 |
Correio da Manhã, 6/9/39 |
Em “A Voz Humana”, a deliciosa peça de um
ato, de Jean Cocteau, (...) a nossa grande comediante será admirada pela
platéia através de todos os seus maravilhosos recursos interpretativos. Os
variados momentos desse lindo poema de amor e de desespero, que é “A Voz Humana”,
serão vividos com todo o expressivo colorido de que se revestem, da mais
infantil meiguice à mais violenta revolta, do tumulto da paixão à serenidade da
renúncia. (O Imparcial, 6/9/39)
Não há
comentários sobre a performance de Bibi nas duas sessões, mas deve ter sido uma
noite extraordinária para Dulcina, “a nossa maior comediante, valor autêntico e insofismável do teatro nacional”. “A sua festa (...) revestiu-se do maior brilho, assinalando notável acontecimento que repercutiu com simpatia nos meios teatrais da cidade”. Segundo a imprensa, ela recebeu, “ao pisar em cena, uma prolongada e
significativa salva de palmas. Também no intervalo entre as duas peças do
programa da festa, a homenageada foi novamente alvo de expressivas ovações, ao
tempo que eram levadas para o palco lindas corbeilles
de flores naturais”. (Diário de Notícias, 8/9/39) Vale dizer também que foi o primeiro encontro artístico de Bibi e a grande Dulcina, que cerca de quinze anos depois se tornaria madrinha da filha única de Bibi, Tina.
 |
Martha Eggerth e Jan Kiepura |
Cinco dias
antes dessa homenagem, a Alemanha invadiu a Polônia e começou a Segunda Guerra.
O tenor Jan Kiepura, um dos maiores artistas poloneses, casara-se em 1936 com a
igualmente famosa soprano húngara Martha Eggerth e por conta da ascensão do
nazismo, ambos deixaram seus respectivos países no ano seguinte e emigraram
para os Estados Unidos. Continuaram lá uma carreira que já dava frutos na
Europa, tanto no teatro quanto no cinema. Em 1940 Jan terá dois acontecimentos
decisivos em sua vida: seu nome será incluído no dantesco Lexikon der Juden in der Musik – espécie de lista negra de músicos
judeus ou “meio-judeus” elaborada pelo partido nazista alemão — e fará uma
turnê na América do Sul, onde o destaque é sua participação na grande Temporada
Lírica do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, patrocinada pela prefeitura e
organizada pelo maestro Sílvio Piergili. De quebra, Martha foi contratada no
mesmo período para uma série de shows no Grill Room do Cassino da Urca, o que significava uma
turnê brasileira concomitante para o célebre power couple da música clássica.
A Temporada
Lírica de 1940 foi algo de espetacular. No primeiro semestre, não fazendo
sequer parte do evento, estiveram no Brasil o jovem Jascha Heifetz — já
considerado um dos maiores violinistas do mundo — o pianista polonês (também emigrado
aos Estados Unidos) Arthur Rubinstein e as pianistas brasileiras Guiomar Novaes
e Magdalena Tagliaferro, que alcançaram consagração no exterior e voltavam de
vez em quando ao Brasil. A temporada, propriamente, só começava em agosto.
Prometia catorze óperas e além de Jan Kiepura, trazia tenores como Bruno Landi
e Tito Schipa, e sopranos como a brasileira Bidu Sayão — outra que há tempos
era mais cultuada nos Estados Unidos do que no Brasil, e estava acostumada a se
apresentar com Kiepura no Metropolitan de Nova York — a japonesa Toshiko
Hasegawa, do Scala de Milão, e a franco-italiana Gina Cigna, velha conhecida de
nosso público, entre muitos outros. Orquestra com 75 “professores”, coro de 70
vozes e corpo de baile com 45 figuras, estas sob a direção da bailarina russa
Maria Olenewa, que morava no Brasil desde 1926, quando criou com Mário Nunes
uma escola de dança no Municipal, oficializada em 1931.O corpo de
baile foi criado em 1936.
Mas a cereja
do bolo dessa temporada não era nem Kiepura, nem Bidu e nem Schipa. Silvio
Piergili vinha se desdobrando em negociações desde fevereiro para trazer
Leopold Stokowsky ou ninguém menos do que o venerando Arturo Toscanini para
abrir a temporada. Ou os dois, se fosse possível. Vencidos os intermináveis
óbices financeiros — o cachê de Toscanini era astronômico — a prefeitura do
Rio, em parceria com o governo de São Paulo, conseguiu contratar o velho
Toscanini para quatro concertos no Rio e dois no Municipal de São Paulo.
