OTHON BASTOS
Othon no Persona in Foco, foto de Jair Magri |
Sônia Loureiro, Othon e Rubens Ewald |
No cinema esteve no "Pagador de Promessas", o filme de Anselmo Duarte premiado com a Palma de Ouro em Cannes; foi alterego de Glauber Rocha, protagonizou obras-primas de Ruy Guerra e Leon Hirszman, marcou presença indispensável no ressurgimento do Cinema Brasileiro em filmes de Walter Salles e Lais bodanski. Na TV foi do Teatrinho Trol e do Grande Teatro Tupi até "Os Imigrantes", "Roque Santeiro" e "Éramos Seis".
Com Gracindo Jr. e Othon no Teatro dos 4, depois da representação de "Meus Prezados Canalhas", 1994 |
Othon é um dos maiores atores brasileiros? Sem dúvida nenhuma. Ele é o Teatro Brasileiro? Não. Ele é MAIOR do que o teatro. Ele é a ARTE brasileira. O que o povo brasileiro tem de melhor.
Assistam.
Reclamo novamente, como já reclamei quando da apresentação do programa com Fagundes, da tesoura que tolhe, desbasta e limita em 59 minguados minutos, uma gravação que ultrapassou as duas horas e meia. Othon tem 60 anos de carreira, participou em primeiro plano de tudo de mais significativo que se fez nesse período. E para nossa imensa satisfação, ele é inteligente, articulado, torrencial, gosta de falar, fala bem e é um contador de histórias primoroso. Simplesmente não me conformo com o absurdo e o pecado de querer espremer em uma única hora algo tão maravilhoso, apenas para que uma reprise qualquer comece no horário certo, lá pela meia noite e meia!
TV Cultura, por favor! DANEM-SE as reprises. Othon é nosso passado e nosso presente. Vamos valorizá-lo AGORA, pelo amor de Deus. (15/08/2016)
ANGUS MCBEAN
Angus Macbean |
Resolvi então aproveitar que no mesmo dia comemora-se o Dia do Ator e fico com Angus Macbean (1904/1990), certamente o maior fotógrafo do Teatro Inglês no século XX. É graças à sua lente que podemos hoje conhecer de perto a caracterização de todos os mestres - Olivier, Vivien Leigh, Gielgud, Peggy Ashcroft, Richardson e etc. - em seus melhores papéis shakespeareanos.
Foi também retratista de algumas das maiores celebridades de Hollywood e - soube recentemente - é de sua câmera a capa de "Please Please Me", dos Beatles.
Gênio.
Há centenas de fotos magníficas de MacBean. Merecem um artigo à parte. Acima, o "Tito Andrônico" de Olivier e Vivien, 1955, que Kenneth Tynan definiu como "an unforgettable concerto of grief".
(21/08/2016)
MIMI WO SUMASEBA (1995)
Ampliando um pouco o leque de maravilhas que vem do Ghibli, assisti みみ を すませば, "Sussurros do Coração", com roteiro de Miyazaki e direção de Yoshifumi Kondô.
Eu andava um pouco desconfiado porque depois de ser maravilhado seqüencialmente por jóias de Myiazaki como "Kaze no tani no Naushika" ("Nausicaä do Vale do Vento"), "Tonari no Totoro" ("Meu Amigo Totoro"), "Sen to Chihiro no kamikakushi" ("A Viagem de Chihiro") e "Gake no ue no Ponyo" ("Ponyo - Uma Amizade que Veio do Mar"), confesso que não tive a mesma catarse com "Majo no takkyûbin" ("O Serviço de Entregas da Kiki"), "Kurenai no buta" ("Porco Rosso") e "Mononoke-hime" ("Princesa Mononoke"). Estes últimos três são brilhantes, originais, tem imagens belíssimas (sobretudo Kurenai), são manancial de inspiração para filmes que vieram depois (sobretudo Takkûbin) e devo revê-los quando puder, mas não foram a lufada violenta de genialidade dos primeiros. Talvez minha opinião mude depois de uma segunda chance.
