do Colégio Sion.

A história completa dessa recusa imperdoável está em um artigo individual. Clique abaixo para acessar:



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Depois dessa tempestade, Bibi voltou aos palcos num dos mais delicados momentos de nossa história. Em 3 de outubro de 1930 desencadeou-se o golpe militar que depôs Washington Luís e levou o candidato derrotado nas eleições de março, Getúlio Vargas, à chefia de um “governo provisório”. O gaúcho tomou posse exatamente um mês após a deflagração do golpe e ainda tomava pé dos problemas da presidência quando o Theatro República resolveu organizar a Festa Artística do ator português Nascimento Fernandes, protagonista da companhia da também portuguesa Hortense Luz. Hoje virtualmente esquecido e só lembrado por um punhado de filmes que realizou em Portugal, nas décadas seguintes, Nascimento foi uma figura estimada pelo público carioca, no fim da década de 20:

Nascimento Fernandes
Nascimento Fernandes é um artista querido, muito querido mesmo do público carioca. A sua atuação no elenco da Companhia Hortense Luz tem sido das mais eficientes e muito tem concorrido para o agrado das peças. Nascimento Fernandes é um artista que há muitos anos visita o Brasil e tem aqui enraizadas as suas amizades. (Diário Carioca, 14/11/1930)

As festas artísticas consistiam quase sempre de números variados com os membros de uma companhia, em homenagem a um deles, podendo haver também a participação de artistas de outras companhias. A diferença, nesse quadrante particular de nossa história, é que alguns artistas — por amizade, convicção política ou puro e deslavado puxa-saquismo — aproveitaram o momento para dedicar espetáculos, ou suas próprias festas a figuras vitoriosas no golpe ocorrido no mês anterior.

Flores da Cunha, por Francis Pelichek
(Fonte: Blog Prof. Círio Simon)
Assim, vemos a companhia de Olavo de Barros homenageando Góes Monteiro; uma tal de Euthalia Damasceno no João Caetano cantando canções como "Getúlio Vargas, Salve Pax!" e outras, dando “50% do produto desse concerto para a construção do monumento ao Presidente João Pessoa”. No próprio João Caetano, logo depois, também se apresentou a ilustre desconhecida Wanda Musso, “tão querida na nossa sociedade pelos seus finos dotes artísticos”. O programa, “é dedicado ao chefe do governo provisório e aos demais vultos da revolução de 3 de outubro”. (Diário da Noite, 17/11/1930)

A festa de Nascimento foi dedicada ao general Flores da Cunha. O release do espetáculo despejava água de rosas sobre o gaúcho, transformado em “herói” depois da quartelada de outubro; dizia que Nascimento Fernandes, “num gesto de nímia gentileza, querendo homenagear um dos grandes heróis da revolução triunfante, dedica a sua festa ao bravo general Flores da Cunha, seu grande amigo, que a honrará com sua presença e de todo o seu estado maior. Só isso era suficiente para fazer esgotar a lotação do Theatro República”. (A Batalha, 15-11-1930)

Correio da Manhã, 19/11/1930

Lely Morel
Não, não era. O que levou à lotação do República foi o programa excepcional marcado para o dia 19. Hortense Luz apresentou seu grande sucesso, a revista Chá de Parreira, de Xavier de Magalhães e música de Frederico de Freitas, acrescida de dois novos números; Margarida Max, espalhando beleza e carisma em números musicais; o cantor de fados e romanzas, Francisco Pezzi, a argentina Lely Morel (que morreu em 2013, aos 104 anos) cantando tangos, e os comediantes Palitos (o espanhol Pedro Pablo Seguer, à época famoso no Brasil), “um dos colegas de Nascimento que mais simpatia goza de nossa platéia, prestará o seu concurso a esta festa, fazendo coisas do arco da velha” e Norma Bruno, “que faz exímias imitações, fará nessa noite imitações do popular ator cômico Mesquitinha”. (Diário de Notícias, 16/11/1930)