**********
 |
César Ladeira (O Malho, jul/41) |
Fernanda
Montenegro, ao entregar a Bibi o Prêmio Sharp por sua carreira, em 1996, disse:
“Bibi, você sempre foi parte do meu Olimpo teatral. Desde quando eu ouvia você
cantar na Rádio Mayrink Veiga, desde sua estréia no teatro como Mirandolina, eu
sonhei ser como você”. Atualmente, quando se fala da antiga associação de Bibi
com o rádio, a única referência é sua passagem pela Mayrink Veiga, graças ao
convite de seu diretor artístico, César Ladeira. Ignora-se tudo o que veio
antes e fixa-se em um período que, assim como a passagem de Bibi pela Rádio
Ipanema, não durou nem seis meses. Justiça seja feita, a própria Bibi nunca sequer citou a Ipanema. E sobre a Mayrink ela não chegou a ser, digamos, caudalosa nos detalhes. Mas consignou com bastante clareza pelo menos o período onde lá trabalhou: “Como toda garota carioca, já cantei no rádio, aliás, estive até contratada, de julho de 1940 a janeiro de 41, na Mayrink Veiga”. (Jornal das Moças, 29/5/41) Poucos anos depois de sua estréia com Procópio lhe
perguntaram: “Você cantou na Mayrink Veiga no Programa do Almoço?” “Cantei”, respondeu ela, “e compus também
algumas músicas”. (Ilustração Brasileira,
dez/47)
Embora relativamente recente, e Bibi estivesse na ordem do dia por toda a década de 40, o assunto parecia distante e de difícil acesso. Eis um comentário de abril de 1948: “Bibi Ferreira já cantou muito
tempo num Programa do Almoço que
havia na Mayrink Veiga, interpretando foxes”. (Revista do Rádio, abr/48) O “muito tempo” fica por conta do
articulista.
 |
Revista do Rádio, abr/48 |
Se apenas
oito anos depois de Bibi trabalhar na Mayrink as informações já começavam a ganhar braços e pernas, hoje em dia não é diferente. Carla Siqueira, por exemplo, foi responsável
pelo verbete da Mayrink Veiga no DHBB, Dicionário Histórico-Biográfico
Brasileiro, editado pela FGV. Diz ela, escorada em sólida documentação: “Nesse
período de maior evidência da Mayrink Veiga, Almirante ali lançou o seu
programa Caixinha de Perguntas e mais
Programa do Almoço, com Bibi
Ferreira, Lenita Bruno, Alvarenga e Ranchinho e Jararaca e Ratinho”. (Abreu
& outros, 2001)
 |
Almirante, na caricatura de Augusto Rodrigues (Revista do Rádio, abr/48) |
Pois é, mas há um problema: no prefácio de sua biografia de
Noel, o próprio Almirante cita as sete estações por onde passou durante sua
vida no rádio, e lá não está a Mayrink. No mesmo prefácio ele lista nada menos
do que vinte programas criados por ele, e não há qualquer menção ao Programa do Almoço. E se levarmos em
conta a imprensa da época, as duas duplas citadas nunca estiveram no programa.
O erro —
repetido por Roberto Salvador em seu livro A
era do radioteatro, de 2011 — está no fato de que havia outros “Programas
do Almoço” na mesma época, em emissoras como Rádio Transmissora PRE 3, ou a
Rádio Clube do Brasil PRA 3, ambas estações onde Almirante efetivamente
trabalhou, em uma época ou outra. Se criou o programa, não faço idéia. Bibi
certamente não tem a nada a ver com nenhum desses dois. Considerando que criar
um programa musical para a hora do almoço e batizá-lo de “Programa do Almoço”
não é exatamente a invenção da roda, o mais provável é que César Ladeira limitou-se
a incorporar o conceito na Mayrink Veiga. A abalizada Norma Hauer, em belo trabalho
sobre a emissora, elimina Almirante, que entrou para essa história como Pilatos no
Credo, e diz o seguinte:
 |
Cynara Rios (O Malho, jul/40) |
Outra figura, esta ainda em atividade em
pleno século XXI e que estreou na PRA 9 em 1940, foi Bibi Ferreira. Ladeira
logo intitulou Bibi assim: “Um nome tão pequeno para uma artista tão grande”.
(...) Começou no “Programa do Almoço”, transferindo-se logo para o horário
noturno, onde cantava em inglês, espanhol e, naturalmente, português.
(Hauer, 2011)
A informação vem da revista Pranóve (da própria emissora) de agosto de 1940: “Aparecendo no programa do Almoço da PRA-9, logo se transferiu para os programas noturnos, onde César Ladeira, com aquela visão das coisas que lhe conhecemos, disse, de uma feita, e isso ficou como um slogan: Bibi Ferreira, um nome tão pequeno, para uma artista tão grande!” E está
correta, exceto pelo fato de que a estréia de Bibi, como já se viu, foi na
Ipanema, em 1937. Quanto à transferência para o horário noturno, não é
inteiramente exata. Há registro de que ela participou algumas vezes do
programa Balangandans, mas além dele
ser transmitido às 18h, o que não qualifica como um “programa noturno” (que era a partir
das 21h, depois da intragável “Hora do Brasil”, e reservava-se para grandes cartazes como Carmen Miranda, quando ela estava no Brasil, o próprio Ladeira, a atriz e cantora Cordélia Ferreira, Jararaca e Ratinho e poucos outros), Bibi não
era headliner e estava no meio de
diversos outros artistas, como o radialista Paulo Serrano, o compositor Fernando
Barreto, a imitadora Lydia Campos, a cantora — e sua substituta na Rádio
Ipanema — Cynara Rios, etc.