A desconfiança seguiu quando assisti Hotaru no haka ("Cemitério dos Vagalumes") - verdadeiro vale de lágrimas, apelativo demais - e Omohide poro poro ("Memórias de Ontem"), este certamente bem melhor, mais leve e contemplativo (alcançando aqui e ali picos de absoluta genialidade nas cenas que envolvem a criança Taeko, divertidíssima e um dos mais maravilhosos personagens do Ghibli), ambos de Isao Takahata, nº2 do Ghibli.
Cheguei então a Mimi wo sumaseba, que desfia as idas e vindas da menina Shizuku e seus tormentos adolescentes. O tema seria suficiente para afastar qualquer adulto, mas quando se trata de algo escrito por um gênio, o receio desaparece. E esta animação é uma pérola. Myiazaki é tão sutil, tão inteligente que transforma uma simples história de coming of age, repleta de clichês, namoricos e bobagens em um épico de fantasia e sensibilidade. Seu célebre talento em criar as mais adoráveis personagens femininas infanto-juvenis está inteiro em Shizuku. Há humor, há drama e há música. Não sei se foi idéia de Myiazaki ou do diretor incluir no filme e na própria trama e música "Country Roads", de John Denver, mas a brincadeira é responsável por dois dos melhores momentos de toda a produção.
Eu seria profundamente injusto, porém, se desse todo o crédito ao roteirista e esquecesse o diretor Yoshifumi Kondô. Receber um diamante bruto de alguém como Myiazaki e entregá-lo polido e radioso é para quem tem a centelha do gênio. Ele trabalhou como produtor de animação de quase todos os filmes do Ghibli, e Myiazaki o preparava para ser seu sucessor no estúdio. Estreou com Mimi wo sumaseba, que foi um extraordinário sucesso de crítica e público mas não pôde dar seqüência ao que seria uma linda carreira, porque teve um aneurisma e morreu três anos depois. Tinha 47 anos.
Mas seu filme ficará para sempre.
Recomendo. (21/08/2016)
KARI-GURASHI NO ARIETTI
Mais uma jóia do Ghibli. Direção de Hiromasa Yonebayashi e roteiro de Myiasaki, baseado em "The Borrowers", de Mary Norton.
Embora seja originalmente falado em japonês, é uma parceria do Ghibli com a Disney, então a canção-tema é em inglês. Música linda, por sinal, composta e cantada pela francesa Cécile Corbel.
Encontrei o video abaixo no Vimeo (o Youtube proibiu a reprodução da música por conta de direitos autorais). Além de trazer a canção, é uma homenagem ao Ghibli. (04/09/2016)
THE HOLLOW CROWN
Ben Whishaw como Ricardo |
Belíssima produção da BBC! Como não soube dela antes? Primeira vez que vejo Ricardo II e Henry IV levados à TV (evitei as montagens da BBC na década de 70, geralmente ruinzinhas).
A performance de Ben Whishaw como Ricardo II beira a perfeição! Há tempos o trabalho de um ator não me impressionava tanto. Jeremy Irons está ótimo como sempre. Simon Russell Beale está ok como Falstaff. Talento sem carisma, infelizmente. Já Tom Hiddlestone, tão comentado, ultimamente, me decepcionou. É o contrário de Beale. Tem um rosto marcante, algum carisma, mas está longe de poder lapidar um diamante interpretativo como Hal. É, como tantos, um ator moderno. Falta-lhe estofo para Shakespeare.
Ainda estou na primeira temporada. Voltarei para comentar a segunda, que continua a saga dos Plantagenetas. (09/09/2016)
FALSTAFF (1965)
Ou "Chimes at Midnight", citando a fala de Falstaff a Shallow no fim do Henry IV. Versão restaurada, finalmente, de mais um dos trabalhos de Welles que estão esquecidos por conta de décadas de má conservação dos negativos. Assisti há uns quinze anos mas a cópia em video era da pior qualidade.
