quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Sortido Cultural


CENTENÁRIO DE NELSON RODRIGUES

Nelson em 1949
Bom, antecipando em um dia a comemoração do centenário do Nelson, publico aqui duas fotos dos ensaios de A SENHORA DOS AFOGADOS, de 1954. A peça estava censurada havia um ano, foi liberada por gestões de Otto Lara junto a Tancredo Neves, então Ministro da Justiça, e acabou montada pela efêmera Companhia Dramática Nacional, de Henrique Pongetti, criada sob os auspícios do Serviço Nacional de Teatro, quando estava sob o comando de Aldo Cavet.

Mais auspicioso ainda foi o fato de Pongetti ter convidado Bibi para dirigir o espetáculo, o que hoje pode ser visto de forma simbólica; Procópio, seu pai, representava, justa ou injustamente, o teatro de comédia que Nelson e seu teatro haviam sobreposto e jogado na obsolescência. Aceitando o convite, ela provava sua versatilidade, sua modernidade e fazia uma espécia de ponte entre a geração que se apagava e aquela que surgia, trazendo o melhor dos dois mundos. E o cenário ficava a cargo do celebérrimo paraibano Tomás Santa Rosa, cenógrafo da lendária primeira montagem de VESTIDO DE NOIVA e ilustrador de livros dos autores mais importantes do Brasil, pela José Olympio (Santa, aliás, morreu prematuramente, somente dois anos depois, em 1956, aos 47 anos).

Acima, Bibi, Sônia Oiticica e Nelson e abaixo, Bibi, Natália Timberg e Maria Fernanda


Programa com o elenco de 1954
Mais do que sucesso, o espetáculo gerou polêmica. É famosa a história de que no fim da estréia carioca, em 1º de julho de 54, metade do público gritava que Nelson era um "gênio" e a outra metade o apodava de "tarado". Nelson teria subido ao palco para admoestar a segunda metade, chamando-os de "burros". Seja como for, a primeira montagem de A SENHORA DOS AFOGADOS teve uma elogiada direção de Bibi - que vemos na primeira foto dirigindo Sônia Oiticica, ambas observadas pelo próprio Nelson - e um elenco brilhante que incluía nomes já consagrados como o de Maria Fernanda - à direita, na segunda foto - e a estréia profissional de Natália Timberg - no meio, na segunda foto, entre Bibi e Maria Fernanda.

Enfim, feliz centenário a Nelson, o bom tarado. (22/8/2013)

O BONDE DO CATETE

Que delícia de época, aquela em que o afamado revisteiro J. Maia (que está vivo até hoje, creio) podia fazer divertido trocadilho fonético com o bonde que ia ao Catete, e o bonde eleitoral que iria levar um daqueles candidatos ao Palácio do Catete. Era mesmo um Bonde do Cacete! No desenho vemos a propaganda da peça, que estreou em setembro de 1949, véspera do ano eleitoral, em que as candidaturas ainda se desenhavam.

Vargas é o guarda de trânsito, só observa de longe, dando coordenadas e movendo os peões do tabuleiro político, sempre ao lado de sua própria conveniência, sem assumir compromisso que não possa ser quebrado sumariamente minutos depois. Em cima do bonde, tal qual verdadeiro surfista pré-histórico dos trens, está o cacique catarinense e vice-presidente, Nereu Ramos, surfando entre trampolinagens e picaretagens, em busca de garantir o seu. Na frente de todos, o desastrado motorneiro Adhemar de Barros, então num verdadeiro espinheiro político; governador de São Paulo, mas brigado com seu vice (Novelli Jr., genro de Dutra), o que o impossibilitava de se desincompatibilizar e concorrer à presidência, por temer que Novelli decretasse uma devassa policial em sua administração no momento em que assumisse, jogando no ventilador da imprensa todas as suas contravenções e arruinando suas chances de chegar ao Catete.

Eros Volúsia, em 1941
Na seqüência temos Oswaldo Aranha, líder civil do malsinado golpe de 30 e agora diplomata na ONU, também procurando manter-se vivo entre o bem e o mal. E os retardatários que no fim se tornavam o fiel da balança: o ainda poderosíssimo governador baiano Otávio Mangabeira, o governador mineiro Benedito Valadares, o também mineiro ex-presidente Arthur Bernardes e o último, que me foi o mais difícil de reconhecer, mas que imagino ser o ladino e escorregadio Cyrillo Jr.

No elenco de Bonde do Catete as maiores figuras do Teatro de Revista, como Armando Nascimento, Áurea Paiva, Eros Volusia, Floripes Rodrigues, Silvino Neto (pai do comediante Paulo Silvino), Tito Caldareli, Walter D´Avila e Zaira Cavalcanti.

No Teatro Santana, atrás do Teatro Municipal.