Segundo que a informação é dada um mês depois de sua contratação, quando ela mal começara no “Programa do Almoço”. É mais um release do que qualquer coisa. É possível, entretanto, que tenha sido convidada em uma ou outra ocasião e apresentada ao público por Ladeira, como já o fora anteriormente por Ary Barroso. Vamos aos fatos:
 |
Bibi, 1940 |
Durante seus
primeiros anos a rádio brasileira teve programação apenas em horário nobre, quando as famílias se reuniam e ouviam as notícias e os sucessos do momento.
Em 1940, portanto, programas matinais eram uma novidade e ainda não atraíam o
grosso do público ouvinte. Talvez por isso César Ladeira recheava
o Programa do Almoço — transmitido de
segunda a sábado às onze da manhã — com artistas amadores, tendo aqui e ali a
ajuda de veteranos. O programa servia como uma espécie de oficina para criação e teste de novos talentos e consagração definitiva daqueles que já estavam no meio há um pouco mais de tempo. Se o artista fosse competente, era promovido. Se não empolgasse, era simplesmente retirado sem qualquer prejuízo
à Mayrink. E nisso não estavam só os cantores, mas também os comediantes: "Muitos e muitos astros e estrelas têm nele surgido. Alguns dos nosso melhores humoristas radiofônicos adquiriram público, fama e situações iniciando-se no Programa do Almoço da sua PRA 9". (Revista da Semana, 29/11/41)
 |
Manuel Vilar, o "Branca de Neve"
(Revista da Semana, 29/11/41) |
Não encontrei a data exata de criação do programa, que deve ter ocorrido no início de 1940, mas por volta de abril e maio veremos, graças ao Diário de Notícias, um dos únicos jornais a fornecer a programação diária das rádios, o programa sendo comandado por jovens como o cantor Hedel Luiz, recém-premiado em um concurso de cantores, Manuel Vilar — ou "Manoel Villar", músico negro sobre quem encontrei apenas uma reportagem (Revista da Semana, 29/11/41), contando de nova reformulação do Programa do Almoço, na qual se diz que Manuel era "popularíssimo" e tinha a alcunha nada lisonjeira de "Branca de Neve" — a cantora Odaléia Sodré, de apenas 16 anos, a cantora Nena Robledo, irmã de Emilinha Borba, de vez em quando Marília Batista, João Petra de Barros ou o fadista português Joaquim Pimentel, entre outros, e um quadro para puxar público chamado “Canção da Fan”, no qual Carlos Galhardo provavelmente cantava músicas requisitadas por suas fãs. Galhardo é daqueles que estavam no horário nobre, mas dava uma palinha permanente no Programa do Almoço.
 |
Os colegas de Bibi na Mayrink. Acima, da esq. para dir., Sebastião Pinto (O Malho, 3/10/35), Nena Robledo (Fon Fon, 7/12/40), Hedel Luiz (Fon Fon, 2//40). Abaixo, Ernani de Barros (Fon Fon, 22/6/40), Lenita Bruno (A Scena Muda, 5/1/43) e Ernani Filho (A Scena Muda, 26/10/48) |
 |
Diário de Notícias, 6/7/40 |
Até o fim de
junho, quando o programa foi reformulado. Saíram alguns artistas, foi limado o
quadro de Galhardo, entrou o cantor Sebastião Pinto como elemento mais
experiente, e tornaram-se praticamente fixos artistas como Hedel Luiz, Manuel
Vilar, a Orquestra Passos, o cantor Ernani Filho, que vinha do Teatro de
Revista, o jovem Ernani de Barros, a quem Ladeira deu o apelido de “o
intérprete dolente da nossa canção”, uma bonequinha linda chamada Lenita Bruno
— de apenas 14 anos, e que rivalizava com Bibi na interpretação de canções
norte-americanas — Nena Robledo e Bibi. Sua estréia na Mayrink ocorre no dia 3
de julho de 1940, junto a Hedel Luiz, Ernani de Barros e Manuel Vilar. Ao contrário
da estréia na Ipanema, amplamente divulgada e hoje esquecida, mesmo sendo um
programa que tinha Bibi como estrela, não encontrei uma única linha ou foto
sobre sua estréia na Mayrink, onde era parte de um elenco. E é, paradoxalmente,
a única incursão radiofônica associada a ela. Talvez porque César Ladeira e a
Mayrink são lembrados até hoje, enquanto Milonguita e a Ipanema infelizmente desapareceram
nos desvãos do tempo.
Foi dito que
o elenco era “praticamente fixo” porque raramente eram os mesmos todos os dias.