Volto a assistir agora, restaurado, e confesso que é bom vê-lo na sequência do contemporâneo "The Hollow Crown". Welles costura de maneira algo anárquica as cenas de Falstaff nas duas peças e a série da BBC me refrescou na memória a cronologia de Ricardo II e os duas partes de Henry IV.
O elenco tem semelhanças e qualidades curiosas; Welles é o melhor Falstaff de todos os tempos, então nem sequer sobra espaço para que lembremos de Simon Beale. E como Maxine Peake, mesmo sendo ótima, poderia competir com Jeanne Moreau? Já o Henrique de Jeremy Irons, natural e decadente, está muito mais crível do que o sempre gongórico e declamativo John Gielgud. Quanto a Margaret Rutherford e Julie Walters, são Mistress Quickly diferentes, mas com igual talento.
No caso do jovem Hal, ocorre a triste coincidência de tanto Tom Hiddleston quanto Keith Baxter serem equivalentes em sua mediocridade e não conseguirem - apesar de intenso esforço e boa-vontade - convencer na pele do boêmio e inconsequente Hal.
Recomendo. (10/09/2016)
1940
Magnífica propaganda da Antarctica para o Carnaval de 1940. Que beleza! (15/09/2016)
Obra prima apenas para anunciar nos jornais o sorteio da Loteria Federal na primeira quinzena de 1940. (14/09/2016)
1940 - Carnaval. Tenho que descobrir quem era o artista, ou os artistas que faziam esses desenhos. Uma coisa espetacular. (15/09/2016)
ELKE
Com Elke no Pequi, 2002 |
Em maio foi Cauby... hoje foi Elke que subiu aos céus. Mortes fortemente simbólicas. Pessoas doces e coloridas. Nunca foram contra nada. Ao contrário, eram a favor de tudo. Verdadeiros exemplos para determinados movimentos ressentidos e vingativos que pregam, com o mesmo preconceito e sectarismo que condenam, os direitos deste ou daquele. Para eles tudo e todos tinham seu espaço. Não precisaram criar trincheiras, adversários, inimigos figadais para transmitir sua liberalidade. Acredito que pela simples e prosaica razão de que eram felizes e amavam o ser humano, em primeiro lugar. Eram verdadeiros humanistas, verdadeiros democratas.
Elke começou como modelo, se tornou atriz e não por coincidência virou uma espécie de guru e mascote dos Dzi Croquetes. Era o embrião do hoje tão decantado (e mal definido) pansexualismo. Elke não tinha uma tribo. Tinha TODAS. Era respeitada e bem recebida em todos os lugares. E por quê? Porque dentro dela havia um ser humano pensante, inteligente, fino, sofisticado, antenado com o momento. Poucos percebiam isso, por conta de sua persona televisiva, extravagante e espalhafatosa, mas Elke estava a anos-luz de ser só uma comediante, uma mera drag queen barulhenta e divertida. Era cultíssima, lida, viajada, vivida.
Beleza estonteante, aos 18 anos |
Encontrei Elke duas vezes. Uma vez num avião, quando tinha uns nove ou dez anos. Fui pedir-lhe um autógrafo. Ela assinou e beijou o papelucho que lhe dei. Agradeci e saí andando quando escuto, altíssimo: "E O MEU BEIJO???" Voltei envergonhadíssimo e levei uma carimbada de Elke na bochecha. Ao longo dos anos lembrei-me dela com carinho e simpatia. O programa do Chacrinha é parte fundamental de minha adolescência e toda a semana eu tinha um encontro inadiável com ela, com as chacretes e com o Velho Guerreiro. Na seqüência ela foi trabalhar com Sílvio Santos. E assim foi: nunca um escândalo, nunca uma fofoca, nunca uma maledicência, nunca uma polêmica. A figura mais "outrageous" de nossa TV era discreta e tranqüila. Vivia para divertir os outros e a si mesma. Sem jaça, sem maldade. Só alegria.