Na eleição do ano seguinte, o único que participaria, efetivamente, como candidato, seria Vargas. Seus adversários foram Eduardo Gomes e Cristiano Machado. Vargas venceu. E se matou quatro anos depois, em 24 de agosto de 1954. (23/8/2012)

SEM PENSAR, com Denise Fraga e Júlia Novaes

Com Júlia Novaes
No feriado de 7 de setembro fui ao Memorial da América Latina assistir o encerramento da temporada nacional de Sem Pensar, peça da jovem inglesa Anya Reiss que Denise Fraga mandou traduzir e montou com direção de seu marido, o diretor de cinema Luiz Villaça. O teatro estava apinhado de gente até o teto e a apresentação foi marcada pela emoção do elenco e do público, no que foi a despedida de uma temporada de sucesso. Sobre Denise não é necessário dizer nada; admirador dessa magnífica atriz há 25 anos, considero-a perfeita em tudo que faz. Na pele da atrabiliária mãe de família Vicky, deleitou a todos com suas lamúrias e seus escândalos. Mas quem realmente roubou a cena foi Júlia Novaes, que encarnou a adolescente Delilah, pára-raio de toda a disfuncionalidade de seus pais. Amigo de sua família, conheci Júlia pessoalmente há vários anos, e na última década acompanhei ocasionalmente seus trabalhos no palco, quando ela decidiu se enveredar pela seara teatral.

Denise e Júlia em "Sem Pensar!
O papel da adolescente que enfrenta tanto angústias quanto a descoberta de sua sexualidade é tão manjado que geralmente constitui armadilha para qualquer atriz. Não neste caso. Reiss não tentou, em nenhum momento, escrever um tratado definitivo sobre a adolescência. Escreveu despretensiosamente, ao correr da pena, como mera atividade de seu grupo de dramaturgia no Royal Court Theater. Júlia seguiu a mesma linha. Sua interpretação não tem exageros e sua dramaticidade é perfeitamente crível. No mais, explorou o viés cômico do personagem, fugindo de forma inteligente do subterfúgio fácil de torná-lo simplesmente ridículo; foi divertida sem ser cretina, foi comovente sem ser patética, e tudo com uma energia extraordinária, não deixando nem por um minuto sua performance perder a força, num espetáculo em que ela é, de fato, a protagonista. Um excelente trabalho. E um prazer revê-la. (9/9/2012)


OS 90 ANOS DE PAULO AUTRAN

Concentrado em assistir Denise Fraga na peça “Sem Pensar”, no teatro do Memorial da América Latina, acabei esquecendo que naquele dia, sexta-feira, 7 de setembro, Paulo Autran completaria 90 anos. A comemoração se reveste de saudade, o mestre nos deixou em 2007, mas sua presença é sentida não só nos palcos, mas nas mais variadas manifestações artísticas.

Hoje não falarei dele, embora tempo suficiente tenha passado, desde sua partida, para que em breve eu redija algo interessante sobre o período em que acompanhei sua carreira. Prefiro celebrar esses 90 anos voltando ao início, mostrando um documento de sua primeira consagração: o prêmio de revelação como melhor ator por sua performance na peça de Guilherme Figueiredo, Um Deus dormiu lá em casa, em que dividiu o palco com Tônia, Vera Nunes e Armando Couto. A direção foi de Silveira Sampaio e o espetáculo estreou em 13 de dezembro de 1949. Já no dia 9 de janeiro de 1950 a Associação Brasileira de Críticos Teatrais se reuniu e decidiu os melhores do ano anterior.

Diário da Noite, 10/1/50
Guilherme e Silveira já tinham certa nomeada e receberam os prêmios de melhor autor e diretor. O prêmio de melhor ator não chegou a ser concedido, por algum pepino da votação. O de melhor atriz foi para Eva Todor, por Lili do 47, de Joracy Camargo, que ela montou com sua própria companhia no ano anterior. Paulo e Tônia receberam os prêmios de revelação para ator e atriz, cujo critério era “primeira peça, ou para os que apareceram, no máximo com seis meses de atividade profissional”. Ambos qualificavam, pois Paulo já estava há dois anos trabalhando em teatro, mas sem se profissionalizar e sem deixar completamente a advocacia. E Tônia pisava em um palco pela primeira vez, recém-chegada de um curso de interpretação na Europa. De quebra veio o prêmio de revelação para melhor cenógrafo, destinado a Carlos Thiré, na época marido de Tônia (Vera Nunes e Armando Couto não foram agraciados pela simples razão de que não havia prêmios para coadjuvantes). E sob o mesmo critério de revelação, o prêmio de melhor autor foi para Gustavo Dória – que se aventurou pela dramaturgia embora fosse formalmente um crítico – e o de melhor diretor foi para Sadi Cabral, que na verdade era ator há mais de 20 anos.