No máximo dia sim, dia não, ou alguns dias seguidos. Sebastião Pinto era
razoavelmente constante, mas os outros se alternavam, seja por compromissos ou
por shows fora do Rio, então veremos Ernani Filho e Hedel com Nena Robledo em um
dia, no outro estarão Ernani de Barros, Bibi e a Orquestra Passos, no outro
estarão Hedel, Manuel Villar e Lenita Bruno, e assim por diante. O programa,
que era despretensioso e focado no público feminino que ouvia rádio a essa
hora, continuou agradando, como quase tudo que a Mayrink produziu naquela
época.
 |
Anúncio da participação de Bibi no programa "Balangandans", da Mayrink, em agosto de 40. No repertório, músicas em diferentes idiomas, o que desde sempre fora marca registrada de Bibi. A famosa toada "Luar do Sertão", de Catulo e João Pernambuco; "Zuni! Zuni!", bobagem em espanhol composta por Tito Guizar dois anos antes e interpretada por ele no filme "The Big Broadcast of 1938", com W. C. Fields e Bob Hope; e duas composições da própria Bibi: o samba "O Figurino" e o fox "Don't drink, don't smoke, don't love". (Gazeta de Notícias, 8/8/40) |
**********
 |
Diário de Notícias, 19/6/40 |
O clima era
da mais ansiosa expectativa para a volta de Toscanini ao Brasil, onde estivera 54
anos antes, em 1886, apresentando-se com a orquestra de Leopoldo Miguez, cuja
demissão por desentendimentos múltiplos com seus colegas acabou levando
Toscanini, violoncelista de apenas 19 anos, a empunhar uma batuta e reger uma
orquestra pela primeira vez em sua vida. Os shows ocorreram em meados de junho
e início de julho, dando a largada para a temporada lírica, e foram um
acontecimento.
Na Europa o
clima era bem diferente. No dia do último show de Toscanini no Rio, 10 de
julho, teve início a chamada “Batalha da Inglaterra”, duelo entre a RAF, Força
Aérea Britânica, e a Luftwaffe, Força Aérea Alemã. Semanas depois, já em
agosto, e inaugurada a temporada de óperas no Municipal, dois artistas amadores
de ascendência inglesa, Cyril Corder e Francis Hallawell, tiveram a idéia de
montar um espetáculo em nome do Comitê Britânico de Socorros às Vítimas de
Guerra, com renda revertida para a Cruz Vermelha brasileira, britânica e
polonesa. Ambos eram praticamente desconhecidos, então o Correio da Manhã exagera quando se refere a Corder como "nome
este já bastante conhecido no meio de teatro-amadores do Rio de Janeiro, pelas
suas numerosas produções apresentadas com grande sucesso em diversos teatros do
Rio de Janeiro". (5/9/40)
 |
Correio da Manhã, 24/8/40 |
Para bancar
o espetáculo Corder teve a ajuda das esposas de grandes empresários como Francis
Walter Hime (avô do compositor Francis Hime), Carlos Guinle (pai de Jorginho
Guinle), Ernesto Gomes Fontes (do conglomerado EG Fontes), Carl Alden Sylvester
(presidente da Light do Rio de Janeiro), a empresária francesa radicada no
Brasil, Blandine Sloper e a princesa polonesa Anna Yolanta Czartoryska, esposa
do príncipe austríaco Ladislaus Radziwill.
Resolvida a
questão financeira, ele saiu contratando todos os artistas amadores brasileiros
e ingleses que pôde encontrar no Rio. Conjuntos vocais, comediantes, sketches
dirigidas por Jean Maxwell e Doreen Woodward, o jovem pintor Roberto Burle Marx
para desenhar um dos cenários, as alunas de Peggy Morser e Klara Korte, figurinos
de Louise Malpas, músicos, instrumentistas, cantores e assim por diante. A orquestra de 25 figuras viria do Grill Room do Cassino Copacabana, sob a regência de Carlos Noll, com arranjos do maestro Victor Nisticó. E, claro, a mais célebre artista jovem do momento, capaz de cantar, dançar e interpretar com igual talento, e em vias de se profissionalizar: a filha de Procópio, Bibi Ferreira, que continuava se apresentando no Programa do Almoço, da Mayrink e acabara de entrar na lista de nomes do rádio nacional que mais se destacaram em setembro. (Cinearte, 15/9/40)
 |
Kiepura e Eggerth cantam no benefício pela "Cidade das Meninas" (Revista da Semana, 31/8/40) |
A prefeitura ofereceu o Municipal para uma noite e o espetáculo, batizado de “Carioca Cocktail” — simbolizando o cosmopolitismo da
produção — tomou forma. Os ensaios, para um elenco que ultrapassava as cem
pessoas, ocuparam os meses de agosto e setembro. Seria “uma revista em dois
atos, tipicamente londrina”, permeada de elementos brasileiros. Da maneira que
vinha sendo ensaiada já estaria ótimo. Mas Corder acabou conseguindo o que
