Musa Sem Querer
Sheilla Castro |
A equipe toda é talentosa. A líbero Fabizinha parece uma vespa, defendendo as cortadas mais violentas, voando de um lado para outro e usando até mesmo chutes bem colocados para devolver a bola ao jogo. Taísa é a gigante de 1 metro e 96 que guarda a rede. Fabiana e Natália têm sempre a paulada certeira que desestabiliza as adversárias. Jaqueline por vezes parece mais preocupada com o cabelo e com a tiara, mas ainda assim é peça relativamente importante tanto na rede quanto na retaguarda. A levantadora Fabíola deixou muito a desejar embora em algum nível mereça perdão, pois foi escalada nos 47 do segundo, quando a jogadora Fofão decidiu não participar do mundial para seguir carreira na Turquia. Sheilla é absolutamente superior.
Não só na beleza, mas na desenvoltura e no talento. Não perdi mais nenhum jogo. Assisti todos, pelo prazer único e exclusivo de ver Sheilla voando, saltando com aquelas pernas agilíssimas, os braços longos, bloqueando, dando aquelas cortadas incríveis, enviesadas e indefensáveis, ou destruindo a defesa adversária com seu saque. Melhor ainda era vê-la vibrando a cada ponto, as câmeras (sempre) focalizando-a na rede, com cara de expectativa, e o sorrisão aberto nos acertos, que eram quase que invariavelmente dela, e nos quais salvou a equipe inúmeras, incontáveis vezes. Impossível tirar os olhos dela. Mas uma andorinha só não faz verão. Sheilla é melhor que o time. O Japão é talvez melhor como equipe, a Rússia tem duas ou três jogadoras excepcionais, mas Sheilla brilha sozinha como a melhor jogadora do mundo. E seguramente a mais linda. É a proverbial musa sem querer.
Bárbara merecia mais
Bárbara Heliodora, durante entrevista no Roda Viva |
Lembro-me que fazendo pesquisa na Câmara Municipal, há uns dois anos, fui abordado por uma funcionária da Biblioteca que me perguntou se era verdade que eu entrevistara membros da 1ª Legislatura (1948/1951). Confirmei, informando, porém, que dos seis que entrevistara, três já haviam infelizmente falecido. Pediu-me o obséquio de fornecer os telefones dos três restantes, a fim de que fossem entrevistados para uma série da TV Câmara sobre antigos parlamentares. Dei os telefones com a ressalva específica – e repetida diversas vezes – que não mandassem um estagiário qualquer para entrevistar aqueles velhos, todos na casa dos 90, pois eram ex-políticos com mais de 70 anos de história de São Paulo na cabeça, e só se abririam se comprovassem estar diante de gente preparada para entrevistá-los. Pedi inclusive que me contatassem, se fosse necessário, e eu orientaria os entrevistadores sobre a melhor forma de abordá-los durante a sabatina. Resultado: mandaram uma estagiária ignorante e despreparada, e as entrevistas foram insípidas e tediosas. Um dos velhos sequer aceitou receber a menina da TV Câmara. Tive mais ou menos a mesma impressão no Roda Viva com Bárbara Heliodora, esta semana. Desde que o novo (e horroroso) formato do programa foi estreado, o número de entrevistadores diminuiu e as perguntas do público foram suprimidas. Isso deixa nas mãos de três entrevistadores fixos – Marília Gabriela, Augusto Nunes e Paulo Moreira Leite – e dois entrevistadores convidados a tarefa de sabatinar o convidado da semana.
Bárbara, na caricatura do gênio Paulo Caruso, que graças a Deus foi mantido na desastrada reformulação do programa |
Cadê o Dedé?
Renato Aragão e Patrícia Poeta no especial de 50 anos do comediante |
Chuck Lorre
Chuck Lorre |
Chuck Lorre é indiscutivelmente um gênio. Enquanto David Crane e Marta Kauffman há seis anos se matam para tentar emplacar algum sucesso que lembre, ainda que remotamente, o maravilhoso furacão que foi Friends, Lorre acertou em cheio com Two and a Half Men, em 2003, e quatro anos depois repetiu a dose com The Big Bang Theory. As duas são, pelo que sei, as séries de maior audiência da TV americana, e merecem isso. A primeira parece ter surgido como um deboche proposital sobre a vida tumultuada e sexualmente promíscua do ator Charlie Sheen e acabou agradando, quase que acidentalmente. Ao longo dos anos, o contraste entre os dois irmãos que chegaram aos 40, um deles charmoso, rico e irresponsável, e o outro bitolado, pobre e azarado, tem sido delineado de forma tão inteligente e cuidadosa que afastou a armadilha de um prevalecer sobre o outro. Os dois arquétipos são mantidos num equilíbrio perfeito, e os sentimentos de estima e pena são idênticos tanto a um quanto ao outro.