Um ser humano maravilhoso |
Aprendi muito sobre tolerância e generosidade humana observando o exemplo dela e de Cauby. Na página de Elke, hoje, no Face, há uma mensagem que termina com uma frase que certamente é dela. Frase tão certeira, que a define tão perfeitamente, e que considero uma pérola:
"CRIANÇAS, CONVIVER É O GRANDE BARATO DA VIDA. APROVEITEM E CONVIVAM". (16/08/2016)
VEM COMIGO
Com Goulart, 2001 (creio) |
Goulart, meu Deus.... que ano terrível!... toda semana um necrológio...
Não há pessoa da geração dos anos 70 que não tenha crescido sob o impacto das reportagens cruas e marcantes de Goulart de Andrade no "Comando da Madrugada". E não pelo sensacionalismo de algumas matérias, ou pela ocasional nudez (sempre muito bem-vinda), mas porque ele era um repórter tão competente e tão carismático, que conseguia transformar em palatável e informativo algo que nas mãos de qualquer outra pessoa seria de escandaloso mau-gosto.
Além de ser o mais versátil de todos. Lembro-me até hoje de sua antológica reportagem com Andrea de Maio e as travestis de rua, aplicando silicone ali mesmo, em frente à câmera do fiel Capeta, da maneira mais tosca e insalubre possível. Em outra ocasião Goulart acompanhou Zeketti a uma clínica de urologia e os exames no velho compositor foram mostrados candidamente, sem cortes (minha mãe cobriu os olhos, gritando, "que horror!!!!"). E depois disso mostrava tranqüilamente uma visita ao restaurante de Marcos Bassi, ou mostrava a Cinemateca e ria de encontrar fitas de si mesmo na década de 60, ou celebrava o centenário de Chaplin falando a mesma língua do melhor cinéfilo. Misturava o mundo sofrido e cão ao mundo burguês, ou ao mundo artístico, intelectual, sempre com suavidade, bom humor, bom astral, de forma impecável. Conhecia tudo e todos.
Goulart era O repórter. E um prazer imenso e constante de assistir, madrugada adentro.
Essa foto é de 2000 ou 2001. Ele andava meio sumido, na época, e adorei conhecê-lo. Mais de uma década depois ele aparece na Gazeta, ensinando reportagem a estudantes da Cásper. Que fim mais lindo, mais digno, mais perfeito para ele, que era um vade-mécum de jornalismo e reportagem.
Um grande beijo, mestre!
E OBRIGADO! (23/08/2016)
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"If you want to view paradise, simply look around and view it.
Anything you want to, do it. Wanna change the world?
There's nothing to it".
"Pure Imagination", de Leslie Bricusse e Anthony Newley, cantada por Gene. E ninguém poderia ter interpretado melhor essa música. Porque embora fosse um homem sério, pragmático e não considerasse Wonka seu melhor papel, ele certamente mudou nosso mundo. Para muito melhor. (31/08/2016)
Gene e Mel, em 1974, filmando "Young Frankenstein", e em 2007, na estréia do musical baseado no filme |
Quando soube da morte de Gene Wilder, Mel Brooks tuitou: "He blessed every film we did together with his special magic and he blessed my life with his friendship".
Já Wilder, quando perguntado sobre como era trabalhar com Brooks, nos três filmes que fizeram juntos, respondeu: "Heaven on a stick".
Na foto, os dois em 1974, durante as filmagens de "Young Frankenstein" e 33 anos depois, quando o filme virou musical e Wilder compareceu a uma apresentação com Mel.
Tenho pensado muito em Gene Wilder. Vou escrever sobre ele em breve. (04/09/2016)
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A deliciosa "Crazy", canção que abre o filme Stir Crazy - segunda colaboração de Gene e Richard Pryor, desta vez dirigidos por Sidney Poitier em 1980 - foi escrita por Michael Masser e Randy Goodrum, e no filme é cantada pelo próprio Gene Wilder.