Os Irmãos Queirolo
A cereja do bolo eram duas atrações: primeiramente, os Irmãos Queirolo, acrobatas circenses que a imprensa caracterizou como “célebres”, “famosos” e “notáveis”. Já passou da hora, aliás, de um livro ser escrito sobre os diversos Queirolos que assomaram e venceram na vida artística, em gerações sucessivas. Desde os palhaços Chicharrão, Chic-Chic e Harris, até os cinco acrobatas, conhecidos e respeitados em vários lugares do mundo.  Na festa de Nascimento Fernandes, foi anunciado que eles realizariam número geralmente pedido em todos os seus espetáculos: uma performance na qual faziam cópias de estátuas dos museus em Roma. Um dos poucos membros da família que não ingressou no circo foi Irma Queirolo, que incidentalmente, era mãe de Aída Izquierdo e avó materna de Bibi. Os Queirolo, portanto, eram todos tios ou tios-avós de Bibi.

Diário de Notícias, 19/11/1930

E por falar nela, a segunda cereja do bolo era justamente Bibi, cantando músicas em vários idiomas. Embora fosse a quinta aparição da filha de Procópio em público — incluindo a mini-temporada  de Folha Caída — a imprensa ainda tratava o assunto como grande novidade. E todos os jornais mencionaram o que seria a “estréia” de Bibi na festa do português:
 .
Bibi e Procópio, circa 1930
Do programa da festa de Nascimento Fernandes um número se destaca, pela delicadeza, pelo enredo especial que deve ter. É o de Bibi Ferreira, a interessante filhinha do querido e popular ator Procópio Ferreira. Bibi, que é uma criança encantadora e interessantíssima vai cantar canções em inglês, espanhol e outros idiomas estrangeiros. É a primeira vez que Bibi, que é uma grande amiga de Nascimento, vai exibir-se em público, cantando e dançando. (A Batalha, 15/11/1930)

A nota, porém, mais interessante da festa de Nascimento Fernandes será dada pela graciosa criança Bibi, filhinha de Procópio Ferreira, que cantará cançonetas em diversos idiomas. Bibi Ferreira é uma criança encantadora e a sua atuação na festa de Nascimento é motivo de grande alegria para todos. (Diário de Notícias, 16/11/1930)

E como se estes números só não bastassem, para dar um encanto especial à festa de Nascimento Fernandes, temos ainda Bibi Ferreira, a graciosa filhinha do popular ator cômico Procópio Ferreira, artista graciosa e gentil, apenas contando nove anos de idade, que se fará aplaudir cantando em diversos idiomas cançonetas engraçadas, próprias da sua idade. (A Batalha, 18/11/1930)

O jornal A Manhã de 24 de fevereiro de 1929 pode ter publicado o primeiro artigo sobre Bibi, mas ele versava sobre uma polêmica. Já esse jornal, A Batalha, no mesmo dia 18, a propósito da festa de Nascimento Fernandes, publicou aquele que é, até onde pude apurar, o primeiro artigo exclusivamente artístico sobre Bibi. É de alguém que se identifica pelo pseudônimo de “Ed”.  Não sei quem é, talvez Edmundo Maia, ou o editor de A Batalha, Tristão da Cunha, que além de jornalista era também tradutor de peças teatrais e provavelmente convivia com a família Ferreira (embora não o bastante para conhecer a verdadeira estréia de Bibi, ocorrida dois anos antes) e deixa consignado nesse artigo, intitulado “A Estréia de Bibi”, um carinho imenso pela menina e votos de sucesso que, espero, ele tenha vivido para ver concretizados, onze anos depois:

A Batalha, 18/11/1930
Minha amiguinha Bibi Ferreira vai estrear no teatro, e estrear de uma maneira encantadora, em deferência a um artista eminente, Nascimento Fernandes, em cuja festa, em homenagem ao festejado, Bibi revelará seus dotes artísticos.

