segunda-feira, 4 de maio de 2015

A Temporada de Ernesto Rossi no Brasil em 1871 — Parte 1/3


Ernesto Rossi

Vamos conhecer, enfim, a arte e o gênio que ilumina o palco, entusiasmando o povo!
Quando Ernesto Rossi chegar poderemos dizer afoitamente que o teatro brasileiro está aberto e que nos deparamos, finalmente, com a pia batismal da inspiração e dos louros! (Diário do Rio de Janeiro, 19/3/71)

Aquele que move com um olhar o povo, com a palavra elétrica e inspirada as almas absortas na luz do seu incomparável gênio; o intérprete de Shakespeare e Alfieri; o farol da arte moderna digna-se de nos iluminar um pouco! (Mundo da Lua, 18/3/71)

Ernesto Rossi significa a encarnação do ideal artístico nas suas mais caprichosas particularidades. Neste momento é o primeiro trágico, digamos com mais acerto, é o primeiro artista do universo. (Diário do Rio de Janeiro, 12/4/71)

Artistas como o Sr. Rossi aparecem no mundo com intervalos seculares, como estes astros errantes que visitam a Terra em longuíssimos períodos, espalhando o assombro e enchendo de admiração os povos, que neles vêem uma prova da grandeza de Deus. (Diário de Pernambuco, 28/4/71)

É Hamleto, a dúvida! É Romeu, o amor! É Orestes, o mistério! É Carnioli, o ceticismo! É Kean, o gênio! Proteu admirável! Corre sem o menor tropeço das ondas de sangue em que a tragédia banha a sua clâmide flutuante, aos raios da lua que predizem os sonhos divinos, e à careta de Pourcegnac que descobre o pincel arisco de Molière! (Diário do Rio de Janeiro, 7/5/71)

Ernesto Rossi, sem a mais leve sombra de contestação e de discussão, é o primeiro artista que tem pisado o palco brasileiro, e, na opinião valiosa da crítica universal, o primeiro artista trágico do mundo. (Diário do Rio de Janeiro, 10/5/71)

Eu sou dos últimos. Ainda o não vi aqui mas não me é desconhecido, e espero ir vê-lo para poder ter o gostinho de dizer a algum ratão de mau gosto: não viste o Rossi? Pois não és digno do grande mundo. (Diário de Notícias, 10/5/71)

A estréia de Ernesto Rossi é o maior acontecimento do teatro brasileiro. A Ristori foi a luz predecessora; a realidade da luz é Ernesto Rossi. (Diário do Rio de Janeiro, 11/5/71)


João Caetano dos Santos
Em 24 de agosto — data aziaga para nosso país — de 1863, pela manhã, o coração de João Caetano parou de bater, aos 55 anos. Foram várias mortes em uma só. João era a um tempo o primeiro, o maior e o único ator dramático do país. Era diretor de sua companhia, ou “ensaiador”, conforme a nomenclatura da época, seu próprio empresário, pioneiro na montagem de peças de Shakespeare no Brasil, criador benemérito de uma escola de teatro, e tantas outras coisas. Nos séculos XVIII e XIX, grandes atores assumiam foros de divindade, eram referidos como humanos de talento superior, de personalidade transcendental, e vetores da pena genial de poetas como Shakespeare e Racine. Naquele nascedouro da arte dramática em paragens tropicais, João Caetano era um semi-deus, tivesse ele, de fato, o talento que lhe creditavam, ou não. Por sinal, morreu pobre e pouco antes a Câmara Municipal do Rio retirou a subvenção ao São Pedro, teatro onde trabalhava sua companhia. Mas enquanto esteve no palco, reinou soberano, sem rivais.

Furtado Coelho
É bem verdade que em meados da década anterior surgira no cenário teatral o polivalente Furtado Coelho. Tal qual Caetano, Furtado era excelente ator, um estudioso do assunto, empresariava sua companhia e deve-se a ele a transição do período “romântico” do nosso teatro, simbolizado por João Caetano, para o “realismo”, que ele difundiria a partir de então.

Além disso Furtado era dramaturgo, compositor e sua companhia foi um celeiro de talentos onde, entre outros, iniciou sua carreira a maior atriz brasileira do século XIX, a baiana Ismênia dos Santos, e onde se popularizou sua contemporânea e sucessora, a maranhense Apolônia Pinto. Os primeiros anos da carreira de Furtado coincidiram com a decadência de João Caetano e o fim da década de 60 o encontra como o principal nome masculino de nosso teatro.

Só que ele tinha uma desvantagem irremediável numa eventual comparação com Caetano: era português. Nascido em Lisboa, em 28 de dezembro de 1831, Luiz Cândido Cordeiro Pinheiro Furtado Coelho viera de Portugal justamente para fazer teatro, o que não podia em seu país por conta de parentes famosos, para os quais a lide teatral era um constrangimento. No Brasil seu talento foi rapidamente reconhecido, mas ele não alcançaria jamais o status mitológico de João Caetano, fosse tão bom quanto ou quiçá até melhor do que o brasileiro.

A classe artística ficou anos enlutada pelo desaparecimento do notável pioneiro de Itaboraí. Em maio de 1869 isso começou a mudar. O empresário italiano Luigi Cesare Magi anunciou na imprensa do Rio de Janeiro — capital do Império — que a celebérrima atriz italiana Adelaide Ristori preparava-se para uma temporada de dois meses no Teatro Lyrico Fluminense.

Anúncio da temporada de Ristori, maio de 1869

Ristori na "Medéia", de Legouvé, 1858,
 foto de Andre Disderi
Ristori chegou ao Rio em 19 de junho de 1869. Pelos dois meses — julho e agosto — que durou sua turnê brasileira, ela apresentou um eclético repertório e maravilhou público e crítica. O Lyrico Fluminense ficou abarrotado em todas as suas performances e os articulistas encarregados do comentário teatral nos diários do Rio despejaram uma verdadeira pletora dos mais hiperbólicos elogios sobre a italiana. Sua simples presença no nosso modesto império foi uma injeção de ânimo no teatro nacional, que passava por fase relativamente anódina. Ela foi a Medéia de Ernest Legouvé, a Francesca de Rimini de Silvio Pellico, a Mirandolina da Locandiera de Goldoni, a Pia de Tolomei de Carlo Marengo e várias outras. Triunfo após triunfo. Para melhorar, Pedro II, notório amante das Belas Artes, bateu ponto no Lyrico por quase toda a temporada, ofereceu uma recepção à Ristori no Palácio Imperial, em São Cristóvão — atitude que provocou reações negativas por parte de alguns carolas embolorados que não concebiam o Imperador dando festa para uma atriz — além de tornar-se pen pal de Ristori até três meses antes de morrer, em 1891.

Charge do mestre Ângelo Agostini sobre a chuva de palmas e ovações
na temporada de Ristori (A Vida Fluminense, 3/7/1869)

Pinheiro Chagas
Nesse ínterim, Furtado Coelho decidiu sair do Theatro Gymnasio — cuja direção passou para o ator cômico português José Antônio do Valle — e construiu seu próprio teatro, o luxuoso São Luiz. A momentosa inauguração da nova sala ocorreu no dia 1º de janeiro de 1870, com direito à presença de toda a família imperial. A peça escolhida foi o drama em cinco atos A Morgadinha de Val-Flor, do português Manoel Pinheiro Chagas (1842/1895), amigo de Furtado. O texto estreara em Portugal em abril do ano anterior com grande sucesso, trazendo como protagonista a famosa atriz Emília Adelaide. No São Luiz, a morgadinha (herdeira, rica) Leonor foi interpretada com igual êxito por Ismênia dos Santos, que ia aos poucos galgando o posto de atriz mais importante do teatro brasileiro. No segundo papel feminino, a jovem Apolônia Pinto, aos dezesseis anos, recém chegada do Maranhão. A título de curiosidade, eis o que diz, profético, um crítico, sobre a adolescente: “Talento simpático, moça interessante, diabinho, a quem o estudo abrirá um brilhante futuro, e a quem os dotes naturais dão desde já lugar distinto na difícil arte dramática”. (Sl, 23/1/1870)

Ismênia dos Santos
Meses depois, em meio à casa cheia, críticas positivas e os melhores augúrios, Furtado e Ismênia se desentenderam.
Embora uma pessoa agradável, Furtado era temperamental e já tivera um rompimento estrepitoso com o cômico Francisco Corrêa Vasques (1839/1892) por questões financeiras, em 1867. Não consegui apurar o motivo da briga com Ismênia, mas em se tratando de duas estrelas, uma consagrada e a outra em franca ascensão, imagina-se que tenha sido ego, dinheiro, orgulho ferido, ou alguma combinação dos três. 

Como tanto o teatro quanto a companhia pertenciam a Furtado, Ismênia não teve outra alternativa senão arrumar suas coisas e ir embora. Passou quase um ano parada e se transferiu para a companhia de Jacintho Heller na Phenix Dramática. Furtado não se amofinou. Inteligente, bem relacionado e com atilado tino comercial, pegou o primeiro navio e foi para Portugal procurar uma atriz que pudesse substituir Ismênia à altura.

Em meados de 1870 surgiu na imprensa carioca uma notícia que provocou frêmito aos amantes das artes cênicas, tanto aos que desejavam ver ao vivo sua quintessência quanto aos que já o haviam feito na platéia de Ristori: “Consta-nos que brevemente chegará a esta corte o célebre trágico Rossi” (DN20/8/70).