O que veio a seguir foram 58 anos de carreira que misturaram quatro peças de Shakespeare, quatro de Molière, e o repertório mais eclético de todos os tempos, incluindo Brecht, Ibsen, Sartre, Gorki, Beckett, Pirandello, Sófocles, Goldoni, Feydeau, Shaw, Pinter, Noel Coward, Arthur Miller, Tenessee Williams e dezenas de outros. Entre os brasileiros, Gonçalves Dias, o já citado Guilherme, Pongetti, Callado, João Cabral de Mello Neto, Flávio Rangel, até chegar a Mauro Rasi e Maria Adelaide Amaral. Comédias de costumes, boulevard, dramas, tragédias, musicais e até novelas, Paulo fez tudo. Saudade. (10/9/2012)


45 ANOS DE "LA MOSCHETTA", DE ANGELO BEOLCO, DIREÇÃO DE BOAL, NO TEATRO DE ARENA



"Fica-nos o espetáculo como teatro ou como "estilo" de representação. E quanto a isso, Augusto Boal deu à La Moschetta uma ótima direção, atualizando, em ritmo, em cor, em expressão cênica, um texto sem dúvida magnífico, admiravelmente traduzido por Mário da Silva e interpretado por Gianfrancesco Guarnieri.

Pode mesmo dizer-se que a comédia é toda de Guarnieri, o qual, sobretudo na primeira parte e, especialmente, no prólogo, nos dá um nível histriônico tão versátil, dentro de um mecanismo da expressão vocal e corporal síncrono, que surpreende pela riqueza de recursos e sutilezas. Certas cenas bufas e cômicas são exemplares como arte de representar". (João Apolinário, 27/11/67)

Na foto, Fagundes, Guarnica, Myriam Muniz e Sílvio Zilber. (17/09/2012)

HEBE


Hebe era considerada unanimemente a "Primeira Dama da TV". Por uma razão muito simples: é exatamente o que ela era. Era exagerada, era brega, falava bobagens, ria escandalosamente, mas, ao mesmo tempo, era doce, simpática, solidária, divertida e generosa. O tempo se encarregou de transformar tudo isso em um conjunto de qualidades que fazia de Hebe uma amiga, uma companheira, e uma apresentadora inigualável.

Nos últimos anos foi impossível não elevá-la ao padrão de divindade televisiva. Embora ela fosse extremamente simples (estive com ela em três ou quatro oportunidades), assisti-la era assistir a história da televisão. Ao contrário do que diz o obituário do UOL (sempre estupidamente errado), Hebe não estreou na TV em 1955. "no primeiro programa feminino da TV brasileira, "O Mundo é das Mulheres", da emissora de TV carioca, na qual chegou a apresentar cinco programas por semana". Mentira. Pesquisa mal-feita. Hebe era contratada das Emissoras Associadas de Chateaubriand desde 1949, e quando a TV estreou, em 1950, ela estava lá. Pode ter faltado à inauguração e sido substituída por Lolita Rodrigues - história conhecida - mas já nos dias seguintes estava lá como apresentadora, mesmo, da programação inicial da emissora, junto a pessoas como Ribeiro Filho, Rui Rezende, Paulo Salomão, Lia de Aguiar, Maurício Loureiro Gama e assim por diante.

Há muito pra se dizer sobre essa mulher, nossa maior apresentadora. No Face, basta dizer que ela será como Chacrinha: o espaço que ela deixa nas noites de segunda, ninguém preenche. Seu lugar é único. Sentiremos, todos, saudade de sua maneira extrovertida, espalhafatosa, bonachona de ser. Um beijo imenso, saudoso, eterno, de carinho para a querida Hebe.

* (A reportagem acima vem do Diário de São Paulo, de julho de 1949, quando Hebe começava a se notabilizar como cantora de sambas e marchas carnavalescas) (29/09/2012)

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O Adeus à querida Hebe. Hora de escarafunchar os "arquivos de papel", daquela época cada vez mais distante de negativos, filmes e álbuns fotográficos de 12, 24 ou 36 fotos.

Hebe tinha uma tal vivacidade, uma alegria de viver tão tangível, tão plausível, uma eletricidade, uma magnetismo, um carisma, que não se imaginaria que algum dia pudesse ser colhida pela morte.

Foi. Levou consigo toda essa energia maravilhosa, positiva, benéfica, que a nós fará tanta falta. Mas deixa, pelo menos, muitas, muitas lembranças, os programas gravados e essa foto, de agosto de 1993, tirada nos estúdios que Jô Soares ocupava, então, no Sumaré.