Não poderia faltar com o meu augúrio pelo triunfo dessa artistazinha de nove anos, que só não deslumbrou ainda o grande público porque ainda não apareceu à luz da ribalta, essa luz maravilhosa que ilumina a glória de seu papai e que há de ser o farol de seu destino - que desejamos lindo como uma “féerie” — porque ela traz, de herança, a vocação indomável, toda ela irradiando na inteligência e na vivacidade de suas nove primaveras.

Bibi é a filhinha querida de Procópio Ferreira e de Dona Aída Procópio Ferreira. Conhecemo-la de sua casa, a casa que se chama "Casa de Bibi" e onde ela sempre soube pôr a nota alegre de sua meninice gárrula e sadia, o encanto de suas manhãs, a ventura de seus sorrisos. E ali, quando sua mamãe lhe ensina a ser uma menina ajuizada, quando seu papai quer que ela seja uma filhinha muito boa, sem se transformar nessas perigosas crianças prodígios ou no antipático “enfant-terrible”, Bibi se revela, na sua finura de observação, de jovialidade, de sua conduta, na natural brejeirice de seus comentários infantis. Bibi sabe perfeitamente caricaturar pessoas e fatos. Lembrando, com grande poder de síntese, as expressões características, dando-lhes originalíssimo sabor, Bibi sabe tão bem imitar o seu papai, nas suas multiformes personagens, como sabe satirizar aqueles que considera em “manque de respect” para consigo. Aliás, ela tem uma admirável intuição das inflexões. Boa psicóloga, ela põe mais doçura nos pedidos feitos à mamãe do que nos requerimentos apresentados ao papai: sentido das nuanças... Mamãe, para ela, é a sentinela alerta que é preciso conquistar... Papai, esse não passa de um conjurado, disposto a vencer-se em todos os assaltos, para atendê-la, mesmo que ela, como a "Marionette" do conto de Henry Bordeaux, reparando na sua pusilanimidade, ainda lhe diga:
— “Comme tu es faible, papa!”...

E notem que se Bibi não cita a sua sósia francesa e se não repete as arteirices de uma outra criaturinha literária — “Miquette”, de Gyp — é porque já sabe criar coisas mais deliciosas ainda, na cumplicidade de uns olhos que falam, que sentem e interpretam, na cumplicidade brejeira de seu narizinho "retroussé"...

Bibi Ferreira, que herdou da mamãezinha uma sensibilidade fina, de raça antiga e boa, herdando de papai aquele temperamento plástico e aquela inteligência vocacional de meridional com grande projeção simpática, é uma linda promessa, uma esperança radiosa que desejo ser o primeiro a saudar como um arrebol de inteligência e de sensibilidade, a quem desejo ofertar, num auspício de triunfo, o primeiro ramalhete de flores e as primeiras palavras de carinho, sinceras e puras como a sua pequenina vida.

ED.

O Jornal, 22/7/32
No dia 9 de julho de 1932 os paulistas, cansados de esperar Vargas convocar a assembléia constituinte que prometera desde o golpe de 30, deflagraram um movimento revolucionário armado com o objetivo de tirá-lo da presidência. Na mesma semana, alheias a tudo isso, um grupo de senhoras "de nosso corpo diplomático e da alta sociedade", geralmente esposas de empresários endinheirados, promoveu encontros de caridade sob o nome de "Pequena Cruzada", que pretendia arrecadar fundos para poder finalizar a construção do "Orfanato, Ambulatório, Enfermaria, Escola Primária e Profissional da Pequena Cruzada, à Avenida Epitácio Pessôa, 1.425".