Diário de Notícias, 20/8/1870

Rossi? “O maior trágico do mundo”? “O artista semi-deus, aquele que por toda a parte por onde tem passado tem deixado um rasto de glórias e de luzes”? “O aluno querido de Melpôneme e Thalia, que uniram-se em um celestial amplexo para lhe imprimirem na fonte um beijo de imenso afeto, e para lhe entrançarem a esplêndida coroa de verdadeiro filho da arte”? Seria possível? Rossi, que nasceu em Livorno, em 27 de março de 1827. Aquele a quem seu pai, veterano do exército de Napoleão, destinava para o mundo das ciências jurídicas, mas que abandonou a universidade de Pisa para entrar na companhia de Gian Paolo Calloud, Letizia Fusarini e Cesare Marchi. Lá conheceu seu grande mentor, Gustavo Modena. Interpretou coadjuvantes e recebeu ovações dos públicos de Gênova e Turim. Esse Rossi. Aquele que vinte anos antes entrara para a “Compagnia Reale Sarda” ao lado de Adelaide Ristori.

Gustavo Modena
Nessa companhia teve algum tipo de epifania, contou um cronista italiano da época, transcrito no Diário do Rio de Janeiro de 12 de abril de 1871 em texto divertido e fantasioso: “Foi então que, levantando a cabeça para o céu, pediu o imenso, porque só o imenso podia satisfazer a sua alma de fogo: estudou, estudou, estudou com delírio; via nas trevas das suas noites um grupo de soberbas estátuas, às quais só faltava o gênio de um homem para dar-lhes a vida: o pálido Hamleto, o selvagem Othello, o brioso Cid, o apaixonado Paulo e o lânguido Sardanapalo esvoaçavam-lhe na mente entusiástica, e ele estudava os semblantes, animava os olhares, suplicava, estorcia-se, lutava, chorava... e afinal surgiu o artista!” A partir de então formou sua companhia e ganhou o mundo. Esse, o Rossi que se preparava para nos visitar. Certo, Ristori viera pouco antes, mas era mulher. Num mundo inteiramente patriarcal, por mais afamada que fosse Ristori, equivalia a receber uma célebre primeira dama, ou uma duquesa, mesmo que Rossi tivesse sido seu aprendiz. Já no caso dele, era a visita do nº1, o primus inter pares, o grande rei, o maior de todos.

Assim começou o ano de 1871: o Teatro Lyrico prometia Rossi para o fim de abril; Furtado Coelho voltou de Portugal e anunciou a vinda de ninguém menos do que a própria Emília Adelaide para ser a titular feminina do São Luiz por uma temporada; a horrenda Guerra do Paraguai estava terminada, os debates que culminariam com a aprovação da Lei do Ventre Livre andavam avançados e tudo parecia bem.

Emília Adelaide

Em fevereiro a alegria acabou. No dia 7, durante uma viagem à Áustria, morreu a princesa Leopoldina, com apenas 23 anos, vítima da febre tifóide. O imperador teve quatro filhos; Afonso e Pedro morreram ainda crianças. Com a morte prematura da doce Leopoldina, segunda na linha de sucessão ao trono, a princesa Isabel se tornou a única herdeira. Pedro II e a imperatriz Tereza Cristina ficaram de luto pela filha, passaram a maior parte daquele ano viajando e se ausentaram de toda a temporada artística.

Luiz Guimarães Junior
O Brasil sentiu a dor de Pedro II, mas não permitiu que a perda irreparável do imperador toldasse a excitação geral pela breve chegada do grande Ernesto Rossi. Na imprensa, um dos mais entusiasmados era Luiz Guimarães Junior. Romancista, jornalista e amigo de Machado de Assis, ele acabava de se formar advogado pela Faculdade de Direito do Recife, e por conta das provas finais perdera a temporada de Ristori no Rio. Frustrado, pretendia acompanhar de perto a visita de Rossi. Seus artigos no Diário do Rio de Janeiro são um retrato da empolgação dos aficionados por teatro e pela arte em geral: “Hei de ouvir, ver e assombrar-me a gosto perante o robusto intérprete de Shakespeare e Dumas! Renascerão, oh! renascerão as horas dos vivos entusiasmos, dos nobres delírios que a palavra do gênio evoca! Iremos todos de olho aceso e ouvidos sequiosos esquecer misérias sociais debaixo da proteção do talento que cria e enobrece! Assim é que bom matar o tempo, antes que o tempo nos mate a nós e ao Rossi também!” (5/2/71)

Talma, por Louis Boilly
A partir de fevereiro os leitores de jornais e revistas — única mídia da época — passaram a ser bombardeados com notícias sobre a chegada de Rossi. E para cada dez artigos sobre o italiano, havia um ou dois, com igual alegria, comentando a vinda de Emília Adelaide. Era um verdadeiro banho de incenso:

Esse amável Titão, esse adorável Sansão vem ver-nos de hoje a pouco tempo. (...) O repertório de Ernesto Rossi é esplêndido. Shakespeare, Dumas, Soumet, Delavigne, Byron, Hugo, são as escadas vivas, palpitantes de gênio e ilustração, por onde o trágico italiano tem subido pouco a pouco à imortalidade. (...) Do banho lustral que o gênio com a mão providencial faz jorrar sobre o povo, é que a inteligência e o coração saem puros como o amianto das labaredas purificadoras. Isto não é mais do que um meio de mostrar ao público a alegria de que me sinto possuído pela vinda de Rossi. Peço ao céu forças para aplaudi-lo de todas as formas, quando o monstruoso artista pisar o palco brasileiro. (ML, 18/2/71)

LeKain
“Rossi é o Talma italiano” — referência ao célebre ator francês François-Joseph Talma (1763/1826) — era frase recorrente na imprensa. Embora ninguém tivesse visto nenhum deles, as comparações corriam soltas, então aqui e ali veríamos comentários como “discípulo de Modena”, “continuador de LeKain” (Henri-Louis Caïn, 1729/1778), “vencedor de Frédérick Lemaître” (1800/1876), e assim por diante. Outra constante nos artigos de boas-vindas a Rossi é uma satisfação particular da intelectualidade por saber que a temporada do italiano significava o primeiro contato do público com a dramaturgia universal, tal qual ela deve ser conhecida. Ou seja, excetuando textos comerciais contemporâneos e as peças apresentadas por Ristori — em cujo repertório, aliás, constava o Macbeth, que não foi encenada — o Brasil só conhecia um risível pastiche das dramaturgias inglesa, francesa e alemã, que eram as adaptações franco-portuguesas levadas por João Caetano.

Frédérick Lemaître
Logo, havia respeito pelo saudoso artista e pelo seu esforço em tornar palatáveis ao grande público obras de difícil compreensão, que requeriam um mínimo de cultura. Por outro lado, havia também a sensação de que aquilo, efetivamente, não era Shakespeare, ou não era Goethe, ou não era Schiller, e etc. Com Rossi, essa espera terminaria:

Que ventura! A mocidade estremecerá de vida e de loucura perante o portento do palco italiano! Compreenderemos Hugo, Dante e Shakespeare! Como essas fabulosas deusas que nos rezam as lendas, Rossi com um gesto, um olhar, uma palavra abrirá a nossas vistas deslumbradas o palácio imenso da arte, onde as palavras e os pensamentos dos gênios sairão em torrentes de fogo e de diamantes! (...) A Ristori foi a deusa a cujos pés caiu em peso a platéia fluminense. Pois bem! Júpiter vem substituir Minerva, com a multidão dos raios soberanos prontos a fugir-lhe dos olhos e da alma divinizada! (DRJ, 19/2/71)

Eduardo Brazão
Oh!, poetas! Oh!, filósofos! Oh!, criaturas privilegiadas, em cujo peito um destino sublime depositou o fogo das vestais do pensamento! Chegou o dia da revelação! Compreendereis o velho Shakespeare! Compreendereis Dumas! Compreendereis os mistérios, que o gênio espalha e que a arte soleniza! (ML, 18/3/71)

Ah!, afinal vamos entender Dante! A voz do artista dileto das grandes musas conduzir-nos-á, através das sombras e dos gemidos, não só aos mistérios do poema divino, como ao âmago do coração donde surgiu a Divina Comédia! (DRJ, 7/5/71)

Na segunda quinzena de março Emília Adelaide chegou ao Brasil. Sua estréia no São Luiz foi marcada para o dia 26, com — é claro — o sucesso certo de A Morgadinha de Val-Flor. Furtado provou mais uma vez seu talento raro para a escolha de elencos, considerando que pouco antes já trouxera para sua companhia outro português que em pouco tempo se tornaria exponencial: Eduardo Brazão.

Anúncio da estréia da temporada
de Emília Adelaide
Enquanto os portugueses se preparavam para uma bela temporada, o empresário Lourenço Perrini, responsável pela vinda de Rossi, apresentou companhia e repertório à imprensa. O trágico encabeçava o elenco tendo Celestina Paladini como primeira atriz e Giacomo Brizzi como segundo ator. Para as peças cômicas — costume da época: encenar uma farsa ou comédia de um ato logo após a tragédia ou drama apresentada pelo elenco principal — estava Leopoldo Vestri, que de vez em quando também tomava parte do elenco principal.

O resto do elenco era quase que completamente familiar, no sentido de que atores e atrizes eram irmãos ou casados. Atrizes: Antonietta Zammarini, A. Cottin (seu primeiro nome não consta em lugar algum, sendo ela sempre referida como “Sra. A. Cottin” por ser esposa do ator Achilles Cottin), Modesta Sartoris, Erminia Belli-Blanes, Emma Della Setta, Adelaide Perucchetti, Carolina Melzi, Pia Beffa, Eugenia Rossi, Julieta Serafini e Isabel Cavara. Atores: Raphael Rigatti, Ercole Cavara, Ludovico Mancini (que viera dois anos antes com Ristori e voltava agora com Rossi), Achilles Cottin, Henrique Rossi, Flavio Andó, Virginio Vezzosi, Carlo Perucchetti, Eugenio Casilini, Luiz Mazzoni, Hector Panizzoni, Paolo Belli-Blanes, Eduardo Della Seta, Cesar Canepa, Carlo Monari, Raphael Beffa, J.B. Pisani, Carlo Melzi e Arnaldo Cottin.