Estúdios, por sinal, ao lado daquele que a própria Hebe usou em setembro de 1950, quando estreou na TV, veículo que também estreava naquele mês. (02/10/2012)

SEBASTIÃO VASCONCELOS

Só hoje soube que perdemos o Sebastião em julho... ator maravilhoso, que conheci no Rio, em 94 (foto) e com quem tive o privilégio de conversar uma última vez, pelo telefone, há exatos dois anos, sobre o seu Othello - o primeiro desde João Caetano - graças à amiga Maria Cecilia.

Penso na companhia Tônia-Celli-Autran. Um pavão como Paulo, um touro como Osvaldo Loureiro, um nefelibata como Cláudio Corrêa e Castro e um paraibano arretado mas tímido e bom, como Sebastião. Que extraordinária mistura... é famosa a inveja que Paulo sentiu do público aos pés de Sebastião na "Viúva Astuciosa" de Goldoni. Sebastião não passava recibo. Trabalhava. e melhorava cada vez mais.

Este ano perdemos Sebastião, perdemos Walmor... agora mesmo soube que Felipe Wagner também se foi em julho. Que pena, que artistas maravilhosos, incomparáveis, tão melhores do que as gerações que os sucedem... Descanse em paz, irmão! (3/11/2013)

TOM E VINÍCIUS, CHOPP DA BRAHMA


Meus caros,

Queria ter postado isto no centenário de Vinícius. É um comercial da Brahma de 1991, que utilizou aquilo que era a tecnologia mais extraordinária da época, para antecipar um encontro que ocorreu três anos depois.

Quando assisti, chorei. Achei uma jóia de sentimento e de criatividade. Não parei de ver TV até gravar em video. A crítica, aquela patrulha babaca que nunca deixou o Tom em paz, desceu o pau; disse que era mórbido, que era exploração... ô gente infeliz.

Quem conhece, reveja. Quem não conhece, conheça e se emocione.




AYN RAND - DA PRODUTIVIDADE

Ayn Rand
Meus caros,
estou maravilhado com Ayn Rand. Poderia passar o resto do dia postando seus irretocáveis pensamentos sobre tudo. Neste momento vou pinçar dois comentários sobre 
produtividade, que endosso com o máximo prazer. Lembrei Bilac:

Se um moço escritor viesse, nesse dia triste, pedir um conselho à minha tristeza e ao meu desconsolado outono, eu lhe diria apenas: ama a tua arte sobre todas as coisas e tem a coragem, que eu não tive, de morrer de fome para não prostituir o teu talento!

The virtue of Productiveness is the recognition of the fact that productive work is the process by which man’s mind sustains his life, the process that sets man free of the necessity to adjust himself to his background, as all animals do, and gives him the power to adjust his background to himself. Productive work is the road of man’s unlimited achievement and calls upon the highest attributes of his character: his creative ability, his ambitiousness, his self-assertiveness, his refusal to bear uncontested disasters, his dedication to the goal of reshaping the earth in the image of his values. “Productive work” does not mean the unfocused performance of the motions of some job. It means the consciously chosen pursuit of a productive career, in any line of rational endeavor, great or modest, on any level of ability. It is not the degree of a man’s ability nor the scale of his work that is ethically relevant here, but the fullest and most purposeful use of his mind.

Ayn Rand
.Productiveness is your acceptance of morality, your recognition of the fact that you choose to live:
—that productive work is the process by which man’s consciousness controls his existence, a constant process of acquiring knowledge and shaping matter to fit one’s purpose, of translating an idea into physical form, of remaking the earth in the image of one’s values;
—that all work is creative work if done by a thinking mind, and no work is creative if done by a blank who repeats in uncritical stupor a routine he has learned from others;
—that your work is yours to choose, and the choice is as wide as your mind, that nothing more is possible to you and nothing less is human;
—that to cheat your way into a job bigger than your mind can handle is to become a fear-corroded ape on borrowed motions and borrowed time, and to settle down into a job that requires less than your mind’s full capacity is to cut your motor and sentence yourself to another kind of motion: decay;
—that your work is the process of achieving your values, and to lose your ambition for values is to lose your ambition to live;
—that your body is a machine, but your mind is its driver, and you must drive as far as your mind will take you, with achievement as the goal of your road;
—that the man who has no purpose is a machine that coasts downhill at the mercy of any boulder to crash in the first chance ditch;
that the man who stifles his mind is a stalled machine slowly going to rust;
that the man who lets a leader prescribe his course is a wreck being towed to the scrap heap, and the man who makes another man his goal is a hitchhiker no driver should ever pick up;
—that your work is the purpose of your life, and you must speed past any killer who assumes the right to stop you;
that any value you might find outside your work, any other loyalty or love, can be only travelers you choose to share your journey and must be travelers going on their own power in the same direction.

http://aynrandlexicon.com/ (03/01/2014)

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