parecia impossível: Jan Kiepura e Martha Eggerth foram convidados e aceitaram
participar de um dos números. Os dois artistas eram encantadores, generosos, estavam
adorando o Brasil e haviam participado de eventos beneficentes que iam da arrecadação
de fundos para “as obras da Matriz de Sta. Therezinha” até o chá dançante em
benefício da “Cidade das Meninas”, obra assistencial de Darcy Vargas. Mesmo
encerrada a Temporada Lírica e a temporada no Grill Room, os dois fariam parte
do Carioca Cocktail, cuja apresentação estava marcada para 30 de setembro. (Correio da Manhã, 23/7, 21/8, 5/9, 22/9
e 25/9/40, Diário Carioca, 15/9/40, Diário da Noite, 17/9/1940)
A imprensa
fez seu papel, anunciando constantemente:
"Carioca Cocktail" é na realidade uma mistura
especial de uma infinidade de ingredientes, formulada para satisfazer a todos
os sabores, que será servida ininterruptamente, sendo cada ingrediente
anunciado de forma bastante original por ‘compéres’ brasileiros e ingleses. (...) Do elenco
convém ressaltar o nome da Srta. Bibi Ferreira, filha de Procópio. (Correio da Manhã, 22/9/40)
 |
Correio da Manhã, 15/9/40 |
 |
Correio da Manhã, 28/9/40 |
No dia 23 de
setembro a colônia britânica ofereceu um chá, no Palace Hotel, a todos os
artistas envolvidos no Caroca Cocktail. O Diário Carioca atiçou ainda mais a
curiosidade do público:
Nessa festa (...) tomarão parte, além de
outros artistas brasileiros e britânicos, Jan Kiepura e Martha Eggerth, que
pela primeira vez aparecerão juntos à platéia carioca; Quartetto in Blue, com
Margaret Quick no piano; The Treble Clef Club e, finalmente, Bibi Ferreira, a
famosa e talentosa filha do querido Procópio, cantando e dançando como nunca.
(Diário Carioca, 24/9/40)
Vale
registro, neste caso, de que os “Treble Clef Clubs” eram grupos vocais
femininos de inspiração judaica, e surgiram na cidade norte-americana de
Norfolk, na Virginia, no início do século XX, na YWHA, Young Women's Hebrew Association, Associação Hebréia de Jovens
Mulheres.
 |
O Chá para o elenco do Carioca Cocktail. Bibi parece ser a quarta sentada, da esquerda para a direita. (Diário Carioca, 24/9/40) |
Na terça-feira, dia 24, parte do elenco se reuniu para participar do programa de rádio "Ondas Musicais", "dedicadas a todos os rádio-ouvintes que preferem as obras de compositores clássicos e dos modernos já consagrados pelo bom gosto musical". O programa — que possuía beneplácito estatal e patrocínio da Liga Brasileira de Eletricidade — era transmitido ao vivo por seis estações e aquela edição seria quase toda dedicada ao Carioca Cocktail. Bibi esteve entre os participantes:
O Programa "Ondas Musicais apresentou ontem belos números de estúdio, a cargo dos artistas que tomarão parte na revista "Carioca Cocktail". Gostamos de ouvir o Quarteto Azul, esplêndido no gênero. Bibi Ferreira, a talentosa filhinha de Procópio, esteve também muito segura no número "Mammie", de sua autoria. (O Imparcial, 25/9/40)
 |
O Imparcial, 25/9/40 |
Mammie, composta por Bibi, é música que desconheço completamente. Provável influência de Al Jolson, a quem Bibi deve ter escutado muito quando criança.
Em meio aos ensaios ainda houve tempo para Bibi participar de outro evento, este no então prestigiosíssimo Fluminense Futebol Club. O centro recreativo, pertencente ao time de futebol, era na época uma casa noturna das mais bem-freqüentadas do Rio e possuidora de uma eclética agenda cultural, com bailes e festas para todos os públicos, dividida pelos dias da semana. Martha Eggerth e Jan Kiepura lá estiveram no fim de agosto e na quinta-feira, dia 26 de setembro, uma chá dançante ocorreu para homenagear os integrantes do Bando da Lua, tendo como convidados especiais Dulcina e Odilon. Participaram da homenagem Bibi, a cantora e ex-miss Ipanema Laura Suarez, Linda Baptista, Grande Otelo, Carlos Galhardo, o intérprete de canções internacionais Edgar Lafourcade, o Quarteto de Bronze, novíssimo conjunto musical feminino, o radialista e comediante Silvino Neto (pai do comediante Paulo Silvino), o compositor Arthur Costa, parceiro de Noel, e o brilhante gaitista Eduardo Nadruz, cujo número era referido por "Edú e suas gaitas", estando ele em início de carreira mas já reconhecido por seu imenso talento, entre outros. Infelizmente não encontrei nos jornais quaisquer comentários sobre o decorrer da festa, e os números apresentados. Foi o primeiro encontro artístico, de muitos que viriam no futuro, entre Bibi e Grande Otelo.