Anúncio da temporada de Rossi, 20/3/1871

O repertório era em si um espetáculo. Tinha quase três vezes o número de peças da companhia de Ristori e trazia o supra-sumo da dramaturgia universal. Só de Shakespeare havia cinco tragédias: Hamlet, Coriolano, Romeu e Julieta (ou Julieta e Romeu, como a chamou seu tradutor), Macbeth e Othello e um drama, O Mercador de Veneza. Quatro tragédias de Alfieri, duas de Schiller, quatro dramas de Alexandre Dumas, textos de Dante, Byron, Corneille, Goethe, Victor Hugo, comédias de Goldoni, Molière e dezenas de outras peças.

Anúncio da temporada de Rossi, 11/4/1871

Júlio César Machado
Rossi naquele momento concluía uma temporada gloriosa em Portugal. Os jornais do Rio transcreviam artigos sobre os triunfos do ator, e um desses comentários era do escritor português Júlio César Machado (1835/1890), que deixou consignadas suas impressões da primeira noite de Rossi interpretando Othello em Lisboa:

Desde as primeiras cenas do Othello houve verdadeiro interesse que foi aumentando até se converter em delírio do terceiro ato em diante. Com que intensidade de estudo, com que variedade de tons Rossi representou o seu papel! Com uma palavra, com um acionado, com um movimento de fisionomia, com um silêncio, faz-nos o calafrio, o tremor de comoção que indica a passagem do sublime. Nunca o nosso público ouviu linguagem tão clara, nem viu ator que abrisse mais de par em par a janela que deita para a alma! (DRJ, 19/2/71)

No fim de março Rossi foi se despedir do rei de Portugal, D. Luiz. O monarca escreveu uma carta de próprio punho a Pedro II, recomendando-o ao trágico, e deu-a a Rossi. Ele embarcou em um paquete (navio de luxo a vapor) da Pacific Steam Navigation Company em 30 de março e esperava-se que a viagem de navio durasse cerca de vinte dias. Nesse período a imprensa não fez outra coisa a não ser preparar o público fluminense para sua chegada.

A estréia de Balbina Montani — mãe de Abigail
Maia e avó de Lucília Peres 
— na companhia
do ator Germano, no S. Pedro de Alcântara
Não se pode dizer que o teatro brasileiro tivesse uma identidade, naquele momento, seja em termos de atores ou de autores. Não obstante, a cena teatral era bastante rica no Rio de Janeiro. Salinhas de espetáculo, grêmios recreativos e locais menores onde encenações eram realizadas existiam por toda parte. Teatros, efetivamente, com platéia e camarotes, havia sete, com intensa atividade o ano todo. O mais antigo deles era o S. Pedro de Alcântara, inaugurado em 1813 com o nome de Real Theatro de São João. Incendiou-se uma vez em 1824 e duas vezes durante a década de 50, enquanto esteve sob a direção de João Caetano. Em 1871 estava ocupado pela companhia do ator Germano Francisco de Oliveira (1820/1885). Famoso, e por um tempo conhecido como rival de João Caetano, Germano era o único brasileiro a dirigir uma companhia no Rio, à época; também sabia cultivar talentos e tinha uma companhia invejável, misturando novatos e veteranos notáveis como o ator Galvão, a jovem Apolônia Pinto (solapada à companhia de Furtado Coelho), o açoriano de 26 anos João Augusto Soares Brandão, mais tarde conhecido pela alcunha de “o Popularíssimo”, e Augusto Montani, entre outros. A esposa deste último, a futuramente célebre como “atriz caricata” Balbina Montani, fez sua estréia no teatro junto ao marido, precisamente em abril de 1871¹.

O programa eclético do Gymnasio, anunciando "A Esfolhada", de Antônio Pinto Corrêa Junior,
"Uma Fábrica de Casamentos", de Joaquim José Annaya e "Já ouvi espirrar este nariz",
de Manoel José d'Araújo

José Antônio do Valle, o "ator Valle"
O Gymnasio, fundado em 1832 com o nome de Theatro São Francisco de Paula, também hospedara a companhia de João Caetano na década de 40. Segundo a crônica, é o “berço do teatro nacional, a nascente da literatura dramática brasileira, apresentando os primeiros dramas da escola realista e, também, a primeira sátira (musicada) de um autor brasileiro”. Como já se viu, com a saída de Furtado Coelho da direção, ficou em seu lugar o ator Valle.

O Lyrico Fluminense, que recebera Ristori e preparava-se para receber Rossi, estava longe de ser um teatro à altura de figuras tão renomadas. Por se tratar de construção que deveria ser temporária, até a edificação de um grande teatro que representasse condignamente a capital do Império, ele foi fundado em 1852 com o nome de “Theatro Provisório”. Passou a ter sua atual denominação dois anos depois, e não obstante a estrutura deficiente e inúmeras reformas, abrigara ao longo dos anos temporadas de alguns dos maiores cantores líricos, atores dramáticos e concertistas do mundo. Pertencia ao governo e estava arrendado a Lourenço Perrini, empresário de Rossi.

Outro “Lírico” cujo lirismo não transcendia o nome era o Alcazar Lírico, também conhecido em diferentes momentos por “Theatre Lyrique Française”. Foi inaugurado em 1859 por um francês radicado no Brasil, Joseph Arnaud, e tinha por objetivo reproduzir, em plenas paragens tropicais, o ambiente, a atmosfera e a linha de shows dos cabarés franceses, muito em voga na ocasião.

"La Princesse de Trebizonde", uma
das muitas operetas de Offenbach
encenadas pelo Alcazar
Arnaud alcançou seu objetivo. Pegando carona nas popularíssimas operetas de Jacques Offenbach (1819/1890), nos anos seguintes o francês trouxe para o Rio, com grande sucesso de público, os mais variados espetáculos de can-can e performances de canto e dança onde se destacavam as roliças e sensualíssimas atrizes, cantoras e dançarinas francesas que provocavam terror às esposas e toda sorte de beatos e moralistas.

Para o romancista e dramaturgo Joaquim Manoel de Macedo, o local era onde “os velhos babosos, os maridos bilontras e a rapaziada bordelenga se davam rendez-vous todas as noites, para rentear as atrizes brejeiras e as cupletistas gaiatas que degelavam os mais idosos e rescaldavam os mais moços”. Em 1938 Procópio Ferreira fez análise bem mais equilibrada: “O Alcazar pertence à tradição boêmia galante do século passado (XIX). Era o ponto de reunião dos velhos elegantes e da mocidade curiosa, sendo por isso considerado pela família brasileira um antro de perdição” (Ferreira, 1979).

A Phenix emcena "Theresa, ou A Órfã de Genebra",
de Victor Ducange
A Phenix Dramática surgiu em 1863 com o nome de Theatro Eldorado, “nos jardins do Hotel Brisson”. Tinha aproximadamente 900 lugares e se dedicou inicialmente a um repertório francês, por inspiração de seu fundador, o empresário Chéri Labocaire.

Em 1868 ele já se chamava Phenix e estava sob a direção de Vasques, que lá permaneceu por dois anos, até Heller assumir seu lugar. Ele era um bom empresário e a Phenix vivia um momento interessante, contando com ótimos atores como os próprios Heller e Vasques, Ismênia dos Santos e o hoje esquecido ator Arêas. Além desses havia o São Luiz, de Furtado Coelho, e no mês de junho seria inaugurado com uma companhia italiana de ópera o Theatro Pedro II, construído no mesmo local onde até meses antes ainda funcionava o Circo Olympico, fundado em 1857.

A festa artística da Phenix dedicada a Vasques: primeira representação de "O Tipo Brasileiro", de França Junior, "Silêncio Calado", "tagarelice" em um ato de Eduardo Garrido, "O Fechamento das Portas" de Augusto de Castro com música de Offenbach, e a mazurca "Emília",
em homenagem à atriz

Em sentido horário: Dante, Petrarca, Raphael,
Beccaria, Filangieri e Michelângelo
Para enaltecer o trágico, resenhavam-se séculos de cultura e sabedoria italianas. Para os jornalistas, Rossi era “filho dessa terra abençoada de poetas e gênios, onde Miguel Ângelo no mármore e Raphael em preciosas telas deixaram monumentos mais perduráveis que o bronze, onde Dante escreveu a Divina Comédia, Petrarca a bíblia do amor, onde (Gaetano) Filangieri, (Cesare) Beccaria e o grande (Pellegrino) Rossi da ciência traçaram o campo da jurisprudência criminal, onde (Vincenzo) Bellini roubou ao céu a partitura da Norma e (Gaetano) Donizetti sonhou a Favorita”. (JT, 9/5/71)

O Brasil era (e ainda é) uma nação na infância de sua intelectualidade e de seus valores artísticos. A Europa significava o berço da inteligência mundial e a fonte onde todos hauriam seu conhecimento. Logo, o fato de Rossi ter sido aclamado unanimemente não apenas em seu país, mas em nações como a Espanha, Portugal e sobretudo a França, representava o galardão de sua carreira e uma chancela dourada para sua visita:

Ernesto Rossi é o mais robusto gênio dramático do teatro contemporâneo. A França, que é o país onde se sanciona a inteligência de todos os outros países, recebeu-o como se propunham os antigos a receber o celebrado Messias. A literatura francesa veio receber o santo e a senha da boca inspirada do trágico italiano. A imprensa dirigida por Théophile Gautier, (Sylvestre de) Sacy, (Jacques) Texier, Albonie Second (não consegui apurar de quem se trata) e as brilhantes falanges da crítica universal bradaram a uma só voz, coroando o atleta do teatro. (DRJ, 19/2/71)

O grande Théophile Gautier, que morreria no ano seguinte à temporada de Rossi no Rio

Onde cabe a imprensa francesa tem que caber toda a imprensa européia:

A mais original e insaciável expectativa assombra-se em face do seu gênio.  (...) As opiniões de Théodore Anne, Etienne Arago, Théophile Gautier, Jules Janin, Xavier Aubryet, Paul Foucher, Hippolyte Lucas, Paul Ferry, Henri de Pène, Louis Ulbach, em Paris; de Júlio César Machado, Ramalho Ortigão, Latino Coelho, Pinheiro Chagas, (José da Silva) Mendes Leal e (Ernesto) Biester, em Portugal; de Javier de Bona, Ramon Ginesta, Miguel Badia, na Espanha, não divergem; cada qual exalta mais o triunfante artista italiano, de cujos lábios iluminados pela mais rara e santa inspiração destilam-se as palavras e os sublimes pensamentos dos grandes mestres e incutem-se como uma revelação divina no âmago do coração do povo. (DRJ, 12/4/71)

Rossi
Análises como essa, ou comentários como este, referente a Rossi — “Por nossa alma, ávida de encantos e de luz, passará o sopro encantado do grande artista como a palavra da Escritura, fazendo rebentar da terra flores e crenças, entusiasmos e glórias indescritíveis!...” (DRJ, 19/3/71) — ou este — “Surgem, de séculos a séculos, para nobreza e honra da humanidade, certos espíritos extraordinários, corações raros e inteligências sobre-humanas, que vêm revelar na Terra de modo indiscutível o poder divino. São como que encarnações do verbo celeste, dir-se-ia que o Criador procura esse meio para de novo patentear-se em maior esplendor à criatura absorta. (...) Da França partiu Rossi para várias partes da Europa. Sempre o mesmo séquito, o mesmo delírio, as mesmas palmas, o mesmo assombro irresistível!” (DRJ, 12/4/71) — não eram do agrado de todos. Havia quem se opusesse a esse evidente exagero na adjetivação dos artistas estrangeiros. É curiosa, divertida e inusitadamente acertada a reclamação do articulista de A Comédia Social:

Adelina Patti
Pois não andam dizendo e escrevendo que o ator Rossi é o “primeiro trágico do mundo”? Pois já não disseram que Emília Adelaide é um ser sobrenatural, divino, aéreo e até ultragasoso? E quem? Aqueles próprios que só crêem na religião da carne, e que confundem de contínuo o mérito artístico com os dotes comuns a toda a mulher bela. E não digam que menosprezamos o grande talento de Emília Adelaide, não; o que não queremos são exagerações prejudiciais ao progresso da crítica. Quando aqui chegou a irmã de Carlotta Patti (a soprano Adelina Patti), foi recebida com tanto estrondo que houve quem acreditasse ter ouvido a primeira cantora do universo. Até a alfândega ficou aberta num domingo, para receber e revistar-lhe a bagagem. Dias depois o público tinha antipatizado com ela, porque reconhecera que a célebre Patti era a irmã. Quanto a Rossi, digamo-lo, é um artista de excelente escola e de bom método; mas que sua reputação seja universal, não; apenas assombra a quem não viu melhor. (6/4/71)

Melhor do que isso foi o esplêndido quiproquó de sua quase chegada, porque alguém anunciou que Rossi estava no paquete “Amazone” e aportaria em águas fluminenses no dia 14 de abril. Duas sociedades de beneficência italiana se uniram, convidaram jornalistas e amigos, contrataram uma banda de música e alugaram uma balsa para levar todos à bordo, afim de receber o ator com grande festa. Quando chegaram ao navio, não havia nem sinal de Rossi. Encontraram, porém, quarenta veteranos italianos e franceses da guerra franco-prussiana, que estava em sua reta final. (DN, 15/4/71) Guimarães Junior preferiu rir do engano: “Se Rossi abicasse às nossas praias no dia marcado pelo anúncio, perderia para mim um dos lados mais característicos do gênio: o imprevisto! (...) Mas... Rossi não veio! Rossi não quis vir ainda! O suplício de Tântalo na mitologia é quase isso! O homem perto da água sem a poder beber; o fruto junto à mão e fugindo sempre quando se o quer pegar!” (DRJ, 16/4/71)

Publicidade da Pacific Steam Navigation Company
cuja frota incluía o Galatéa. Aliás, é uma suprema
ironia que o porto de Pernambuco estivesse —
segundo o anúncio — "infectado" (com a febre
amarela, problema crônico da época), porque foi
justamente lá que o comandante teve que parar,
quando o navio apresentou um defeito,
 em seu trajeto ao Rio
Rossi na verdade vinha no paquete “Galatéa”, que deixara Lisboa no dia 1º de abril. Mas quando o navio já se encontrava em águas brasileiras apresentou um defeito na hélice do motor a vapor e o comandante achou por bem aportar em Recife e ficar lá por alguns dias, enquanto se procedia o conserto necessário. Quando a notícia de que Rossi estava a bordo se espalhou, as autoridades pernambucanas imediatamente foram receber o trágico, fornecendo a ele e à sua companhia hospedagem condigna. Maravilhados com a presença ilustríssima, inesperada e inteiramente acidental do maior trágico do mundo, sondaram-no sobre a possibilidade dele se apresentar naquela capital, sob os auspícios do governo da província. Como disse mais tarde um cronista local, o defeito “proporcionou-nos ocasião que ninguém sabe se, nem quando, teríamos de prestar homenagem ao rival de Talma” (DRJ, 13/5/71). Houve consenso e ficou marcada para o dia 26 uma apresentação única do Cid, de Corneille, com a tradução de Giuseppe Greatti, e de uma comédia de um ato com Leopoldo Vestri, no Teatro da Zarzuela Espanhola. Tudo precedido por “uma brilhante ouvertura” executada pela orquestra do Maestro Francisco Libânio Colás (1830/1885).

Propaganda da apresentação de Rossi em Pernambuco (Jornal do Recife, 26/4/1871)

Curiosamente, era tal a dificuldade de comunicação entre as províncias de um país tão imenso, que no dia 26 de abril, enquanto os jornais pernambucanos anunciavam com inaudita satisfação o espetáculo que ocorreria naquela noite, eis o que dizia nota pra lá de mórbida do Diário de Notícias fluminense: “Está dando cuidado o vapor Galatéa, que conduz o trágico Rossi, e a sua companhia, e que saiu de Lisboa no primeiro do corrente. A não ter arribado esse vapor, grande desgraça lhe aconteceu”.

Diogo Cavalcanti de Albuquerque
O dia 26 de abril de 1871 marca a estréia de Ernesto Rossi no Brasil e na América do Sul. Contando com a presença do presidente da província, Diogo Velho Cavalcanti de Albuquerque, no teatro, o trágico deslumbrou a ávida platéia pernambucana com a tragédia do “Cid Campeador”. Houve inúmeras cortinas no fim de sua apresentação e novamente no fim da comédia protagonizada por Vestri. Quando a companhia se reuniu para a ovação final houve uma chuva de “lindos ramalhetes de flores naturais”. O baiano Plínio de Lima, contemporâneo de Castro Alves e Ruy Barbosa no Largo São Francisco, e, aos 25 anos, um poeta estimado e promissor (que a morte infelizmente levaria dois anos depois, sem que ele tivesse lançado sequer um livro), improvisou uma saudação a Rossi, que foi muito aplaudida e que o trágico “agradeceu por gestos significativos” (JR, 28/4/71):

A ROSSI
Improviso

Esta fronte curvada sobre os louros
Que nos deslumbra de celeste luz,
É o trono do Belo, o sol das almas,
Com que teu nome às multidões se luz.

O êxtase, o delírio, o pranto, a glória,
Tudo teu gênio sobre nós lançou.
Tu és a arte’splêndida e divina
— Último arrojo que o ideal sonhou.

És a estátua animada da tragédia,
O gênio da paixão... da dor talvez.
Tu tens a alma transbordando glórias,
Tu tens dois mundos te beijando os pés.

A imprensa registrou entusiasticamente o que significou ter Rossi na modesta e tranqüila Pernambuco²:

Plínio de Lima
A noite de 26 de abril marca de agora em diante uma data gloriosa para o nosso teatro. Sobre o palco pernambucano apareceu entre calorosos aplausos Ernesto Rossi, o notável trágico, a celebridade artística, que o mundo inteiro reconhece e proclama. Por mais prevenidos que estivessem todos, foi a expectativa pública excedida muito além do que esperava, conhecendo pela primeira vez o verdadeiro valor da arte sublime e transcendental que imortalizou Talma, Modena e Kean. Não cabe nos acanhados limites de uma notícia, uma apreciação circunstanciada do espetáculo de ante-ontem no pavilhão de Santa Isabel, e por isto o resumiremos em mais uma vitória para o ilustre trágico na justa e entusiástica apreciação de um público desconhecido, o primeiro que o saudou na América do Sul, com toda a espontaneidade que desperta n’alma o verdadeiro merecimento. (JR, 28/4/71)

Celestina Paladini e Leopoldo Vestri também foram muito elogiados: “Em primeiro lugar falaremos da Sra. Paladini, cujo mérito é incontestavelmente superior, cujo trabalho é sempre magistralmente executado. É uma atriz de primeira força que desempenha exímia e perfeitamente o seu papel, dando-lhe a vida que só o gênio sabe lhe comunicar. A Sra. Paladini não desmerece o grande ator. Em seu gênero é o Sr. Vestri igualmente um ator consumado; e só quem o não tiver visto nas espirituosas comédias em que figurou poderá dar a outrem as palmas que incontestavelmente merece”. (O Americano, 30/4/71)

Celestina de Paladini, em
fotografia de 1869
O cronista do Diário de Pernambuco foi bem mais verboso: “O desempenho correu sublime de esplendor, e nem era lícito esperar menos de artistas em quem se refletem os raios luminosos de um mestre que com razão enche de pasmo, extasia e comove até as lágrimas, todos quantos têm a ventura de o ouvir e o ver no palco”. A frase seguinte, além de hiperbólica, foi de um inegável mau gosto e provocou revolta nos círculos intelectuais do Rio, quando a publicação lá chegou, finalmente, dez dias depois:

O Sr. Rossi, o imortal triunfo do gênio da tragédia, é grande como um colosso. João Caetano, o artista trágico brasileiro por excelência, era grande; mas junto de Rossi seria um pigmeu, tal é o talento, tal é o conjunto harmonioso de dotes com que a natureza e o estudo, em fraternal amplexo, mimosearam-no, engrandeceram-no, sublimaram-no para o palco, criando-o o assombro das almas, que o admiram, e que se prendem à sua por esse fio elétrico misterioso que se chama sentimento, e que só é movido pelo belo e grande artístico, pelo gênio, que é uma emanação de Deus. (DP, 28/4/71 apud JT, 5/5/71)


O texto segue, longo, com uma análise até interessante da peça, mas a comparação desastrada e inteiramente desnecessária com João Caetano foi só no que todo mundo reparou, e suscitou respostas imediatas na capital do Império. Assim, Rossi não havia sequer estreado ainda no Lyrico e já havia uma polêmica paralela à sua chegada acontecendo em alguns órgãos da imprensa:

João Caetano
Diz o Diário de Pernambuco: João Caetano era grande, mas comparado a Rossi, é apenas um pigmeu. Ficam consignadas estas palavras, menos para a aferição do gênio do artista que entre nós se acha, que para a vergonha daqueles que, para saudarem as glórias de hoje, não duvidam desdourar as de ontem, e se não lembram que, na profanação de um túmulo, vai a profanação da pátria. É inepto estabelecer-se paralelo entre o artista inculto, filho unicamente do seu gênio e da natureza, e o artista educado pela teoria das escolas e a prática dos bons exemplos, com todos os recursos da arte e abundâncias da inteligência. Rossi vale muito, vale, por certo, muito mais do que pode imaginar o espírito pequeno do redator do Diário de Pernambuco, e, para que sua estrela possa fulgir, não necessita que apaguemos o brilho da única estrela dramática, que cintila no céu das nossas glórias. (O Guarany, 6/5/71)

O dramaturgo e jornalista França Junior (1838/1890), que escrevia para o Jornal da Tarde, pegou uma carona lírica nessa dicotomia:

França Junior
Digam, embora, pretendidos críticos, que o nosso Talma seria um “pigmeu” ao lado do eminente italiano, eu sustentarei que entre os dois não há essa grande distância que querem enxergar. Nasce uma pobre flor entre duas pedras. O santo orvalho do céu não umedece-lhe as pétalas, o sol desvia da mísera os raios benéficos, a natureza não lhe sorri em torno, benfazeja mão jamais cultivou o terreno onde ela brotou. E no entretanto a desditosa viceja, seu tronco reverdece, suas folha acetinadas procuram atrair os beijos das brisas e sua corola busca as pérolas do céu e os raios do sol! João Caetano foi a flor sem cultura, e que no entanto inebriava os sentidos com ignotos perfumes. Ele cantava, como gorjeia o passarinho da selva sem jamais ter cursado as aulas do conservatório. Rossi é a linda flor dos jardins, cultivada com esmero pela mão da arte e da civilização. Ligados pelo mesmo gênio, um arrebata as platéias com consciência plena do que faz, o outro levantava as massas, inspirado apenas pelo fogo sagrado que o animava. (9/5/71)

João Caetano, no papel de "Oscar, o filho de
Ossian", de Antoine Vicent Arnault (1766/1834)
Guimarães Junior coroou o consenso de que Caetano teria sido tão imenso quanto Rossi se tivesse as oportunidades de estudo do italiano, e se não tivesse morrido tão prematuramente:

Era, pois, certo que João Caetano possuía na peregrina alma a réstia celestial!! Era, pois, evidente que o método, o trabalho e o estudo fariam daquele nobre ator, tão cedo roubado aos louros e aos triunfos do palco, um dos verdadeiros representantes da arte no seu mais puro ideal. Ernesto Rossi é o diamante polido, lapidado, claro de mil facetas cintilantes, onde a luz reflete infinitesimamente e que ilumina tudo em que toca de passagem! Pois bem; é esse o fulgor que nos faz pressentir os raios admiráveis, que o engenho de João Caetano, pedra mal lapidada e quase abandonada à sua misteriosa germinação, faria derramar um dia, se a mão paternal do estudo e dos grandes mestres polissem-na, divinizassem-na, imortalizando-a para nós e para o mundo! (DRJ, 11/5/71)

Algo atrasado, apareceu na contenda o médico José Joaquim Vieira Souto, provavelmente irmão pouco célebre do engenheiro Luiz Raphael Vieira Souto (1849/1922), que dá nome à famosa avenida carioca. Tradutor de algumas peças e patrioteiro de maus bofes, sua defesa de João Caetano é tão histérica que ele acaba cometendo o mesmo erro do articulista pernambucano, só que favorecendo o lado do brasileiro. Começa dizendo que Rossi “é em extremo exagerado” e só merece encômios “na escola realista”, “mas daí a julgá-lo o non plus ultra da arte dramática, vai também muita diferença”. Termina tentando desmontar até mesmo o argumento de França Junior e dos outros que descreveram Caetano como uma espécie de “primo pobre” de Rossi:

Jacques Arago (1790/1855), escritor e artista
plástico. Autor de "L'Éclat de rire"  e amigo
pessoal de João Caetano, morreu na casa
deste, em 27 de novembro de 1855
Assoalham aqui os escritores que este artista-gênio não tinha instrução alguma, e os mais benévolos fazem-lhe o “favor” de compará-lo a uma pedra preciosa não lapidada. Eu, porém, (...) declaro-te solenemente que é uma calúnia, semelhante boato. Acresce que eu sei que João Caetano ia estudar na história dos povos e dos séculos e em tudo que o podia esclarecer, os tipos que tinha de apresentar em cena, tirando sempre grande vantagem da pintura e da escultura (...). Além disso procurava originais, consultava os livros e quando não obtinha a verdade, ou duvidava dela, ia perguntar a quem lhe pudesse satisfazer cabalmente. Assim, por exemplo, mandou vir da Europa os figurinos da roupa com que Talma se apresentava no Othello; foi à Praia Vermelha (Hospício Pedro II, o primeiro hospício brasileiro), onde estudava todos os doidos que reproduzia em cena, aprender a gargalhada do drama de Jacques Arago (“L'Éclat de rire”, 1840), e recorreu muitas vezes à inegável sabedoria de (Gonçalves de) Magalhães e (Manuel José de Araújo) Porto Alegre, que haviam já viajado muito. (O Guarany, 14/5/71)

Para o bem do teatro e da paciência dos leitores, o comentário infeliz do cronista pernambucano foi esquecido e o assunto na ordem do dia passou a ser a chegada de Rossi. Mas o fantasma de João Caetano — no melhor estilo de Shakespeare — seguiria presente nesse início de temporada, sobretudo quando se anunciou que a estréia oficial de Rossi seria com a peça Kean, de Alexandre Dumas, que o brasileiro levara, anos antes.

Propaganda da estréia de Rossi com a peça "Kean ou Désordre et génie", de Alexandre
Dumas. O anúncio traz o nome na tradução italiana, mas com um erro:

onde se vê "sgregolatazza", leia-se "sregolatezza"

O Galatéa aportaria no Rio sem contratempos na primeira semana de maio. A falta de costume em receber estrelas internacionais e as conseqüentes mancadas decorrentes disso já haviam causado a “recepção que não houve”, dias antes. O vilão da vez era Thomaz Rainey, o diretor da empresa de balsas. As mesmas sociedades de italianos que organizaram a primeira recepção estavam agora às voltas com a falta de uma balsa suficientemente confortável para trazer Rossi à terra firme. A balsa que o diretor oferecia não tinha sequer um toldo para proteger Rossi do calor de 40 graus que fritava os cariocas naquele outono escaldante. Na sexta feira, 5 de maio, foram todos buscar Rossi. Guimarães Junior estava entre eles e sua satisfação de conhecer Rossi de perto foi tanta que ele descreveu a caravana com delicioso bom humor:

Uma coisa estava eu na dúvida se poderia ser realizada um dia, e essa coisa era uma serenata ao sol, uma serenata tropical, uma serenata... para torrar gondoleiros e guitarras, pondo-os em condição de perfeitas roscas! Ir em uma barca excelentemente coberta e livre dos raios do dia abrasador, receber um ente privilegiado como Rossi, à semelhança da família dos burgueses em visita de compadres, isso seria vulgar, chato, sem préstimo, sem poesia, sem originalidade e... sem suor! (...) Os botes vieram receber-nos, a nós e à banda de música italiana, começando por despirem-se de toldos, o que foi de uma admirável penetração napolitana! Os músicos, rubros e de olho esgazeado, puseram-se a soprar nos instrumentos abrasados como o fará de verto a orquestra de Vulcano por ocasião da recepção oficial!

E os batéis, ligeiros como uma falange de tartarugas, cortaram a superfície das ondas encolerizadas. Dir-se-ia, a julgar pelo calor de baixo e pelo calor de cima, que nos prontificávamos graciosamente a realizar uma fritada popular, e que chegaríamos ao Galatéa mais como iguaria do que como gente. O deus, porém, que protege os admiradores da arte e do talento, conduziu-nos, mal assados apenas, aos braços do grande trágico, cuja individualidade conseguimos trazer à terra em uma das ambulantes frigideiras completamente são e... cru! Oh!, mas como foi belo, como foi irradiante o nosso passeio! A deliciosa banda italiana fazia reboar nos ares iluminados as fogosas harmonias dos seus instrumentos febris! Nas vergas dos navios que abeirávamos dependuravam-se os marinheiros corados e alegres, agitando-nos o festivo barrete!