Mais uma lembrança doce e divertida - como praticamente tudo que vinha de Gene - tendo como pano de fundo uma Nova York molhada e fria - e pra lá de caótica - e ainda assim aconchegante, do fim dos anos 70. (13/09/2016)
GENE
2008, lançando "The woman who wouldn't" em Hollywood |
Como tantas
pessoas da minha geração, pensei que Gene Wilder tinha se aposentado do cinema
por não conseguir superar a perda de sua esposa, a atriz Gilda Radner, morta em
1989 depois de três anos de uma batalha cruel contra um câncer no ovário. A
verdade, entretanto, era completamente outra. Dois anos após a morte de Gilda,
Gene se casou novamente com aquele veio, de fato, a ser o grande amor de sua
vida: Karen Boyer, que ele conheceu fazendo laboratório para o filme See no Evil, Hear no Evil em uma
instituição para surdos. Feliz e tranqüilo no amor, decepcionou-se com os
roteiros que recebeu nos anos seguintes, que considerou medíocres, cheios de
palavrões, sexo gratuito, violentos demais ou apinhados de efeitos especiais,
em suma, tudo aquilo de que foge um ator sério como Gene, forjado no Actor’s
Studio de Lee Strasberg, e experimentado nos palcos desde muito cedo, interpretando
textos dos maiores dramaturgos de todos os tempos.
Em 1999 teve
seu próprio rendez vous com o câncer,
um linfoma não-hodgkin, que tratou e venceu. No primeiro lustro do novo século
descobriu o prazer pela escrita, lançou suas memórias e mais quatro ou cinco
livros de ficção, todos muito bem recebidos. Apreciou a transformação em
musical de duas de suas colaborações com Mel Brooks — The Producers e Young
Frankenstein — e deplorou, com toda a razão, o horroroso remake de Tim
Burton para “Willy Wonka and the
Chocolate Factory”. Em entrevistas disse que não descartava uma volta ao cinema
desde que o roteiro fosse de seu agrado. Chegou a mencionar Judy Dench como uma
das atrizes com quem gostaria de trabalhar. Recentemente desenvolveu o Mal de
Alzheimer. Ouvi dizer que Spielberg o teria convidado para interpretar o papel
principal em The BFG, baseado no
livro de Roald Dahl — mesmo autor de Willy
Wonka — mas já era tarde. Pra variar, Hollywood só acordou quando Wilder já
não tinha mais condições de trabalhar. O papel foi para o competente mas
insípido e inodoro Mark Rylance.
**********
Qualquer
coisa que eu disser sobre Willy Wonka
e o efeito que teve sobre mim como criança será redundante. Sobre os 40 ou 50
minutos de filme antes de Wonka aparecer. Sobre sua entrada antológica,
memorável, na qual finge ser um manco e acaba dando uma cambalhota que encanta
a todos (e que mais tarde soube ter sido idéia do próprio Wilder). As “nevascarangas”,
da (ótima) dublagem em português. O pátio central, na qual ele canta “Pure
Imagination”. Oompa Loompas. O que dizer sobre a cena do refrigerante que fazia
todos levantarem vôo? A arrepiante e sensacional cena do túnel... não preciso
falar que tive medo. Ou que havia um certo pavor na desgraça de cada uma das
crianças, cada vez que recebiam sua justa punição. Tudo é fantástico, tudo é
mágico. A cena final, o everlasting
gobstopper, a revelação de Wonka, o carinho e o elevador... ah, o elevador.
Aprendi com esse filme o que era chorar de emoção. Melhor não falar. Como
disse, tudo é redundante quando se fala do que atinge as raias da perfeição.