Houve uma série diária desses encontros, nos quais diferentes grã-finas serviam chás às pessoas que compareciam, dispostas a doar quantias significativas para a obra de caridade. E é claro que havia a parte artística, para que o evento não fosse apenas um chá modorrento em alguma confeitaria do Largo da Carioca. No chá do dia 22 de julho, quem animou os presentes foram "a senhorita Bibi Procópio Ferreira, em declamação, e a senhorita Dyla Cruz, em canto". Bibi, com dez anos, certamente aprendera com o pai, exímio declamador, a recitar poemas. E Dyla mais tarde seria uma respeitada cantora lírica. (O Jornal, 22/7/32)

Beira-Mar, 10/12/1932

Em dezembro — fim do quarto ano primário no Anglo-Americano  Bibi reapareceu nos jornais. Para a festa de encerramento do ano letivo, a escola organizou um evento de caridade a ser realizado no Theatro Casino (ao lado do Beira-Mar, onde se apresentou o Teatro de Brinquedo, em 1927), no Passeio Público, no sábado, 10 de dezembro, às 16h. O espetáculo teria sua renda revertida para a entidade filantrópica “Casa do Pobre”, em Copacabana, “benemérita instituição que está recebendo adesões e aplausos gerais” (Correio da Manhã, 7/12/1932) e o programa estava dividido em duas partes: primeiro uma opereta em três atos chamada As Jardineiras (sobre a qual não encontrei qualquer referência, então ou foi composta especialmente para a festa, ou é adaptação de uma opereta já existente) e, terminada a peça, os “divertissements”, com números variados de música e dança dos quais tomariam parte vários dos alunos e alunas.

Bibi: na "Dança das Borboletas"
e três números de "divertissements"
(Beira-Mar, 10/12/1932)
Infelizmente não consta na imprensa o nome do professor ou da professora que dirigiu a opereta, porque deve ter sido um trabalho hercúleo; eram seis personagens para seis alunas e pelo menos 120 outros alunos divididos em “uma comitiva”, “fadas azuis”, “fadas do orvalho”, “anões”, “fadas pequenas”, “estudantes”, “Dança das flores” e “Dança das borboletas”. Bibi estava inserida no último grupo, de onde se deduz que sua participação foi dançando. Junto a ela, suas colegas Carol Goldstein, Helena Azevedo, Frida Steinberg, Yvonne Aaluf, Beki Alfassa, Isaura Sá, Ana Maria Boggy, Sybil May de Bettencourt, Edna Maria Moraes, Solange Pinto, Martha F. Mendes, Esther Behar e Heloiza P. Veiga.

A opereta, como se vê, era para que todos tivessem oportunidade de aparecer. O destaque eventual para os alunos mais talentosos estava nos “divertissements”. Dos doze, Bibi esteve em três: “Primavera”, de Johann Strauss, que imagino ser a valsa Frühlingstimmen, “Vozes da Primavera”, com as colegas Renée Grossman, Leda Faria, Paulina Moschcovitch, Isaura Sá, Belkiss Ramm, Frida Steinberg, Yolanda Forte, Marília e Maria Helena Azevedo, Solange Pinto, Carol Goldstein, Guiomar Vieira, Maria Gandleman, Maria Cecília e Martha Ferreira Mendes, e Maria Lúcia Aché. Bibi pode ter cantado (a valsa tem um vocal para soprano) ou dançado a valsa com as outras.

Logo depois Bibi cantou o foxtrote “Eis Nova York”, certamente Do the New York, de J. P. Murray, Barry Trivers and Ben Oakland, lançada no ano anterior, no último espetáculo criado pelo grande Flo Ziegfeld, que morreu em julho 32; e por fim um número anunciado como “Hollandáise, de Grieg, com Renée Grossman e Bibi. Imagino que seja a Danse Hollandaise, pouco conhecida, de Edvard Grieg. O espetáculo foi concluído com um número de valsa que tinha como destaque a professora Maria Luiza Carbonell.