Preciosa a descrição que Guimarães faz, a seguir, de Rossi, como um homem gentil e humilde, e os conceitos que expende sobre o caráter frívolo e convencido das celebridades vazias, que já naquela época ocupavam espaço que não merecem:

Ernesto Rossi

A bordo vi Ernesto Rossi, desde que descansei o pé no tombadilho. Nem seria de admirar a minha descoberta, porque Kean e Hamleto destaca-se no meio de todos os entes humanos que o cercam como um semi-deus no seu cortejo mitológico! É um formoso homem e um cavalheiro simpático da ponta dos pés aos suntuosos cabelos louros!

Para ele o talento, a notabilidade do sentimento e a força do gênio, com que o brindou a natureza em um dia de rara prodigalidade, não significam uma barreira atirada entre o artista e o resto dos homens, como muito geniosinho do meu conhecimento acredita e realiza! O seu público, a sua glória, o seu triunfo, Rossi tem-nos no mais elevado grau de consideração e entusiasmo. Aperta a mão que se lhe estende na certeza de que essa mão o vitoriará cem vezes feliz, quando no palco o artista acordar na alma eletrizada do povo as centelhas do entusiasmo e da espontânea ovação!

Assim deve ser o artista verdadeiro e o verdadeiro talento. As reputações de cinco minutos é que se vestem de uma atmosfera de orgulho e vaidade e impõem-se aos contemporâneos com a mesma altivez do anúncio de quatro metros de altura... que dá notícia ao público respeitável da próxima representação de ratos indianos! (...) O mérito real não se explica. Eis porque quando eu vi aquela brilhante cabeça e aqueles bigodes sentimentais dignos de Romeu e de Shakespeare, exclamei:
— É o Rossi, não há dúvida! (DRJ, 7/5/71)


Os divertidíssimos "apontamentos" para uma caricatura de Rossi, que incluem seus olhos, seu nariz, um cabelo de sua famosa verruga,  um cacho de bananas, "a primeira fruta que o eminente trágico comeu no Brasil", e até mesmo as tradicionais "macacas de auditório" para aplaudi-lo
(Mundo da Lua, 13/5/71)

O médico, jornalista, poeta, tradutor e dramaturgo Luigi Vincenzo De-Simoni, pioneiríssimo da imigração italiana, brasileiro de coração desde 1817 e auxiliar de Pedro II em diversas empreitadas artísticas, tomou para si a incumbência de saudar Rossi pela imprensa, em nome da colônia e dos oriundi. Do alto de seus 79 anos, o fez em grande estilo: escreveu duas poesias, uma em italiano e uma em português, e mandou publicá-las no Jornal do Comércio (19/5/71):

Al somme attor tragico italiano ERNESTO ROSSI, al felice su arrivo al porto di Rio de Janeiro
Sonetto

Non serpe il Genio, che in Italia nasce,
Ma l'ali ha grandi, e all'Oceán sorvola;
E fa lungi suonar la sua parola
Si che ognuno l'ammira, e se ne pasce.

Ei dall'Invidia non paventa ambasce;
Anzi ad altri divien modello e scuola;
Perch'ei Natura all'arte non immola,
Ed il senso ha del bel sin dalle fasce.

Prova ne diè Ristori, e Tu novella,
Rossi, la vieni a dar ove trofei
Di somma gloria avrai, come gli edd'Ella.

Gl'Itali, in cui letizia al giúnger crei,
Qui Te onoramo illustre al par di quella;
Che, ov'Essa é la Regina, il Rè Tu sei.

In nome degl'Italiani qui residenti,
Dr. Luigi Vincenzo De-Simoni

Rio de Janeiro, 5 Maggio 1871

ERNESTO ROSSI
Soneto

Rossi, portento és d'arte e da natura;
Esta gênio te faz raro, admirável,
Que eleva-se na cena à suma altura
No terno, no terrível e no amável.

Aquela, em ti, de força e de brandura
Fez tal combinação que, enquanto estável
D'ambas unidas o consórcio dura,
És um novo Proteu vário-mudável.

Quem de Kean, quem de Othelo e dos Sargentos,
Ou do marquês Santa'Ella os trancos viu,
De pasmo e de terror teve momentos;

Abalos tais, tais impressões sente,
Que exclama: União tal d'altos talentos
Jamais houve em tablado aqui no Rio!

Ligeiramente atrasada veio a homenagem de um brasileiro, ou português, eis que não consegui descobrir a nacionalidade de A. C. de Azevedo Coimbra, cuja poesia estampou o D. Pedro II de 1º de junho:


Ao Imortal Ernesto Rossi
Por ocasião de sua chegada à esta côrte

Nas terras brasileiras, nos densos palmeirais,
Nos rios majestosos, na flor, a mais gentil,
Teu nome repetido na voz dos matagais,
Será por longas eras lembrado no Brasil.

Aqui tu não encontras parisiense gala,
Não vês o luxo imenso mostrar grande riqueza;
Porém pergunta às selvas aonde o vento cala,
Aos assombrados bosques quem guarda mais beleza.

Ninguém! — dirão os ecos soltados lá do norte,
Na voz imorredoura das águas do Amazonas;
Ninguém! — dirão os ventos, gelados como a morte,
Que lá do Prata correm fugindo além das zonas!

Buscai nos belos vales entre gentis colinas.
A florescente relva de flores recamada,
No límpido regato, nas águas brilhantinas.
Se mostra o diamante na areia prateada.

Nos bosques mais frondosos a ema nobre habita,
O tigre corajoso lá solta alto rugido;
No oceano calmo o viajor medita,
Ao ver pédreo gigante na relva adormecido.

Nas noites vaporosas a lua resplandece,
Soltando sobre a terra a mais brilhante luz;
E o Cruzeiro mago como exigindo prece,
Recorda ao meu Brasil o mártir da Cruz.

Salve, ó Itália, salve, ó terra encantadora,
Pátria das artes belas de mágica poesia,
Pátria de Tasso, Verdi, de Patti sedutora,
Que a voz do belo canto vassalos mil fazia.

Salve, ó nobre artista, no palco eu te contemplo,
Avante, avante, sempre, que a glória tu já tens,
O meu Brasil te abraça, te forma um novo templo,
Sede feliz, artista, que à minha pátria vens. 

Nas épocas futuras ao percorrer dos anos,
Teu nome reinará nas páginas da história,
Entre os artistas-reis de nomes tão ufanos,
Rossi há de chegar coberto de mil glórias!

A.C. de Azevedo Coimbra

Alexandre Dumas, pai
Os jornais e revistas criaram uma grande expectativa em torno da estréia de Rossi no Rio de Janeiro. A peça com que o italiano abriria sua turnê brasileira — Kean, ou Désordre et Génie (“Kean, ou Gênio e Desordem”), de Alexandre Dumas, pai (1802/1870) — era relativamente conhecida do público; lançada na França em 1836, romantizava episódios na vida turbulenta do ator Edmund Kean e já fora encenada por João Caetano. A intelectualidade adorou a escolha, não só pela qualidade do texto e pelas várias facetas dramáticas do protagonista, mas porque ele incluía um pequeno trecho de Hamlet. Não é exagero dizer que muitos dos críticos que se preparavam para prestigiar o espetáculo estavam aguardando especificamente esse trecho, como também não é coincidência que a propaganda da estréia avisasse que no 4º ato “representar-se-á parte do 2º ato da tragédia de Shakespeare intitulada Hamlet”. O papel de Ofélia foi para Adele Perruchetti, já que Celestina de Paladini interpretava Anna Demby, em Kean.

A estréia, às 20 horas de segunda-feira, 8 de maio de 1871 foi um sucesso moderado, o que se estranhou profundamente, já que o esperado é que o Lyrico explodisse com a super-lotação. Tal não ocorreu. O teatro estava cheio como se aquele fosse um dia qualquer e não a estréia do ator mais famoso do mundo. O Diário do Rio de Janeiro foi sutil em descrever o público presente: “A noite de 8 do corrente ficará eternamente burilada nos fastos do velho teatro Lyrico Fluminense. Representava-se Kean e estreava Ernesto Rossi. A aristocracia do talento, do luxo e do gosto concorreu ardente, ávida, sequiosa, ao pleito do maior artista dos tempos modernos”. (11/5/71) Em outras palavras, estava presente uma elite intelectual, e não a grande massa que — imaginava-se — brigaria para recolher as jóias teatrais espalhadas por Rossi. O Jornal do Comércio fez coro: “A brilhante reputação que já de muito o havia precedido atraiu àquele teatro uma escolhida sociedade, ávida de por si mesmo ajuizar do merecimento desse Proteu do palco, que, no dizer dos apologistas, prima em todos os gêneros da arte cênica”. (10/5/71)


A Vida Fluminense seguiu a mesma linha e assinalou a triste ausência da enlutada família imperial: “Todo o mundo artístico ali se achava; a nata da nossa sociedade adornava os camarotes, e enchia as cadeiras. Viam-se aqui e ali os mais apurados toilettes contrastando com a penumbra do camarim imperial, que, envolvido em funéreo crepe, não deixava como outrora aquele vasto salão ostentar todas as suas galas”. (13/5/71) A Reforma foi na jugular, alfinetando o Alcazar e dividindo claramente em dois, o público fluminense:

Houve ante-ontem à noite no teatro Lyrico um espetáculo como nunca mais se repetirá. Um público escolhido, os atenienses da capital, ocupavam os principais lugares do vasto salão. Os beócios, a massa inerte, a que se extasia com os milagres e com as exposições alcazarinas não fora convidada à esplêndida festa. (...) Ernesto Rossi ia apresentar-se ao público fluminense. Apresentado estava ele. Se nos orgulhamos dos nossos foros de povo generoso e hospitaleiro, praz-nos ainda mais que se reconheça que somos um povo inteligente, que tem o amor do que é belo, do que é grande, do que eleva o espírito e o coração, e que, se acudimos a todos os infortúnios, também saudamos, férvidos, todas as glórias conquistadas nos serenos domínios da inteligência. (10/5/71)