O elenco de Two and a Half Men |
O elenco de The Big Bang Theory |
The Big Bang Theory é outra pérola. Só que aqui há o notável desafio criativo de transformar em comédia a vida de quatro cientistas completamente nerds que lidam com partículas subatômicas o dia inteiro, a partir da chegada de uma loira burra, pela qual um deles se apaixona perdidamente. Nesta série também é impressionante a maneira como Lorre faz a situação cômica florescer além do óbvio de se juntar um nerd e uma gostosa. No processo, ele acabou criando um dos personagens mais sensacionais de todos os tempos: Sheldon Cooper, o físico misantropo e assexuado, interpretado à perfeição pelo genial Jim Parsons. Aliás, é na composição detalhista e meticulosa de seus personagens que está a diferença fundamental entre Lorre e a dupla Crane/Kauffman. Os seis personagens de Friends tinham características próprias e eram divertidíssimos, mas um dos grandes defeitos da série foi a alteração extemporânea de determinados aspectos de cada um, do meio para o fim, quando a necessidade de se esticar a série trombou com o limite hermético daquilo que havia sido criado inicialmente. Tanto em Two and a Half Men quanto em The Big Bang Theory, isso não ocorrerá porque as possibilidades são infinitas.
O Brasil pode até fazer novelas melhor do que os norte-americanos. Essa superioridade, aliás, restringe-se à produção, porque em elenco, as novelas de ambos os países são pródigas em nulidades. Mas estamos engatinhando em matéria de sitcom. Precisamos estudar com Chuck Lorre.
Amado Mestre
Chico, durante o especial "Chico e Amigos" |
Digo do gênio que “foi” sem qualquer morbidez; ele está vivo e bem para nossa suprema alegria, mas confesso que me chocou vê-lo tão fragilizado. Acostumado a assistir entrevistas de Chico, uma ou outra de suas participações no Zorra Total ou comerciais de TV, nunca reparei que os últimos sustos de sua saúde haviam deixado marcas indeléveis. No meio do programa houve um momento em que Chico contou piadas tendo na platéia seus próprios personagens. Senti em sua voz a dificuldade de falar mais alto, de modular, de rir, de dar esta ou aquela intenção e, por fim, de tudo em que fosse necessário usar o pulmão. Logo Chico, desde criança dono de uma das mais belas vozes do Brasil; ele que realizou o milagre da multiplicação das vozes e criou quase 500 personagens ao longo de sua vida. O último bloco trouxe Chico vestido de professor Raimundo, dando aula para seus personagens. Pela primeira vez reconheci o velho em Raimundo. Nunca conseguira entrar na ilusão da peruquinha e do bigode branco; Chico era demasiado ágil fisicamente para que eu pudesse acreditar na velhice do personagem. Ontem vi esse velho pela primeira vez.
Milton Gonçalves, apresentador do BBB no "Chico e Amigos", e o Professor Raimundo |
Chico hoje está hospitalizado, se recuperando de uma pneumonia. Há meses ele vem pedindo à Globo que ressuscite a Escolinha do Professor Raimundo, admitindo com total sinceridade que o velho professor – sempre sentado e apenas interagindo com os alunos – é o personagem perfeito para sua atual condição física. Desejo com toda a minha alma que a Globo dê ouvidos a Chico de uma vez. Ontem, no fim do programa, Raimundo ganhou o Big Brother expulsando todos os personagens da casa. Ele olhou para a câmera de trás e soltou o bordão tradicional: “E o salário... ó”, mas logo em seguida olhou para a câmera em sua frente e disse “mas o prêmio, ó”, e abriu os braços. A imagem congelou e todos os personagens apareceram nesse abraço final. Meu coração apertou e eu chorei mais uma vez. Chorei tentando entender por que a Globo ainda não fez a vontade de Chico. Chorei de saudade de uma época em que o brasileiro perdia tudo, menos o programa semanal de Chico. Mas chorei, sobretudo, porque tenho medo que Chico morra. Medo de perder a maior referência que temos de humorista, medo de perder o artista mais versátil, mais eclético e mais genial que o Brasil já produziu. Medo de não ter mais esse gênio ao nosso lado, para nos orientar. (Incluído em 3/1/2011)
Não tem como ler e não se emocionar. Você conseguiu transpor para este texto a alegria e o lamento de quem ama esse grande artista brasileiro.
ResponderExcluir“Chorei de saudade de uma época em que o brasileiro perdia tudo, menos o programa semanal de Chico.”
Viva Chico Anísio!