Aída e Bibi

Correio da Manhã, 3/1/33
Mais caridade: no dia 7 de janeiro de 1933 aconteceu uma festa artística em benefício de "futuras obras complementares" da Policlínica de Botafogo, "instituição que há trinta e dois anos representa um exemplo de dedicada operosidade e que vem prestando, assim, à pobreza desta capital, os mais inestimáveis amparos". O evento foi organizado, como sempre, por um grupo de esposas de empresários e teve lugar na sede Botafogo F. C., que ficava em um palacete na avenida Wencesláo Braz. A primeira parte da celebração, iniciada às 17h, foi de entrega de "títulos de benemerência". Depois veio o chá dançante, "servido por formosas senhoritas da nossa élite social", e na seqüência um sorteio de inúmeros objetos de valor, como "dois quadros de artistas conhecidos, jarros, bibelôs, porta-jóias, almofadas e pequenos objetos artísticos e de joalheria e perfumaria". Essa parte da festa teve como grande destaque a presença da paranaense Didi Caillet, que ficou conhecida no Miss Brasil de 1929, quando, mesmo sendo favoritíssima, foi derrotada pela candidata do Distrito Federal, Olga Bergamini.

Didi Caillet (O Cruzeiro, 13/4/29)
A vencedora teve que receber coroa e faixa ao som de "É Paraná! É Paraná! É Paraná!", gritado pelos milhares de pessoas que lotavam o estádio do Fluminense. Didi, muito além da beleza, era uma jovem inteligente e declamadora talentosa. Conquistou os meios intelectuais e artísticos do Rio de Janeiro e é lembrada hoje como a primeira paranaense célebre nacionalmente. Participou da noite em benefício da Policlínica e ainda doou uma cópia de seu recém-lançado livro, "Reviver" (de outros que lançaria no futuro), para o sorteio. (Correio da Manhã, 3/1/33, O Radical, 7/1/33)

A parte artística foi deixada ao cargo de outra jovem adorável, a declamadora amazonense Nenê Baroukel. Ela vencera um concurso de declamação instituído pelo Diário Carioca no ano anterior, vinha adquirindo prestígio nas altas rodas da capital e se tornaria, pouco depois, uma das mais procuradas professora de declamação do país. "Brilhante dictriz" era apenas um dos elogios que na época se faziam a Nenê. A revista O Malho falava sobre ela citando "sua vibratilidade, sua graça natural e seu tropicalismo". (Março/40)

Nenê Baroukel (Fon Fon, 28/2/31)
A excelente seleção de Nenê promoveu curiosa mistura entre artistas e socialites com pendores artísticos, de forma que o canto lírico foi representado ao mesmo tempo por Wanda Oiticica — respeitada soprano e irmã mais velha da futura atriz Sônia Oiticica  e Flavita Azeredo da Silveira, de uma família de diplomatas; a música popular teve a cantora Zezé Fonseca e a esposa do empresário Miguel Barroso do Amaral (tio de Zózimo), Lucília Noronha; e o compositor Maurício Joppert, que eu imagiava ser um homônimo do conhecido engenheiro, mas o Dicionário Cravo Albin afirma serem ambos a mesma pessoa.

Além deles estavam lá os cantores Arnaldo Pescuma, Roberto Vilmar e Breno Ferreira, o pianista Mário Cabral, a irmã de Gabriella Besanzoni, Adriana, a declamadora Dalila Geraldo, e, como não poderia deixar de ser, "fox-trot, pela Srta. Bibi Procópio Ferreira", acompanhada pela orquestra do Grill Room do Copacabana Palace. (Correio da Manhã, 5/1/33)

Nenhum evento. Apenas o jornal "A Noite" anunciando que Bibi e Aída chegaram ao Rio
de navio, provenientes de São Paulo, para "os festejos de Momo" (A Noite, 23/2/33)