 |
Correio da Manhã, 24/9/40 |
Os ingressos
para o dia 30 se esgotaram e a Rádio Cruzeiro do Sul, PRD 2, anunciou sua
transmissão ao vivo. Entre os presentes estavam Darcy Vargas e alguns de seus familiares, o prefeito
Henrique Dodsworth, Geoffrey Knox, embaixador da Inglaterra, Jefferson Caffery,
embaixador dos Estados Unidos e mais uma série de figuras proeminentes do corpo
diplomático. (O Jornal, 4/10/40) A "Batalha da Inglaterra" e seus terríveis embates estavam na ordem do dia e as colônias de todos os países que vinham contabilizando feridos e vítimas nos ataques alemães estiveram em peso no Municipal. Foi um
grande sucesso. “Trata-se de uma revista que é um conjunto de arte e beleza”,
disse o Jornal do Brasil, que fez bom
apanhado do espetáculo. A posteridade agradece:
O primeiro número, verdadeiro triunfo,
representa um bar em que está sendo "misturado" o Carioca Cocktail. A
"theme colour", em homenagem ao Brasil, foi verde e amarelo e tanto
os cenários como os vestidos realçam a beleza e a mocidade das bailarinas. Segue-se
com pleno êxito o Quarteto em Azul, com Margaret Quick ao piano — já muito
conhecido no programa de rádio “Variedades Britânicas”, que dentro em breve
voltará ao ar, e o recital de acordeon por Miss Brooker, que muito agrada.
Na
seqüência, “a encantadora Bibi Ferreira canta e dança um número de sua própria
composição, Mammie, que será bastante
ovacionado”. Era a primeira de várias entradas de Bibi durante o espetáculo. Segue o Jornal do
Brasil:
 |
Correio da Manhã, 28/9/40 |
Serão aplaudidos, após, The Clef Club, com
uma ótima seleção de canções em que suas belas vozes foram muito apreciadas:
Margaret Quick sempre tão contente em uma dança espanhola, tocando suas
castanholas como se estivesse em Sevilha; o sketch "Illusions & Confusions",
que muito fez rir à platéia e o final do primeiro ato: "Song Memories", que reúne
todas as canções dos tempos passados, onde todas as artistas tomaram parte. O
cenário é uma linda vista das "Houses of Parliament" com o rio Tâmisa e o maior
boulevard de Londres — o "embankment" — no "foreground".
O segundo
ato se iniciou “com as já queridas Cocktail Girls. Enquanto algumas dançam e
cantam, outras descem às poltronas e distribuem à platéia copos com um cocktail
em homenagem à revista”. Depois delas entraram em cena, para o delírio do
público, Martha Eggerth e Jan Kiepura. Infelizmente a imprensa não dá detalhes
sobre a participação de ambos. Mas assim que saíram do palco entraram Bibi e Frank
Zezza “num número encantador: Scatter
Brain”. A canção de Johnny Burke, Keene Bean e Frankie Masters foi
celebrizada pelo último, que era um famoso band leader e cantor. Masters gravou "Scatter Brain" em 1939 e a canção se tornou não
apenas o maior sucesso daquele ano, mas da carreira dele.
 |
À direita, Bibi e Frank Zezza (Correio da Manhã, 3/10/40) |
Voltemos ao Jornal do Brasil e à entrada de Bibi
vestida de baiana, o que provavelmente não fazia desde Cidade-Mulher:
Segue-se um sketch: "The Restaurant", que receberá o aplauso merecido, e novamente as "girls", festa vez divididas entre si - a moderna contra a antiga - num lindo "ballet-valsa". Depois o Quarteto em Azul canta "Umbrella Man" em costume muito original acompanhado por Miss Brooker ao acordeon; "Deep Purple", um ballet moderno originado por Mme. Klara Korte e dançado por suas alunas. E assim chega o "Brazilian Shake" — o grande final do Carioca Cocktail, dedicado ao Brasil. Em pequenos grupos e aos poucos, todos os artistas enchem o palco — tendo cada grupo um número especial. Abre com Bibi Ferreira, uma verdadeira baiana, numa dança cheia de cor e bem brasileira.
 |
A baiana Bibi, segunda, da esquerda para a direita (Revista da Semana, 5/10/40) |
 |
Número musical "Figurinos do Momento". Bibi é a primeira à direita e a seu lado está a instrumentista Lydia Brooker (Revista da Semana, 5/10/40) |
 |
O encerramento, com a tal vista das "houses of parliament" |
 |
Correio da Manhã, 2/10/40 |
Seguindo-se Mrs. F. W. Whittle e Mr. Lynch num maxixe do
"outro mundo", depois um rancheiro, depois o Maracatú — dança
nortista de coroação do Rei Negro — com Margaret Quick e F. Hallawell e música
especial de arranjo de José Burle. Por fim o carnaval carioca com toda a sua
folia e o palco torna-se um mar de beleza e loucura e o remate com o Hino
Nacional, cantado pelos artistas. (Jornal
do Brasil, 5/10/40, Diário de
Notícias, 5/10/40)
No dia 1º de
outubro, Jan Kiepura e Martha Eggerth voltaram para os Estados Unidos. Mas o sucesso
do Carioca Cocktail permitiu mais uma apresentação, mesmo sem eles, no teatro João
Caetano, no dia 5 de outubro. Sem os dois astros internacionais, porém, foi preciso apelar para outras estratégias de marketing. Os produtores então fizeram um acordo com a fabricante de aviões Thornycroft do Brasil S. A., e sortearam dez passeios aéreos sobre o Rio a quem comparecesse à segunda noite do Carioca Cocktail. (Diário de Notícias, 5/10/40) Se a promoção foi levada a cabo, não sei, mas em janeiro do ano seguinte Cyril Corder e Francis Hallawell prestaram contas das duas apresentações do espetáculo. Em carta à Revista da Semana, comunicaram que a arrecadação chegou a quase 114 contos — uma bela quantia — e o valor já havia sido entregue ao Comitê Britânico de Socorros às Vítimas de Guerra, que se encarregou de dividir o dinheiro entre a Cruz Vermelha brasileira, inglesa e polonesa. (Revista da Semana, 4/1/41)
A essa altura da vida Bibi já participara de festas artísticas, de celebrações, de efemérides e de homenagens, com números de música, canto e dança. Mas o Carioca Cocktail, com seu enredo, início, meio e fim, e suas duas apresentações, são a estréia efetiva de Bibi no Teatro de Revista. 30 de setembro de 1940.