O que mais encantou a crítica foi a versatilidade demonstrada por Rossi na interpretação de Kean. Eis o que disse França Junior no Jornal da Tarde, e o articulista do Diário do Rio de Janeiro:

Edmund Kean
Os segredos mais recônditos da arte revelam-se em Rossi nas coisas mais insignificantes. Prova o que acabo de dizer a maneira por que ele desempenhou o difícil papel de Kean. No primeiro ato, envergando uma casaca, é um verdadeiro gentleman. No segundo já é outro homem. Do terceiro ato em diante começa ele a revelar-se em toda a magnificência de seu talento, e todos o aplaudem com delírio na grande cena do Hamleto, em que se apresenta a situação mais difícil do drama. (JT, 9/5/71)

A paixão, o entusiasmo, a loucura, a arte considerada sob o ponto de vista verdadeiramente artístico, eis o fundo da composição do imortal dramaturgo francês. (...) Os movimentos, a gesticulação, o sentimento, ora lânguido, ora apaixonado, veemente ou frisando as delicadas nuances da comédia fugitiva, encontram nesse excelso ator o mais perfeito e robusto intérprete. No Kean não sabe o espectador o que mais admirar: se a facilidade e naturalidade da dicção nos jogos da conversa íntima, se a expressão e o vigor opulento do gênio trágico, que irrompe com uma descomunal inspiração. (DRJ, 10/5/71)


Kean e Rossi unem-se por tal forma entre as caprichosas evoluções e peripécias deste drama excêntrico, que se fica na dúvida se é Rossi quem representa o Kean, ou se é Kean quem interpreta Rossi. (...) Kean é a desordem, é a luta, é a paixão veemente do leão enclausurado e é a ternura mística do coração que voa na nuvem acetinada do êxtase! Ernesto Rossi possui um órgão admirável, cheio de indizíveis vibrações e de uma harmonia capaz de surpreender a própria música! O diálogo da sala, o jogo da frase delicada e urbana, o mundo da luva de pelica, enfim, é-lhe tão familiar como a atmosfera violenta do ódio, como o tenebroso mistério da loucura, como a dor, como a agonia, como a lágrima, como o desvario e a morte! Com que facilidade suprema ele muda de fisionomia e gesto, enquanto percorre as cintilantes teclas da inspiração dramática! (DRJ, 11/5/71)

Litografia de Eduard Kaiser para
o Kean de Ernesto Rossi em 1851
É rica e detalhista a análise do Jornal do Comércio:

Não foi iludida a expectativa pública nesta primeira prova que exibiu o formoso talento do ator preconizado. A primeira face por que o apreciou o público foi a dramática, o tipo escolhido para a estréia, o bem conhecido Kean, de Alexandre Dumas. Cintilante de mocidade e de gênio, mas indolente, descuidoso, desregrado, o célebre ator descansa dos triunfos da cena abraçado com uma garrafa; generoso e perdulário, gasta a jorros o dinheiro, e vê-se obrigado a evitar os credores; irascível e bom, compassivo e singelo no seu viver interior, a menor contrariedade o arrebata, a mais humilde súplica o apazigua; distinto, requintadamente cavalheiroso nos dourados salões da velha aristocracia inglesa, mostra-se franco, jovial, ruidoso e até brutal nos festins do vulgacho, com o qual não desdenha de fraternizar por servir um amigo de outros tempos.

Galante, apaixonado, terno, comovido aos pés da mulher amada, ostenta-se agora altivo, provocador, feroz e desdenhoso quando repele o insulto e confunde a arrogância do poderoso adversário que encastela a covardia por detrás dos seus brasões nobiliários; fino e espirituoso, sutil e especioso, lutando vantajosamente contra o rival a quem suplanta, e o marido a quem ultraja, torna-se meigo, sincero, paternal e dedicado, abrindo os braços e o coração à neófita da arte que se vem acolher à sombra imensa do seu gênio. Em todos estes lances encontrados, em todas estas diferentes modalidades do mesmo caráter, revelou-se o Sr. Rossi ator do mais subido quilate; e o público demonstrou-lhe o entusiasmo que o possuía, chamando-o repetidas vezes à cena e aplaudindo-o calorosamente em diversas situações, por todo o correr do drama. (10/5/71)

Rossi estava soberbo na cena do Hamlet e muito se falou disso nos dias seguintes:

O caráter (personagem) de Kean foi magistralmente delineado. Mas por onde se nos ergueu a ponta do véu que ao certo encobre prodígios, foi na rápida cena do Hamleto. Aquele príncipe de mármore, no breve colóquio com Ofélia, disse-nos tudo. Podemos saudar Ernesto Rossi como o primeiro ator que há pisado a cena brasileira. Hoje no Othello só aguardamos a confirmação do nosso asserto. (A República, 11/5/71)

Rossi em uma representação mais
recente de Kean, com figurino semelhante
Entra nesse ato o episódio da representação de uma cena do Hamleto. É breve esse episódio mas equivale a uma revelação. A figura sinistra, desesperada, terrificadora do príncipe da Dinamarca grava-se na memória do espectador como se a contemplasse moldada em bronze. O olhar está morto, o lábio pendente, o gesto é o do louco, o passo vacilante, incerto. (AR, 10/5/71)

O articulista do Diário do Rio de Janeiro descreveu a cena com precisão:

A figura do Hamlet interpretada, que digo?, criada por Ernesto Rossi, não comove nem entusiasma... petrifica. Ah, foi aí!, foi aí que eu com todas as quimeras de minha vida literária, com todos os meus sonhos e aspirações curvei-me perante a colossal memória do divino Shakespeare! Era ele, era o Hamleto que nós conhecemos e não adivinhávamos, sequer! A palidez sepulcral da loucura, da descrença e do ceticismo estendendo-se sobre a fronte doentia como o pano de uma mortalha! O que diz Hamleto a Ofélia? E como explicá-lo? E como devassar em língua humana a terrível, a sombria, a impossível inspiração do maior poeta da fria Inglaterra? Ernesto Rossi apodera-se do público nesse momento. A alma da platéia estática pende-lhe dos lábios mortuários e a sombra de sua capa negra, que lambe a poeira, cobre-nos o coração e paralisa-nos o sangue!

Um dos Hamlets de Edmund Kean
Mas como o fluxo das ondas em ebulição, o gênio sobe, sobe acompanhando o sublime desvario do poeta! Hamleto descobre no camarote o seu rival, e a frase inteiriça-se-lhe na boca vingativa! Ofélia, pasma, contempla-o e segue-o; o povo murmura, o ponto quer impedir o escândalo e chama-o à ordem, mas a loucura como a “boa constrictor" (jibóia) devora trago a trago, o espírito e o coração de Kean! Explosão! A gargalhada irrompe-lhe da alma dilacerada e Hamleto, o sombrio Hamleto, à semelhança de Arlequim, agarra a espada ao ombro e começa a dançar grotescamente entre risos, lágrimas e contrações horríveis:
— Non sono Hamleto, sono Falstaff!
A voz quebra-se-lhe na garganta contraída em ululações e gemidos roucos... o corpo estortega-se e aquele olhar fixo cobre-se de névoas desoladoras... É indescritível, Ernesto Rossi, então! Explicar-lhe a profundidade do gênio criador em certas irradiações do seu incomparável astro, seria o mesmo que descobrir-lhe um rival na arte dramática. (...) O público chamou-o uma, duas, três, seis vezes, oito vezes ao proscênio e manifestou-lhe a gratidão do seu delírio e dos seu entusiasmo com a verdadeira tríplice salva com que os enviados da Providência são recebidos na terra. (11/5/71)

Outro Hamlet de Kean
Comentou-se em uníssono o fato de que “em geral é excelente a companhia que trouxe o Sr. Ernesto Rossi”, e de que se tratava de “uma companhia superior à que acompanhava a Sra. Ristori”. O Diário de Notícias fez questão de citar o resto do elenco:

Kean é um portento. O pequeno diálogo do Hamleto, o reconhecimento da condessa de Koefeld, e as transições que se operam desde a conversação com Anne, na taverna, até o escândalo no teatro são de um efeito maravilhoso, e demonstram categoricamente o grande mérito de Rossi e a incontestável inteligência de Celestina Paladini. Estão, pois, demonstrados a nossos olhos os recursos do exímio trágico. As ovações que recebeu no decurso do desempenho do drama são prova evidente do que avançamos. Interpretaram bem os seus papéis, além dos já mencionados, os artistas Leopoldo Vestri, Ludovico Mancini, Ercole Cavara, Carlo Perruchetti e Virginio Vezzosi.

“Amanhã vê-lo-emos no Othello”, disse o articulista de A Reforma, na edição do dia 10 de maio. É a ressalva que vem a seguir, sobre a tragédia do mouro de Veneza, que tem a maior importância: “Mas não o monstrengo literário arranjado pelo ridículo Ducis para a cena francesa do seu tempo, mas na verdadeira tragédia do grande poeta”.

João Caetano e o Othello de Ducis: "Othelo
é uma dessas criações sublimes de Shakespeare
que não necessitam de mais apologias. Ducis a
passou para a cena francesa, e o Sr. doutor
Magalhães, tão conhecido por suas
composições, enriqueceu o nosso teatro
com mais esta tragédia. Os costumes
serão novos, apropriados ao caráter".
(DRJ, 15/9/1838)
Quem é o tal “Ducis” a que o articulista se refere? Uma pequena explicação se faz necessária. Os duzentos anos seguintes à morte de Shakespeare foram de contestação aos cânones da dramaturgia tais quais eles eram conhecidos. O Neoclassicismo — releitura dos clássicos gregos e romanos a partir do Renascimento — tinha por base a “instrução moral” e o “culto da razão”, a despeito da inspiração, pedra angular do teatro shakespeariano. (RHINOW, 2007) Parecia ser uma versão embrionária do “politicamente correto”, que insiste em questionar a moralidade de manifestações artísticas, ao invés de compreender que elas existem para entreter e fomentar a discussão, e não necessariamente para apresentar paradigmas e soluções. Conseqüentemente, Shakespeare foi posto no centro de uma discussão moral absolutamente idiota que teve um único resultado: metade de suas peças passou a ser ignorada e a outra metade foi reescrita sob os padrões moralistas e declamatórios do Neoclassicismo.