Meu segundo
encontro com Gene veio quando eu entrava na adolescência. Foi em Silver Streak, que a Globo transmitiu em
algum sábado à noite. Lembro-me de rir até secar as lágrimas. Rir de não
conseguir respirar. De passar o resto da noite e os dias seguintes comentando o
filme com meus irmãos. Gene e Richard Pryor eram dia e noite, café com leite,
queijo e goiabada e todas as analogias possíveis que descrevam aquilo que não
necessariamente se encaixa, mas aumenta. Eram complementares mas não no sentido
de um suprir as faltas do outro, mas de somar sem obstruir. Não eram os novos
Gordo e o Magro, ou Martin e Lewis, porque nenhum deles era o straight man. Ambos eram protagonistas cômicos
equivalentes. Diferentes mas compatíveis. Como dizia o próprio Gene, sempre
fazendo a ressalva humorística de que não desejava ser mal compreendido, a
relação poderia ser comparada ao sexo, em termos de que a química interpretativa
entre ambos era incontrolável. Não paravam de improvisar, de criar, de
divertir, enquanto estavam juntos em cena. E Silver Streak é um banquete de humor, onde sobram risos, uma trama
policial excelente e um belo romance entre Gene e Jill Claybourgh. Gene era um leading man completo.
No Inside the Actor's Studio, 1996 |
No lançamento de "Kiss me like a Stranger" em Londres, 2005 |
Assisti,
então, de uma única vez, The Producers,
Young Frankenstein e Blazing Saddles. O primeiro é ótimo. O
segundo é uma obra-prima com alguns deslizes. E o terceiro é uma idiotice com
alguns bons momentos. Aproveitei o embalo e vi outros dois filmes que estavam, por sorte, inteiros no youtube (e não estão mais, pelo que sei): o simpático e esquecível Start the Revolution Without Me, de 1970, direção de Bud Yorkin, com Gene e Donald Sutherland em papéis duplos; e o desconhecido e estranhíssimo Rhinoceros, de 1974, segunda e última colaboração entre Gene e Zero Mostel, dirigida por Tom O'Horgan a partir da peça de Ionesco. Para se ter uma idéia, não tive saco para ver até o fim. Com tudo para dar certo, o filme é simplesmente chato.
No ano passado, novo encontro de alma. Fui varejar o agora bem fornido youtube com tudo que pudesse achar, de Gene. Entre outras, assisti sua magnífica entrevista a Ernie Manouse, de 2006, por ocasião do lançamento de suas memórias, e seus dois bate-papos com Robert Osborne, do TCM, em 2013 e 2014. Foi agridoce. Nestas últimas sua saúde já se mostrava precária. Gene, sempre tão articulado e tão brilhante ao expor suas opiniões, estava cansado, lento, fragilizado. O gênio estava lá, mas já não tinha mais vontade ou força para se mostrar inteiro. E no dia 29 de agosto deste ano ele se foi. Treze dias depois do grande Arthur Hiller, diretor de Silver Streak.
No ano passado, novo encontro de alma. Fui varejar o agora bem fornido youtube com tudo que pudesse achar, de Gene. Entre outras, assisti sua magnífica entrevista a Ernie Manouse, de 2006, por ocasião do lançamento de suas memórias, e seus dois bate-papos com Robert Osborne, do TCM, em 2013 e 2014. Foi agridoce. Nestas últimas sua saúde já se mostrava precária. Gene, sempre tão articulado e tão brilhante ao expor suas opiniões, estava cansado, lento, fragilizado. O gênio estava lá, mas já não tinha mais vontade ou força para se mostrar inteiro. E no dia 29 de agosto deste ano ele se foi. Treze dias depois do grande Arthur Hiller, diretor de Silver Streak.
Queria,
evidentemente, ter tido o prazer de poder abraçá-lo pessoalmente e agradecer-lhe
por ter sido quem foi e por ter premiado nossa vida com seu talento. Mais do
que isso, porém, já me contentaria com a certeza de que ele tinha pelo menos
noção do quanto fez bem a todos nós com seu trabalho. Gene era tão honesto, tão
pragmático que não sei se ele alguma vez parou para considerar isso. Espero que
o grande amor e admiração que todos lhe devotávamos tenha sido fonte de
conforto para ele em todos os momentos.
Muito
obrigado, amado amigo, lembrança mais doce de nossa infância, referência eterna de talento, modelo de inteligência, exemplo de honestidade... OBRIGADO!
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