 |
Naquele dia 16 de outubro, a presença ocasional de João Petra de Barros, que oito anos depois se suicidou, premido pela tristeza de ter uma perna amputada, após um acidente |
Nos meses finais de 1940 Bibi seguiu trabalhando na Mayrink, sempre com grande brilho e acolhimento por parte de público e imprensa. Em outubro, citando "alguns nomes que se puseram em evidência nos últimos trinta dias", a Cinearte citou Lydia Campos, colega de Bibi na emissora. "Outro nome: Bibi Ferreira que além de cantora, interpretando deliciosamente o samba, o tango, o fox, se revela compositora de mérito. Bibi Ferreira é, no momento, um dos grandes cartazes do rádio carioca". (15/10/40)
No fim de novembro esteve no Brasil, em lua de mel com a atriz francesa Marcelle Rogez, o veterano diretor Wesley Ruggles, responsável por inúmeros filmes de grande sucesso no mundo inteiro, como o faroeste Cimarron, a comédia I’m no Angel, com Mae West e Cary Grant, No man of her own, com Clark Gable e Carole Lombard, e dezenas de outros, em uma carreira que remontava aos primeiros anos do cinema mudo. A jornalista Zenaide Andrea, amiga de Bibi desde Cidade-Mulher, era a diretora do departamento de publicidade da Columbia Pictures no Brasil, e a convidou para um encontro com o diretor no Copacabana Palace, que foi registrado pela revista A Scena Muda.
 |
Wesley Ruggles, entre Bibi e Zenaide Andrea. Em pé, intelectuais e artistas presentes ao encontro. (A Scena Muda, 3/12/40) |
Ruggles adorou o país e falou "do seu encantamento por estar recebendo do Brasil e dos brasileiros uma impressão real, confessando-se mesmo surpreendido com tudo o que estava apreciando". (A Scena Muda, 3/12/40)
 |
A última participação de Bibi na Mayrink (Diário de Notícias, 14/12/40) |
O Programa do Almoço continuava, acrescido do locutor Souza Filho e das cantoras Simone Moraes, que pouco depois dublaria Cinderella e se tornaria pioneira nas gravações infantis da célebre coleção “Disquinho”, e Carmen Dolores, mineira que abandonaria o canto para mergulhar de cabeça no rádio-teatro. Mas estava na reta final. Já havia, a essa altura, uns três ou quatro “programas do almoço” em diferentes emissoras, o formato dava sinais de desgaste e era preciso reformulá-lo. Sendo um piloto de prova para novos talentos, nada mais natural que houvesse uma saudável rotatividade no quadro de artistas. No início de dezembro vemos o programa sendo substituído de vez em quando pelo programa de Ademar Casé. O último registro de Bibi no Programa do Almoço e na Mayrink é do sábado, 14 de dezembro, junto a Joaquim Pimentel, Ernani Filho e Lenita Bruno.
 |
Olavo de Barros (Fon Fon, 18/3/39) |
A performance
de Bibi que precedeu sua estréia com Procópio também foi uma revista. O
curitibano Olavo de Barros — uma das maiores e mais injustamente esquecidas
figuras do nosso meio artístico — era um consagrado veterano em todas as áreas
das artes cênicas. Escreveu, dirigiu e interpretou para teatro, cinema e rádio.
No fim de 1940 ele se juntou a Cordélia Ferreira e os dois decidiram preparar
um pequeno caça-níqueis em cima do interesse popular pelas músicas que seriam
lançadas no carnaval de 1941. Era normal surgirem revistas todos os anos, em
janeiro, utilizando o carnaval como tema; Olavo escreveu um texto com o compositor
Saint-Clair Senna, cujas canções estavam na ordem do dia pelas vozes de
Francisco Alves, Gastão Formenti e Orlando Silva, incluiu paródias de imprensa,
anedotas e assim surgiu o “Chuva de Estrelas”, que reuniria grandes cartazes da
Mayrink, com o devido espaço para alguns artistas de emissoras adversárias. Foi
marcado para o dia 25 de janeiro, no Teatro Carlos Gomes, “luxuoso teatro da
Empresa de Pascoal Segreto”. Como se verá adiante, ele podia até ser luxuoso, o
que não impedia que o verão carioca castigasse os espectadores com sua canícula
noturna.