Na França, as traduções alteravam completamente a trama e a estrutura de um texto original para adequá-lo às regras estéticas vigentes. Assim, obras-primas como HamletOthello e Macbeth só chegaram aos palcos franceses depois de passar pelo bisturi afrescalhado de escritores como Antoine La Place, Pierre Le Tourneur e sobretudo de Jean-François Ducis. No caso de Ducis (1733/1816), sua abordagem de Othello, que estreou em 1790, está longe de ser uma tradução. É, em tudo e por tudo, uma longínqua e insulsa adaptação da peça de Shakespeare. Não cabe aqui entrar em detalhes, mas basta dizer que nomes foram trocados — Desdêmona agora é “Hedelmonda”, Iago é “Pézaro”, Cássio é “Loredano”, Brabâncio é “Odalberto” e assim por diante — e a trama é suavizada, tornando-se um melodrama simples e bobo; o personagem de Iago foi diminuído para não horrorizar a pudibunda platéia francesa e são leves e inofensivas as referências à negritude do mouro ou a maneira com que Iago descreve a possível infidelidade de Desdêmona.

Depois de falar da “mesquinha imitação de Ducis” e “das estúpidas mutilações de Ducis”, um jornalista comenta que “o mouro de Ducis é um mouro de salão, um Othello que dá mais que fazer ao perfumista do que ao armeiro, um personagem declamador e inverossímil como todos os inventados pelos imitadores dos grandes modelos”. (AR, 28/5/71)

Jean-François Ducis
A exemplo do que geralmente ocorre hoje em relação àquilo que vem dos Estados Unidos, naquela época era natural que o brasileiro procurasse macaquear  tudo que viesse da França, grande farol cultural e intelectual da Europa e do mundo. Logo, quando João Caetano decidiu montar o Othello (assim como fizera anteriormente com Hamlet), foi o texto de Ducis que ele mandou trazer ao Brasil, e não o de Shakespeare. A tradução ficou a cargo de seu amigo Gonçalves de Magalhães e a peça alcançou sucesso nas várias encenações levadas pelo ator ao longo dos anos. Em 1843 aqui esteve o ator espanhol José Lapuerta, que também representou o Othello de Ducis. Diz a crônica que a performance do espanhol foi fundamental para o brasileiro:

Lapuerta era um artista inteligente, que vira na Europa bons modelos e tinha a tradição do Othello de Talma. João Caetano soube compreendê-lo, e assimilar a si aquela criação, como fez também com “A Gargalhada”, que Lapuerta igualmente foi o primeiro a representar entre nós. Do Othello de Ducis, porém, ao Othello de Shakespeare vai a mesma diferença que de um verdadeiro africano ao (personagem) Malek Addel de Mme. (Sophie) Cottin no seu bem conhecido romance de “Mathilde ou as Cruzadas”, ou ao Orosmane (personagem do “Zaïre) de Voltaire. (AR, 28/5/71)

Alfred de Vigny
O articulista se equivoca em parte, porque João Caetano já representava o mouro desde 1838 (mesmo ano em que visitou o Rio o também espanhol Adolpho Ribelle, que representou o 4º e o 5º do Othello francês), portanto cinco anos antes da chegada de Lapuerta. É patente, porém, pela quase unanimidade dos jornalistas, que à altura da chegada de Rossi a obra de Ducis já se tornara obsoleta e símbolo de um movimento literário burguês e almofadinha, que preferia substituir a ação dramática por páginas e páginas de poesia aveludada e gongórica. Em 1879, Camillo Castello Branco cuidaria de eternizar, em seu Eusébio Macário, aquilo que os contemporâneos pensavam daquele Othello de fancaria: "Este sujeito tem a cor do mouro de Veneza; mas cumpre não o confundir com Othelo. Ele entendeu; tinha visto no Rio de Janeiro o João Caetano dos Santos representar um miserável Othelo deturpado de Ducis pelo poeta Gonçalves de Magalhães". (Branco, 1887, pg.96)

Muito contribuiu para isso o lançamento, em 1829, da tradução do Othello de Shakespeare feita por Alfred de Vigny (1797/1863), e a reabilitação do bardo por autores como Victor Hugo (1802/1885) e atores como Gustavo Modena, Ristori, e agora Rossi e Tommaso Salvini. Isso, apesar de tudo, não tirava o mérito de João Caetano; mais do que qualquer coisa havia um sentimento de tristeza por ele ter se dedicado com fervor a um texto tão fraco, quando poderia ter seu nome eternamente lembrado como um genuíno intérprete de Shakespeare. Machado de Assis, na época cronista teatral da Semana Ilustrada, deixou isso claro: “O nosso João Caetano, que era um gênio, representou três dessas tragédias [HamletOthello e O Mercador de Veneza], e conseguiu dar-lhes brilhantemente a vida, que o sensaborão Ducis lhes havia tirado. Não lhe deram todo o poeta. Quem sabe o que ele faria de todas as outras figuras que o poeta criou?” (SI, 25/6/71)

Enfim, João Caetano — e vá lá o lugar-comum — foi produto do seu tempo. Não obstante, continuava sendo um pioneiro e tinha em Lapuerta e em Talma seus grandes êmulos. E nenhum dos dois, vale lembrar, montou outro Othello que não fosse o de Ducis.

Propaganda da festa artística
de Emília Adelaide
No dia seguinte à estréia de Rossi com Kean, o São Luiz foi palco para a festa artística de Emília Adelaide. Não por coincidência, Furtado Coelho escolheu Antony, também de Alexandre Dumas (tradução de Ramalho Ortigão, admirador confesso de Rossi), para estrear na ocasião. Foi um grande triunfo, a atriz portuguesa foi presenteada com flores e grinaldas pelos elencos do São Luiz, da Phenix e do Gymnasio, e quem estava em um dos camarotes aplaudindo a atriz era ninguém menos do que o próprio Rossi. É Guimarães Junior quem nos conta:

Emília Adelaide esteve formosa de paixão, de expressão, de talento e de mocidade! O espectador acompanhava-a trêmulo e absorto, e dos seus triunfos na cena brasileira foi esse o mais vigoroso e esplêndido. (...) Sem exageração chamou o público à cena a grande artista mais de vinte vezes, durante o espetáculo. (...) Furtado Coelho foi um verdadeiro Antony e é o que basta para a sua glória desta noite. Nunca o inteligente artista subiu como ante-ontem às sublimes eminências da paixão. (...) Ernesto Rossi, que não poupou palmas e bravos a Emília Adelaide no Antony, ofertou-lhe uma magnífica coroa tão gloriosa para o ofertante como para a beneficiada. (DRJ, 11/5/71)

Sobre esse belo encontro, eis o que diz o articulista do Diário de Notícias: “Falecem-me as palavras para descrever o que sinto e penso a respeito desta verdadeira glória alcançada por Emília Adelaide. Não era o artista aplaudindo a artista, era o gênio saudando o gênio!” (12/5/71)

FIM da primeira parte

PARTE 2 deste artigo


[1]            O casal iniciaria verdadeira dinastia teatral. Eram pais de Olympia Montani, que casou-se com Álvaro Peres e dessa união nasceu a grande Lucília Peres. Viúva de Montani, Balbina casou-se com Joaquim da Costa Maia, e dessa união nasceu Abigail Maia, tia de Lucília, com quem regulava de idade e ao mesmo tempo rivalizava pelo posto de maior atriz do início do século XX.

[2]            Há referências (Rivista EuropeaO Americano, 30/4/71, O Guarany, 6/5/71) de que Rossi também apresentou em Recife o Oreste, de Alfieri e o Sullivan, de Mélesville (Anne-Honoré-Joseph Duveyrier, 1787/1865). Só encontramos notícias do Cid. Se essas performances de fato ocorreram, foram todas na mesma noite e não passaram de encenações mais recitadas do que interpretadas, pois imagina-se que não haveria tempo ou conveniência para montar e desmontar toda a luxuosa parafernália de cenários e figurinos da companhia italiana.
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BIBLIOGRAFIA
  • A Comédia Social
  • A Vida Fluminense
  • O Americano
  • O Guarany
  • O Mundo da Lua (ML)
  • Semana Ilustrada (SI)
  • A Reforma (AR)
  • Diário de Notícias (DN)
  • Diário do Rio de Janeiro (DRJ)
  • Jornal da Tarde (JT)
  • Jornal de Recife (JR)
  • Jornal do Comércio
  • AMARAL, Antônio Barreto do. História dos Velhos Teatros de São Paulo. São Paulo, Governo de SP, 1979.
  • Biblioteca Nacional Digital
  • BRANCO, Camillo Castello. Eusébio Macário. Porto, Lélo & Irmão, 6ª ed., 1887.
  • FERREIRA, Procópio. O Ator Vasques. Rio de Janeiro, Funarte, 2ª edição, 1979.
  • Revista Philomatica
  • RHINOW, Daniela. Visões de Otelo na cena e na literatura dramática nacional do século XIX (Vols. I e II). São Paulo, USP, 2007
  • Rivista Europea (Volume III). Firenze, Tipografia dell'Associazione, 1871.
  • Teatros do Centro Histórico do Rio de Janeiro
  • Agradecimento a Reinaldo Elias.
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