O Paiz, 24/10/33
A "Pequena Cruzada" era (ou se tornou) um evento anual e Bibi esteve presente na nova temporada de chás promovido por suas patronesses, em julho de 1933. No dia 13 a parte artística da tarde foi dividida entre "a notável Elisa Coelho de Andrade que é a mais completa intérprete das canções modernas brasileiras" (além de mãe do grande jornalista e repórter Goulart de Andrade), e Bibi, que "declamou e fez imitações". (Diário Carioca, 14/7/33) A última participação de Bibi naquele ano foi na festa artística da atriz argentina Annita Bobasso, figura proeminente de uma companhia argentina de revistas que vinha ocasionalmente ao Brasil e fez sucesso naquele início da década de 30. Lamento haver pouquíssima documentação sobre o evento, ocorrido no dia 23 de outubro, porque além da presença do então interventor Pedro Ernesto e mais uma pilha de notáveis, participaram, como convidados, o cantor João Petra de Barros e ninguém menos do que Francisco Alves, além de Bibi. (O Paiz, 24/10/33)

Correio da Manhã, 18/12/1934
Bibi só voltou à imprensa no fim do ano seguinte. Sábado, 15 de dezembro de 1934, o Anglo-Americano promoveu uma bela festa de formatura dos alunos do curso ginasial e das formandas do curso de secretariado. Às nove da manhã, desta vez nas próprias dependências do Anglo, começou o espetáculo de canto e dança, com cerca de 30 alunas da professora de dança Vera Wilson Duder. Bibi, pra variar, se destacou; de onze apresentações, ela esteve em quatro. Vamos a eles:

1 — "Ballet", de Tchaikowsky. Sem maiores especificações, imagina-se que seja uma cena de um dos três balés do compositor: O Lago do Cisne, O Quebra-Nozes ou A Bela Adormecida. Participaram Alexandrina Jacques, Bibi, Leda Faria, Marília Azevedo, Maria Cândida Senna, Lucy Santos, Siona Schneider, Maria e Luiza Seixas Corrêa, Jacy Pires, Simone Rocha, Jacinilia Paranhos da Silva, Maria Lúcia Lacerda Franco, Carmen de Souza e Carolina Alvarenga.

2 — "Contradance", de Beethoven, que Bibi tocou sozinha, provavelmente no violino ou no piano.

3 — "Nasty Man", de Ray Henderson (música), Jack Yellen e Irving Caesar (letra), lançada naquele ano, e que Bibi certamente cantou com alguém ao piano. E a música narcou para sempre, porque ela a reprisou quase 80 anos depois, no Bibi in Concert IV.

4 — "Dança Russa", de Modest Petrovich Mussorgsky. Este pode tanto ter sido um número de violinos (o Hopak, por exemplo), quanto um número de dança com uma das canções mais alegres do compositor. Bibi dividiu o palco com Marília de Azevedo e Leda Faria.

Findo o espetáculo, houve uma distribuição de medalhas para os alunos que mais se distinguiram nos diferentes cursos. Bibi, Maria Helena de Azevedo e Alexandrina Jacques foram premiadas pelo desempenho no curso de dança. No dia 20 de setembro de 1935 a chamada “Guerra dos Farrapos”, ou “Revolução Farroupilha”, completou um século.  Comemorações ocorreram por todo o Brasil enaltecendo o povo do Rio Grande do Sul, e um certo “Club de Cultura Moderna” promoveu, nos salões do Botafogo F. C., uma grande comemoração para aquela noite.

A Noite Farroupilha e a Escola
de "Dança" Portella
(A Manhã, 19/9/1935)


Pró-forma, o evento tinha uma comissão organizadora formada por pessoas como o médico Manoel Venâncio Campos da Paz, a educadora Armanda Álvaro Alberto, a crítica cinematográfica Zenaide Andréa, ou seja, figuras aparentemente apolíticas. Era o contrário. O Club de Cultura Moderna era formado por artistas e intelectuais de esquerda, entre eles, Elói Pontes, Jorge Amado, Febus Gikovate, Maurício de Lacerda, Santa Rosa e — adivinhem — Álvaro Moreyra e Di Cavalcanti. De orientação anti-fascista e anti-nazista, o clube era, ademais, uma espécie de braço artístico e intelectual da Aliança Nacional Libertadora, de Prestes, Gregório Bezerra e tantos outros comunistas.