 |
Carlos Galhardo, presente por grande
parte desse período da vida de Bibi (Fon Fon, 17/6/39) |
Os
apresentadores — ou “compéres”, como se dizia então — foram Paulo Gracindo, no
papel de “Autor” e a cantora Zezé Fonseca, no papel de “Graça”. Embora feito às
pressas, não se pode negar que o nome da revista de Barros e Senna fosse
adequado. Entre estrelas que brilhavam naquele momento, outras que seguiriam
brilhando e outras que brilham até hoje estavam lá os cantores Carlos Galhardo,
Gilberto Alves, Fernando Barreto, Mário Moraes, Sebastião Pinto, o trio “Os
Pinguins” e Moreira da Silva, então referido como “o tal”. As cantoras eram
todas jovens e igualmente promissoras: Bibi, Cynara Rios, Inezita Falcão,
Yvonette Miranda, Janyr Martins, Simone Moraes e Léa Coutinho. Nos sketches
humorísticos e nas “cortinas”, ou entreatos, estavam os também muito populares
e respeitados Armando Louzada, o casal Cordélia e Plácido Ferreira, o casal Déa
Selva — a linda atriz de Ganga Bruta
— e Darcy Cazarré (mais tarde pais dos atores Olney e Older Cazarré), Jararaca
e Ratinho, Silvino Neto e Jorge Murad. Todos com acompanhamento da orquestra do
maestro Bernardo Bontempo. (A Batalha,
15 e 16/1/41)
 |
Gilberto Alves (O Malho, mai/40), Janyr Martins (Fon Fon, 15/6/40) e Silvino Neto (O Malho) |
 |
Jararaca e Ratinho (Fon Fon, 24/2/45) |
 |
A Batalha, 22/1/41 |
A principal
prova de que Chuva de Estrelas não teve qualquer preparo e não passava de um mal-costurado
recital de grandes artistas foi a ausência de propagandas. Enquanto Walter
Pinto inundava os jornais diariamente com anúncios de Disso que eu gosto, revista escrita por Oscarito, em cartaz no
Teatro Recreio, havia apenas o release
protocolar de Chuva de Estrelas, sempre com as mesmas informações. Também ao
contrário de Carioca Cocktail,
documentado e fotografado, não encontrei uma única foto, seja dos ensaios ou da
apresentação de Chuva. E o resultado não poderia ter sido outro: a lotação se
esgotou, o espetáculo foi caótico e conquanto chovessem estrelas, a impressão
que ficou não foi das melhores. O jornalista Josué de Souza, do Diário da Noite, não deixou barato, e
começou falando da falta de um programa impresso, importantíssimo em revistas,
pois o público fazia questão de identificar metodicamente pelos folhetos
distribuídos, quem estava cantando, e o quê:
 |
Mesmo sendo uma revista mal-engendrada
e mal-acabada, "Chuva de Estrelas" foi o
primeiro encontro de Bibi com o imenso
Paulo Gracindo (Fon Fon, 15/6/40) |
O espetáculo (...) terminou,
mesmo, abruptamente, sem que tivesse sido dada uma satisfação ao público,
numerosíssimo, aliás, já que não havia um único programa impresso. Aos poucos,
porém, os espectadores, compreendendo que o Sr. Olavo de Barros se tinha esquecido
daquele detalhe, sem medir a irreverência do seu efeito, foram desocupando o
casarão da Praça Tiradentes.
Infelizmente
o jornalista não descreve o espetáculo discriminando os números de cada
artista. Mas dá sopapos neste ou naquele, e elogia outros, destacando Bibi:
A noitada, contudo, satisfez e compensou o
sacrifício imposto pelas duas horas e meia de calor a que ficamos sujeitos.
Gilberto Alves, Janyr Martins, Jararaca e Ratinho e Silvino Neto foram os
heróis do palco. Arrancaram fartos e prolongados aplausos, sendo obrigado a
bisar os seus magníficos números. (...) Não podemos, no entanto, dizer o mesmo
dos sketches apresentados. Velhos, velhíssimos, tiveram apenas a missão de
encher o tempo. E o fizeram muito mal. Jorge Murad, com as suas piadas do tempo
da onça, não chegou a desagradar. O Sebastião Pinto, Bibi Ferreira, Fernando
Barreto, Yvonette Miranda, cantaram de modo bastante satisfatório,
destacando-se Bibi Ferreira. Os demais não comprometeram. (28/1/41)
Exatamente um mês depois desse artigo, cumpriu-se uma profecia feita absolutamente sem querer pelo O Jornal, de Assis Chateaubriand, três anos antes. Na verdade não era tanto uma profecia quanto um boato sem maior embasamento, mas que acabou se tornando realidade em 28 de fevereiro de 1941.
 |
O Jornal, 16/7/37 |
FIM DA TERCEIRA PARTE
____________________________________
VEJA TAMBÉM:
____________________________________