A comissão seguia precisamente essa linha: Campos da Paz, por exemplo, era um dos fundadores da ANL. Armanda era da ANL e fundara, com Eugênia Moreyra, a pioneira União Feminina do Brasil. Entre os propósitos da existência do clube estava “estudar e divulgar entre as massas as diretrizes modernas do pensamento humano”. A “Noite Farroupilha”como foi batizada, era, em tudo e por tudo, um evento de esquerda, e toda sua renda seria revertida para a construção de uma Biblioteca Popular.

Bando da Lua
As informações da imprensa são um pouco confusas, o programa muda a cada propaganda, artistas aparecem e desaparecem, mas a julgar pela média do que apareceu nos jornais, as atrações da “Noite Farroupilha”, naquele 20 de setembro de 1935, às 21h, foram espetaculares. O sarau foi inaugurado no jardim do local, com um destacamento inteiro da Portela fazendo “uma série de evoluções”. Houve vários grupos de dança — um de danças regionais (Rancheira e Rumba), as alunas da professora Lydia Rocha e os dançarinos estrangeiros do High Life Club —  e Bibi se apresentou com dois números de sapateado, acompanhada do professor Júlio de Oliveira (que infelizmente não consegui apurar quem é). Na parte de declamação apresentaram-se Eugênia Moreyra e Luiza Barreto Leite.

Noel Rosa
Mas as atrações musicais da noite é que realmente foram imperdíveis: o Bando da Lua cantou algumas músicas, Elsie Houston também cantou, estavam lá Heckel Tavares e Marcelo Tupinambá, os Irmãos Tapajós, os irmãos Waldemar Henrique e Mara Costa Pereira, e, como jóia da coroa, a presença luminosa de ninguém menos do que Noel Rosa. Como se não fosse o suficiente, nos intervalos havia uma banda de Jazz. (A Manhã, 18 e 22/9/1935; Gazeta de Notícias, 19 e 20/9/1935)

Foi nessa festa, embora em números diferentes, que aconteceu o primeiro contato artístico de Bibi e Noel. O destino lhes reservava outro para muito breve. Só que esse mesmo destino foi inclemente para o “Club de Cultura Moderna”; dois meses depois dessa festa, em 23 de novembro, eclodiu a chamada Intentona Comunista, de Luiz Carlos Prestes. O clima político azedou completamente e muitos dos membros do clube tiveram que desaparecer para não sofrerem a vergasta da perseguição pela ditadura de Vargas. Em novembro de 37, quando foi instaurado o Estado Novo, o clube acabou de vez.


FIM DA PRIMEIRA PARTE
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VEJA TAMBÉM:
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BIBLIOGRAFIA
  • A Batalha
  • A Crítica
  • A Gazeta
  • A Manhã
  • A Noite
  • Correio da Manhã
  • Correio Paulistano
  • Diário Carioca
  • Diário da Noite
  • Diário de Notícias
  • Diário Nacional
  • Gazeta de Notícias
  • Jornal do Brasil
  • O Jornal
  • O Paiz
  • O Radical
  • Beira-Mar
  • Fon Fon
  • Frou Frou
  • O Cruzeiro
  • O Malho
  • "Bibi Ferreira, Uma Vida no Palco"
  • BARCELOS, Jalusa. Procópio Ferreira, o Mágico da Expressão. Rio de Janeiro, Funarte, 1999.
  • DULLES, John Foster. Anarquistas e Comunistas no Brasil. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1977.
  • FERREIRA, Procópio. Procópio Ferreira apresenta Procópio. Rio de Janeiro, Rocco, 2000.
  • VIOTTI, Sérgio. Dulcina: Primeiros Tempos (1908/1937). Rio de Janeiro, Fundacen, 1988.

Um comentário:

  1. Muito bom! Talvez você já esteja cansado de elogios, mas, o que dizer se você se supera.

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